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Unidade em Moçambique está ameaçada?

Nádia Issufo9 de março de 2015

A Conferência Episcopal de Moçambique considera que a unidade nacional está ameaçada e pede diálogo. Também a ideia de governação autónoma da RENAMO põe em perigo um dos principais pilares da FRELIMO, dizem analistas.

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Estátua em Maputo de Samora Machel, primeiro Presidente de MoçambiqueFoto: Gianluigi Guercia/AFP/Getty Images

Depois de uma reflexão num conselho permanente, em fevereiro passado, a Conferência Episcopal de Moçambique (CEM) divulgou recentemente um comunicado sobre os desafios da unidade nacional. No documento, os bispos católicos apontam várias situações críticas que, a seu ver, colocam em causa a aplicabilidade do conceito.

A CEM lembra, por exemplo, que a unidade nacional não deve estar apenas ancorada em limites geográficos e que não pode ser um conceito monopolizado por grupos exclusivos e fechados. Defende ainda que até os recursos naturais podem pôr em causa este conceito, uma vez que nem todos beneficiam deles.

Estará a unidade nacional realmente ameaçada? "É uma questão de interpretação dos atores políticos face ao sentimento das pessoas", responde o académico Lourenço do Rosário.

Lourenço do Rosário Mosambik
Lourenço do Rosário, académico moçambicanoFoto: DW/J. Carlos

"A carta episcopal é muito clara: os atores políticos ainda são muito patrimonialistas em relação à dinâmica de determinadas questões relacionadas com a unidade nacional, a história do país e a sociedade em geral."

O especialista defende ainda que, de uma forma geral, os moçambicanos, ao longo destes 40 anos de independência, foram-se ambientando noutros sentimentos face à unidade nacional que, em determinados momentos, os atores políticos tentam beliscar em função dos seus próprios interesses."

Ameaça à porta da FRELIMO

Por outro lado, esta ameaça não está apenas à porta da sociedade moçambicana, que segundo o CEM precisa de ver respeitado o artigo 11º da Constituição que prevê, por exemplo, um desenvolvimento equilibrado, económico e social, justiça social e estabilidade social.

A ameaça está também à porta da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO). A unidade nacional foi o principal estandarte do partido no poder logo após a independência de Moçambique, em 1975, e a ideia de governação autónoma proposta pela Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o maior partido da oposição, vem estremecer um dos pilares da FRELIMO.

Porträt - Silvestre Baessa
Silvestre Baessa, especialista em boa governaçãoFoto: privat

Daí que olhar para o principal partido do país com suspeita no caso do assassinato do constitucionalista Gilles Cistac, assassinado na passada terça-feira (03.03) em Maputo, não seja um completo absurdo, confirmam analistas.

"A FRELIMO é campeã em unidade nacional. O termo unidade nacional é um dos mais presentes nos discursos do partido. É um partido que se mostra como guardião desta unidade nacional", explica Silvestre Baessa, especialista em boa governação.

"Sobretudo os setores mais conservadores, aqueles cujo poder repousa na luta de libertação nacional, defendem que qualquer tentativa de pôr em causa essa unidade nacional põe também [em causa] a sobrevivência da FRELIMO e a razão da própria luta", defende o analista.

Legado de Samora Machel

Vários países implementaram sistemas de governação autónoma e a sua unidade nacional nunca esteve em causa. Apesar das ameaças que este baluarte enfrenta, o académico Lourenço do Rosário acredita que se manterá em pé.

"A unidade nacional foi um projeto estratégico da FRELIMO revolucionária que veio das matas, que teve a ver com toda a dinâmica da própria luta de libertação nacional", sublinha.

[No title]

O especialista evoca ainda o "problema herdado do traçado colonial " dos territórios em África para lembrar que a unidade nacional teve de ser construída.

"O projeto de unidade nacional que foi construído no período de Samora Machel deixou sementes bastantes fortes. Houve muita coisa negativa durante o período revolucionário, mas uma das coisas positivas que o período de Samora Machel deixou aos moçambicanos foi esse sentimento de unidade territorial, unidade da história, unidade geográfica que neste momento não me parece que se possa diluir muita facilidade, conclui Lourenço do Rosário.

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