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Cabo Verde pede apoio da Alemanha no dossier da mobilidade

Cristiane Vieira Teixeira (Berlim)
7 de maio de 2019

Presidente cabo-verdiano termina visita à Alemanha com garantia de abertura para negociar mobilidade entre os dois países. A mobilidade é um tema crucial na CPLP. Jorge Carlos Fonseca falou em exclusivo à DW.

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Presidente de Cabo Verde, Jorge Carlos FonsecaFoto: DW/C. V. Teixeira

O Presidente de Cabo Verde concluiu, esta segunda-feira (06.05), uma visita de quatro dias à Alemanha. Visitou os estados federados de Hamburgo, Schleswig-Holstein e Berlim.

Em entrevista exclusiva à DW África, Jorge Carlos Fonseca falou com otimismo sobre o futuro da cooperação bilateral com a Alemanha, os frutos colhidos dos encontros que manteve com o Presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, e com o presidente do Parlamento alemão, Wolfgang Schäuble.

O chefe de Estado cabo-verdiano revelou também o desejo de concretizar a mobilidade ampla na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), a que preside atualmente, e disse ainda estar confiante de que a Guiné Equatorial irá aboliar a pena de morte até ao final de 2019.

DW África: Qual é a nova estratégia na relação bilateral entre Cabo Verde e a Alemanha?

Jorge Carlos Fonseca (JCF): É uma estratégia que não se centra na procura de ajuda pública ao desenvolvimento clássica. Estamos à procura do investimento direto alemão, dos empresários alemães, em articulação com instituições como universidades e também com os estados federados.

Bahia do Porto Grande - Ilha de Sao Vicente
Foco de Cabo Verde é "economia do mar"Foto: DW/A. Semedo

DW África: Em que áreas estariam centrados os interesses de Cabo Verde?

JCF: Nós centramos as nossas prioridades naquilo que tem a ver com a economia do mar. Somos um país pequeno, temos uma imensidão de mar e, portanto, o futuro desenvolvimento de Cabo Verde passa pela economia do mar. Para isso, temos que ter a capacidade técnico-científica em domínios como a oceanografia, proteção do ambiente marinho, no domínio das pescas, da formação de quadros na área da economia do mar, gestão de portos, reparação naval. Foi esse pacote que trouxemos para a abordagem com as autoridades alemãs.

Levamos para Cabo Verde a confirmação de que vamos ter possibilidade de reforço da cooperação da GEOMAR [centro de pesquisa oceanográfica em Kiel] com o Centro Oceanográfico do Mindelo, alargada a outras áreas e com envolvimento do Governo federal [da Alemanha] e do Governo do estado de Schleswig-Holstein.

Bundespräsident Frank-Walter Steinmeier
Presidente alemão, Frank-Walter SteinmeierFoto: picture-alliance/AA/A. Hosbas

DW África: O que leva de concreto para Cabo Verde?

JCF: Ficou combinada uma visita do governador de Schleswig-Holstein [Daniel Günter] com investigadores e professores da Universidade de Kiel, responsáveis da GEOMAR, pessoas ligadas ao Ministério da Educação e ligadas à formação técnico-profissional, para que depois se possa encontrar formas de implementação dos projetos e modelos do seu financiamento.

DW África: Em Berlim, manteve encontros com o Presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, e com o presidente do Parlamento alemão, Wolfgang Schäuble. Como foram esses encontros?

JCF: Eu fiquei agradavelmente surpreendido com os encontros. Com o presidente [do Bundestag, Wolfgang] Schäuble, nós tínhamos programado uma reunião [com duração de] de 20 minutos e estivemos reunidos durante quase 50 minutos. Ele mostrou-se muito interessado em conhecer pormenores do percurso político e económico de Cabo Verde.

Mas, sobretudo, eu quis - com ele e depois com o Presidente da República [da Alemanha] - mostrar o interesse que Cabo Verde tem na Alemanha, na ajuda ao reforço da nossa parceria especial na União Europeia, nomeadamente, por exemplo, no dossier da mobilidade.

Cabo Verde pede apoio da Alemanha no "dossier da mobilidade"

A partir de 1 de janeiro de 2019, suprimimos os vistos de entrada em Cabo Verde para os cidadãos da União Europeia - foi uma decisão unilateral do Governo de Cabo Verde. Mas, naturalmente, temos interesse, a prazo, numa mobilidade no sentido inverso. É um dossier difícil, mas estamos a trabalhar nele para que também possa haver, no futuro, mobilidade dos cabo-verdianos no espaço comunitário europeu, sem a exigência de visto ou com mais facilidade do que existe neste momento.

DW África: Sentiu uma abertura ou recetividade nesse sentido?

JCF: Sim. Não nos iludiram sobre facilidades, mas perceberam a nossa posição. Mas sobremaneira também encontrámos suporte político ao mais alto nível para tudo aquilo que pretendemos ao nível do aprofundamento da cooperação económica, cooperação empresarial, colaboração com as universidades e estados federados.

Esse suporte político ao mais alto nível, essa abertura é decisiva para que o diálogo com a Alemanha seja enriquecedor e potenciador de um projeto de desenvolvimento muito ambicioso que Cabo Verde tem.

Esses dois encontros marcaram de forma positiva pela dinâmica, profundidade e frontalidade do diálogo. Falámos muito abertamente sobre quase todas as questões que me interessavam discutir num relacionamento com um chefe de Estado alemão e um presidente de um Parlamento de uma potência democrática como é a Alemanha, nos quadros mundial e europeu.

Besuch des Präsidenten Obiang in Kapverden
Teodoro Obiang e Jorge Carlos Fonseca, na cidade da PraiaFoto: Kapverden Regierung Pressestelle

DW África: A mobilidade é um tema também para a CPLP, que Cabo Verde atualmente preside. Em que termos defende essa mobilidade?

JCF: No quadro dessa presidência, damos uma importância crucial à questão da mobilidade. Para mim, só haverá uma verdadeira comunidade de povos de língua portuguesa - uma comunidade de cidadãos, mais do que uma comunidade de Estados - se os cabo-verdianos, os guineenses, os angolanos, os brasileiros, os portugueses, os timorenses puderem circular no espaço de cada um dos nossos países. Sem isso, o cidadão comum não se sente membro da comunidade. Portanto, a mobilidade para nós é central.

Cabo Verde já apresentou a todos os Estados-membros um projeto de acordo de mobilidade - um acordo de geometria variável, que permite vários níveis de mobilidade. Por exemplo, a entrada em qualquer país da CPLP para qualquer cidadão, sem visto, por um período de 30 dias. Esse é o nível mais alto. Há ainda um outro nível que é autorizações de residência para certas categorias ou segmentos sociais, renovável por um certo período de tempo. E a um nível mínimo, livre circulação para titulares de passaportes diplomáticos e de serviço. Cada Estado pode aderir a um nível de mobilidade.

Houve já uma reunião de ministros, há uma semana, na [cidade da] Praia, com todos os [nove] países participantes, e ficou-nos a ideia que este nosso projeto teve eco. A nossa missão é chegar a um acordo a nove, para todos os segmentos e ao nível mais elevado. Mas, se for possível chegar a isso a seis [países], a presidência de Cabo Verde teria conseguido um grande passo que credibilizaria a CPLP.

Cabo Verde: Um país com pouca água

DW África: Há quem se posicione contra a participação da Guiné Equatorial na próxima cimeira em julho, em Cabo Verde, devido à pena de morte no país. Qual é a sua posição?

JCF: Neste momento, eu parto de um facto: a Guiné Equatorial entrou para a CPLP, é um membro, e todos os países aceitaram a entrada. Eu estive na cimeira de Díli, em que entrou a Guiné Equatorial, por consenso de todos os Estados-membros. Estando dentro, creio que a melhor atitude é procurar ajudar a Guiné Equatorial para uma integração progressiva e plena na CPLP. Promover a inclusão e não a exclusão.

Neste momento, está a caminho da Guiné Equatorial uma missão chefiada por um embaixador cabo-verdiano, que vai, com uma delegação ampla da CPLP, discutir e avaliar, como membros iguais da comunidade, as necessidades e as exigências e ajudar a encontrar os caminhos para a evolução política, para a abolição da pena de morte, para a promoção da língua portuguesa, numa postura construtiva, sem descorar a exigência em termos de princípios e valores.

Fiquei satisfeito por, durante a nossa presidência e em Cabo Verde, o Presidente Obiang ter feito uma declaração pública de que tudo fará para tornar efetivo o propósito da abolição da pena de morte ainda neste ano. Portanto, tenho que presumir que uma declaração pública de um chefe de Estado tem que ser levada a sério. E confio que, desse ponto de vista, a abolição da pena de morte será um facto bem antes do final deste ano de 2019.