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Lula tenta reescrever a história da corrupção no Brasil

Alexander Busch | Kolumnist
Alexander Busch
18 de agosto de 2021

Segundo ex-presidente, a culpa da grave crise econômica nacional caberia à Operação Lava Jato – não à própria corrupção. Uma cínica tentativa de criar uma nova narrativa e evitar um mea culpa, escreve Alexander Busch.

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Fachada da Petrobras no Rio de Janeiro
Corrupção na Petrobras manchou imagem internacional da estatal e do BrasilFoto: Fabio Teixeira/Zuma/picture alliance

Em 10 de março de 2021 o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva expôs pela primeira vez sua visão particular do escândalo de corrupção da Lava Jato: devido à operação, o Brasil teria perdido cerca de R$ 172 bilhões em investimentos, e 4 milhões de cidadãos teriam ficado sem emprego, queixou-se, lamentando que uma empresa tão imponente como a estatal Petrobras tenha sofrido danos.

As sentenças de Lula por lavagem de dinheiro e corrupção acabavam de ser suspensas por motivos formais. Seus adeptos festejaram o fato como uma absolvição, muitos interpretaram essa aparição pública em março como seu primeiro discurso de campanha.

Na realidade, o ex-chefe de Estado está incorrendo numa estranha distorção da história. Pois não foram os inquéritos da Justiça no escândalo que causaram danos à economia e à Petrobras, mas sim a corrupção, a má gestão, as decisões econômicas equivocadas nos cerca de 13 anos em que o Partido dos Trabalhadores (PT) de Lula esteve no poder.

Jogar para a Justiça a responsabilidade pelos prejuízos é como culpar pela doença o médico que a diagnosticou no paciente.

O drama da Petrobras

Lula citou uma análise realizada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), por encomenda da Central Única dos Trabalhadores (CUT), examinando as consequências econômicas da Operação Lava Jato, entre 2014 e 2017. Nela, os pesquisadores distorcem os fatos, pois o ocaso da Petrobras já havia iniciado muito antes das investigações judiciárias, a partir de março de 2014.

O ex-chefe de Estado e sua sucessora, Dilma Rousseff, tencionavam transformar a estatal na locomotiva industrial do Brasil. Mas no processo dividiram a pele da onça antes de ela ter sido caçada, já que os lucros com o petróleo não jorravam tão rápido como se esperava, devido às complexas tecnologias do pré-sal.

Em consequência, a Petrobras se endividou ao ponto de, em 2013, se tornar a companhia cotada na bolsa de valores com o maior volume de dívidas do mundo. Ao mesmo tempo, o governo recrutou a multinacional também para o combate à inflação, e a gasolina e o diesel passaram a ser vendidos mais barato.

Quando, a partir de 2014, o preço do petróleo começou a cair, investigadores de Curitiba revelaram gradualmente um gigantesco esquema de corrupção, em que firmas de construção privadas, em especial a Odebrecht, haviam desviado bilhões, junto com a gerência da Petrobras e com a bênção do governo e seus parceiros de coalizão.

Teorias de conspiração em curso online

No decorrer das investigações, prenderam-se diversos diretores da Petrobras e da indústria de construções, e suas empresas foram excluídas das concorrências públicas. Muitos fornecedores que haviam pagado propina também ficaram proibidos de trabalhar com a Petrobras.

Nesse ínterim, o Instituto Lula elaborou as conclusões do Dieese na forma de um curso online, em que especialistas explicam como as investigações da Justiça prejudicaram a classe trabalhadora.

A abertura cabe ao ex-chefe da Petrobras Sergio Gabrielli, que reproduz as teorias de conspiração de praxe da esquerda. Segundo estas, o FBI e as Forças Armadas americanas teriam usado como seu capanga o juiz Sergio Moro, "treinado nos Estados Unidos", a fim de enfraquecer a estatal do petróleo. Gabrielli se permite até explicar que os R$ 6 bilhões de subornos, divulgados oficialmente pela primeira vez em 2014, seriam "quase nada" diante do faturamento da Petrobras.

Tudo isso é a tentativa cínica de sobrepor uma nova narrativa à Lava Jato – evitando assim o mea culpa necessário a um recomeço político para Lula e seu partido.

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Há mais de 25 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul do grupo editorial Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt) e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em São Paulo e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil. Clique aqui para ler suas colunas.

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Tropiconomia

Há mais de 25 anos, Alexander Busch é correspondente de América do Sul para jornais de língua alemã. Ele estudou economia e política e escreve, de Salvador, sobre o papel no Brasil na economia mundial.