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Maputo: Ponte para Katembe custa, afinal, mais de 1 milhão

12 de novembro de 2018

Jornalista Adérito Caldeira explica que, com os juros de 4%, a fatura a pagar é de 1,3 mil milhões de dólares. "A impressão que dá é que o Governo está a empurrar para quando houver as receitas do gás", diz.

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Mosambik - Einweihung der Maputo-Katembe-Brücke: größte Hängebrücke Afrikas
Ponte Maputo-Katembe foi inaugurada este sábado (10.11)Foto: DW/R. da Silva

Foi inaugurada, este sábado (10.11), em Maputo, a maior ponte suspensa de África. Com cerca de três quilómetros de extensão e com 60 metros de altura, esta ponte fará a ligação entre a capital moçambicana, Maputo, e Katembe, o que passa a permitir o acesso rodoviário à Ponta do Ouro e à República da África do Sul.

A ponte foi financiada e construída pela China, uma obra que arrancou há quatro anos, com um valor base de 785 milhões de dólares, que Moçambique começa a pagar a partir de 2019.

Na inauguração da infraestrutura, o Presidente Filipe Nyusi frisou que a ponte irá fazer "explodir" o turismo na região, e consequentemente, criará riqueza. No entanto, no seio da sociedade, há uma dúvida que se mantém. Como irá o Governo conseguir pagar a manutenção da ponte, orçamentada em cerca de um milhão de dólares anuais, se o dinheiro das portagens não é suficiente, como já fez saber. A esta interrogação junta-se agora uma notícia do jornal "@Verdade", parceiro online da DW África, que apurou que, com os juros, o custo total da infraestrutura deverá ultrapassar os 1,3 mil milhões de dólares.

Maputo-Katembe já está em funcionamento

Neste âmbito, entrevistámos Adérito Caldeira, diretor-geral adjunto deste jornal, que explicou que a solução para o pagamento deste acréscimo pode estar também nas receitas do gás. Segundo Adérito Caldeira, "Moçambique vai começar a pagar os juros [do empréstimo para a construção da ponte] a partir do próximo ano e, ao que tudo indica, só na segunda década, estamos a falar de 2029, começará a pagar juros mais a amortização do capital. Portanto, é já com as receitas do gás", afirmou.

DW África: O valor oficial do custo de construção da ponte Maputo-Katembe é de 785 milhões de dólares. Mas, feitas as contas, e conforme avançou o "@ Verdade", não é bem assim...

Adérito Caldeira (AC): Pois, os 785 milhões de dólares é o valor do empréstimo e as contas que o "@Verdade” fez foi o empréstimo mais o custo do empréstimo.

Adérito Caldeira
Adérito Caldeira, diretor-geral adjunto do jornal "@Verdade"Foto: DW/J. Beck

DW África: Que daria então o total de 1,3 mil milhões de dólares…

AC: O valor do empréstimo, na realidade, são 756,5 milhões de dólares. Apurámos que é um empréstimo que tem uma maturidade de 20 anos e um período de graça, que era durante a construção, que termina este ano. Portanto, a partir de 2019, Moçambique já começa a pagar os juros. São juros de 4%, como conseguimos apurar e, feitas as nossas contas, chegamos a este valor de 1,3 mil milhões de dólares.

DW África:  No artigo, o "@Verdade" sugere que este acréscimo seja pago com recurso às receitas do gás natural. Mas, serão estas receitas suficientes para pagar os juros da ponte e, como já anunciado, parte da dívida pública?

AC: Isso acho que ainda ninguém sabe. A sugestão que eu faço no artigo de hoje é porque, em termos práticos, este empréstimo só será pago na realidade até 2039. Falei hoje com o Ministro da Economia e Finanças, no Parlamento, e ficou claro que o valor do capital só será amortizado na última década. Ou seja, Moçambique vai começar a pagar juros a partir do próximo ano, durante a primeira década só pagará juros e, ao que tudo indica, na segunda década começará a pagar juros mais a amortização do capital. A segunda década estamos a falar de 2029, portanto é já com as receitas do gás.

Moçambique: Ponte Maputo-Katembe também será paga com receitas do gás?

DW África: A agravar a situação, o Governo já fez saber que a manutenção da ponte custará um milhão de dólares anualmente. Sabe-se também que o dinheiro proveniente das portagens não será suficiente para cobrir esta despesa. O Presidente Nyusi falou das receitas do turismo, que supostamente irão aumentar com a ponte, mas serão suficientes? Onde vai o Governo buscar este dinheiro adicional?

AC: As receitas do turismo são uma ilusão, porque o turista paga tanto como um cidadão moçambicano para atravessar a ponte. Portanto, não vai ser muito claro qual a receita que o turista vai deixar efetivamente para a ponte. Por outro lado, grande parte dos turistas que frequentam aquela zona de Moçambique, são turistas sul-africanos que, infelizmente, vários consultores com quem eu tenho falado, sugerem que até não são muito bons turistas, porque fazem acampamento, portanto, não ficam em hotéis, trazem grande parte dos mantimentos que vão consumir nos seus carros, portanto, gastam pouco em Moçambique. Por isso, essas receitas do turismo a ver vamos…

DW África: O financiamento externo continua a não ser opção e as despesas continuam a aumentar. Estamos perante, podemos dizer, uma situação insustentável? Como é que o governo vai fazer frente a todas estas despesas? Vão ser, novamente, os moçambicanos a pagar?

AC: De qualquer forma, vão ser sempre os moçambicanos a pagar. O que o Governo diz é que essas reestruturações que estão em curso, como a das dívidas ilegais, são reestruturações que visam trazer a dívidas para uma situação de sustentabilidade. A impressão que dá é que o que o governo está a querer é empurrar para quando houver essas receitas significativas do gás, ou seja, ganhamos algum tempo enquanto o gás não gera receitas fiscais,  ganhar algum tempo até 2023/2025, e então aí, eventualmente,  grande parte destes empréstimos já serão, supostamente, confortáveis. Mas também vamos ver que receitas são essas…