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PolíticaAlemanha

Alemanha sai do Mali mas não abandona o Sahel

Martina Schwikowski
28 de dezembro de 2022

A retirada da missão militar alemã no Mali deverá estar concluída em maio de 2024. Mas a crise na região do Sahel continua a agravar-se. Por isso, a Bundeswehr participará numa nova missão da UE no vizinho Níger.

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Mali | Soldaten aus Deutschland
Foto: Michael Kappeler/dpa/picture alliance

Durante a sua visita de Natal às tropas alemãs em Bamako, em meados de dezembro, a ministra da Defesa Christine Lambrecht disse claramente ao seu homólogo Sadio Camara que as tropas alemãs só permanecerão no país até 2024, caso forem cumpridas certas condições. Estas incluem a realização das eleições parlamentares várias vezes adiadas, e agora previstas para fevereiro de 2024.

A missão da Bundeswehr no Mali, que dura há dez anos, deverá terminar em Maio de 2024. A retirada dos cerca de 1400 capacetes azuis alemães integrados na missão das Nações Unidas (MINUSMA) inicia no próximo verão. A maior parte do contingente alemão está estacionada no nordeste do país, no Campo Castor, em Gao.

Eleições prováveis

Segundo o analista Ulf Laessing, responsável pelo Programa Regional do Sahel, em Bamako, da Fundação Konrad Adenauer, afiliada à CDU, partido na oposição na Alemanha, o extenso período planeado para a retirada da Bundeswehr abre a possibilidade de um diálogo com a junta militar no poder. O governo do Mali já se comprometeu a realizar eleições junto da comunidade económica da África ocidental, CEDEAO.

Laessing disse à DW que não duvida que as eleições ocorram na data marcada e criticou a ministra da Defesa: "No Mali, não caiu muito bem a imposição de condições. Foi uma infelicidade por parte da ministra". Insistir nas eleições é correto, acrescentou, mas não em público.

A ministra da Defesa alemã Christine Lambrecht (dtª) com o seu homólogo maliano Sadio Camara
A ministra da Defesa alemã Christine Lambrecht (dtª) com o seu homólogo maliano Sadio CamaraFoto: Michael Kappeler/dpa/picture alliance

Seidick Abba, jornalista e autor nigerino, adverte que não existe consenso entre os militares e a sociedade civil no Mali sobre como gerir a transição para um governo civil e democraticamente legitimado após dois golpes militares. Abba duvida que a data das eleições estabelecida seja imutável: "Ainda pode levar muito tempo até que o poder seja entregue à população civil numa eleição democrática", diz o analista.

Nestas circunstâncias, a presença de tropas alemãs até 2024 não altera a situação no terreno, servindo apenas para Berlim lançar a mensagem de que não pretende abandonar o Sahel, mas "mas não podemos continuar a cooperar com a junta maliana". Por isso, é irrelevante se os soldados partem agora ou em 2024, afirma.

População do Mali desiludida

O debate sobre o fim da missão deixou grande parte dos malianos indiferente. "A população está muito desiludida com a MINUSMA. As pessoas acreditam que as tropas europeias não conseguem proteger os civis", disse Abba à DW.

Protestos anti-Ocidentais no Mali
Uma parte da população do Mali considera as tropas estrangeiras parte do problema e não a soluçãoFoto: Florent Vergnes/AFP/Getty Images

O analista Laessing discorda, apontando o "papel importante" da Bundeswehr na estabilização do norte do Mali, de onde fugiram milhares de pessoas do avanço dos jihadistas. Este foi um resultado da retirada dos franceses do Mali em agosto de 2022, por insistência da junta militar que governava em Bamako.

O vácuo no poder resultante foi preenchido pelos rebeldes islamistas, que agora controlam grandes partes do nordeste. Muitas pessoas fugiram para o Níger, a Argélia, mas também para a cidade de Gao. "O que mostra que a missão ainda é importante, pois sem a presença da Bundeswehr, Gao teria caído", lembra o analista.

Falta de consenso sobre a transferência de poder

As condições de trabalho da missão internacional de paz deterioraram-se rapidamente sob a junta militar que usurpou o poder em agosto de 2020. Por exemplo, as tropas alemãs não receberam atempadamente licenças de voo para os aviões de transporte A400-M e para a aeronave de reconhecimento Heron.

A junta liderada por Assimi Goita tentar reduzir a influência não só da antiga potência colonial França como de todo o Ocidente. O espaço está ser ocupado pela Rússia, que ofereceu ao país alimentos, fertilizantes e combustível necessitados com urgência, para além de armamento. Mercenários do grupo russo Wagner já estão no Mali há cerca de um ano, exacerbado o ressentimento na Europa.

Missão parceira no Níger

Segundo Laessing, apesar de haver soldados alemães que questionem o sentido da sua presença num país que lhes é estranho e assolado por conflitos que duram há séculos, muitos veem a contribuição da Alemanha para a solidariedade e estabilidade na região do Sahel como uma missão importante.

A ministra da Defesa Lambrecht confirmou recentemente  que a Bundeswehr vai participar futuramente em unidades de treino das forças especiais no vizinho Níger, um dos países mais pobres do mundo. A nova parceria entre a União Europeia (UE) e o Níger pretende reforçar a luta contra os jihadistas na região.

A missão, denominada EUMPM Níger, vai participar na criação de um centro de formação e um batalhão de comunicações. A duração inicial está prevista para três anos e deverá custar 27,3 milhões de euros, segundo informações da UE.

Ainda assim, o analista Abba considera a retirada das tropas do Mali um erro. "Sem o Mali, não há sucesso possível na luta contra o terrorismo". Isto porque independentemente das capacidades militares criadas no Níger, o movimento jihadista ocuparia o Mali. O que representaria um problema também para os vizinhos Níger e Burkina Faso", disse.

Mais eficiência militar

Para Olivier Guiryanan, a abordagem à adotada pela Alemanha e outros atores internacionais para garantir a segurança falhou. Guiryanan é diretor de Bucofore, um centro de investigação no Chade, especializado na África Central e Ocidental.

"As tropas teriam alcançado melhores resultados se se tivessem concentrado na construção da paz e no reforço dos serviços básicos", disse o pesquisador à DW.

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