Manuel Chivonde Baptista Nito Alves voltou a protestar esta sexta-feira (26.06) frente ao Consulado de Angola em Lisboa, chamando de gatunos os funcionários da instituição angolana, para onde se dirigiu com o objetivo de tratar de documentos pessoais. Vídeos postos a circular nas redes sociais confirmam os protestos, que dois polícias portugueses tentaram evitar a todo o custo.
De acordo com os relatos, foi o Consulado que chamou a polícia municipal, que acabou por prender Nito Alves.
"Em algum momento, quando ele tentava entrar no Consulado para tratar dos assuntos relacionados com o seu passaporte, chamaram a polícia, ele foi detido. Acredito que tenha sido porque ele estava a protestar e também porque ele já é conhecido do Consulado de Angola e conhecido na política angolana", afirma a advogada de Nito Alves, Marina Caboclo.
Advogada Marina Caboclo afirma que, mais uma vez, foi posta em causa a liberdade de protesto contra a situação política em Angola
"Não vejo por que motivo tenham chamado a polícia senão porque sabem que ele é uma figura que esteve a protestar em Angola. Também aqui em Portugal está sempre a protestar e a denunciar a situação política de Angola."
A advogada estranha que um Consulado, ao invés de apoiar um cidadão do seu país de origem e fazer valer os seus direitos, chame a polícia portuguesa para o reprimir por estar a fazer um protesto.
A DW África não conseguiu obter de imediato mais informações sobre a ocorrência, tanto junto da polícia como do Consulado, por este estar encerrado na parte da tarde. Por sua vez, a assessoria de imprensa da Embaixada de Angola deu a entender que desconhecia o que se tinha passado esta manhã no Consulado.
Nito Alves "foi humilhado"
Vídeos colocados imediatamente nas redes sociais, esta sexta-feira, mostram Nito Alves a desafiar a polícia, reclamando que não pode ser preso por estar em solo angolano. Ouve-se Nito Alves a afirmar que vai partir o carro do cônsul se não resolverem a sua situação.
Entretanto, a advogada de Nito Alves disse que o seu cliente foi "humilhado" na esquadra da polícia.
"Disse para nós que lhe deram tapa na cara - que foi agredido pela polícia -, que foi distratado, mas depois não foi feita nenhuma acusação formalmente contra ele hoje. Não foi registado nenhum facto. Só lhe deram documentos pedindo que ele regularize a sua situação migratória e foi depois levado de volta à frente do Consulado", relatou Marina Caboclo à DW África.
Processo contra o ativista
Em entrevista que concedeu recentemente à DW África, Nito Alves - um dos jovens do grupo dos 15+2, acusados em 2015 de tentativa de golpe de Estado contra o ex-Presidente José Eduardo dos Santos, afirmou que o estão a "perseguir".
"O que eles querem é ver-me ser humilhado e prejudicar a primeira região militar, que é a Resistência Movimento Revolucionário, para enfraquecer a nova geração que está a lutar por uma nação democrática", disse.
Nito Alves foi constituído arguido, acusado dos crimes de calúnia, difamação e incentivo à desordem. De acordo com a notificação da Polícia de Segurança Pública, a queixa-crime é da autoria de duas funcionárias ligadas ao Consulado da Embaixada de Angola em Lisboa.
Segundo a acusação, Alves, que já se apresentou às autoridades policiais a 4 de junho, terá proferido, numa manifestação em novembro do ano passado, palavras contra as autoridades angolanas, consideradas de insultuosas e caluniosas.
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Julgamento dos 15+2 em imagens
Julgamento polémico
Os 15+2 ativistas angolanos, acusados de atos preparatórios de rebelião, foram condenados a entre 2 e 8 anos de prisão efetiva. A defesa e ativistas de direitos humanos denunciam que o processo foi marcado por várias irregularidades. O julgamento começou logo com protestos, a 16 de novembro. Um ativista escreveu na farda prisional "Recluso do Zédu". Observadores internacionais ficaram à porta.
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Julgamento dos 15+2 em imagens
#LiberdadeJa
Antes e durante o julgamento, foram muitos os pedidos de "liberdade já!" para os ativistas angolanos. Essas foram também as palavras de ordem de uma campanha nas redes sociais pela libertação dos jovens a que se associaram músicos, escritores, ativistas e muitos outros cidadãos de dentro e fora de Angola.
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Julgamento dos 15+2 em imagens
"Justiça sem pressão"
Fora do tribunal, um grupo de manifestantes jurou acompanhar o julgamento dos 15+2 até ao fim. Vestiram-se a rigor com t-shirts brancas de apoio ao sistema judicial angolano, com os dizeres "Justiça sem Pressão" - "Estamos aqui a favor da Justiça, visto que Angola é um Estado soberano e que os tribunais têm o seu papel, com o qual nós estamos solidários", disse um dos manifestantes.
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Julgamento dos 15+2 em imagens
Irregularidades no processo
Em dezembro, os ativistas enviaram uma carta ao Presidente angolano onde apontavam irregularidades no processo. Os jovens queixavam-se, por exemplo, das demoras, da falta de acesso ao processo por parte da defesa antes do início do julgamento e da impossibilidade de manter contato visual com a procuradora Isabel Nicolau (na foto). Eram ainda denunciados casos de agressão física e psicológica.
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Julgamento dos 15+2 em imagens
Dois dias a ler o livro de Domingo da Cruz
"Ferramentas para Destruir o Ditador e Evitar Nova Ditadura". É este o título do livro escrito pelo ativista Domingos da Cruz, inspirado no livro "Da Ditadura à Democracia", do pacifista norte-americano Gene Sharp. Segundo a acusação, era este o manual dos ativistas para preparar uma rebelião. O livro foi lido na íntegra durante dois dias no Tribunal de Luanda.
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Julgamento dos 15+2 em imagens
"Governo de Salvação Nacional" é "embuste"
Dezenas de personalidades angolanas integram uma lista, divulgada online, de um "Governo de Salvação Nacional". Esse seria um Executivo que assumiria o poder em Angola após a rebelião pensada pelos ativistas, segundo a acusação. Vários declarantes faltaram à chamada e várias sessões tiveram de ser adiadas. Um dos declarantes, Carlos Rosado de Carvalho, disse que o suposto Governo era um "embuste".
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Julgamento dos 15+2 em imagens
Prisão domiciliária
A 18 de dezembro, 15 ativistas, detidos desde junho, passaram ao regime de prisão domiciliária. Laurinda Gouveia e Rosa Conde permaneceram em liberdade condicional. O tribunal autorizou os detidos a receber visitas de familiares e amigos. No entanto, não foi permitido qualquer contato com membros do "Movimento Revolucionário" e do "Governo de Salvação Nacional".
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Julgamento dos 15+2 em imagens
"Este julgamento é uma palhaçada"
Numa das sessões do julgamento, os ativistas levaram vestidas t-shirts com autocaricaturas como palhaços. Nito Alves disse em tribunal que o julgamento era uma palhaçada. Foi julgado sumariamente por injúria e condenado a 6 meses de prisão efetiva. Ativistas alertam que o estado de saúde de Nito Alves é grave e que Nito foi transportado numa maca para o tribunal de Luanda para ouvir a sentença.
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Julgamento dos 15+2 em imagens
Nuno Dala em greve de fome
Como forma de reinvindicar o acesso a contas bancárias e entrega de pertences, Nuno Dala entrou em greve de fome a 10 de março. Gertrudes Dala, irmã do ativista, lamentou a reação da sociedade civil e a defesa alertou para a situação financeiramente "delicada" da família. Outros ativistas também passaram por dificuldades durante a prisão domiciliária.
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Julgamento dos 15+2 em imagens
Ativistas são condenados
O tribunal de Luanda condenou, a 28 de março, os 17 ativistas angolanos. Domingos da Cruz, tido como "líder", deverá cumprir 8 anos e 6 meses de prisão efetiva. Luaty Beirão foi condenado a 5 anos e 6 meses. Rosa Conde e Benedito Jeremias foram condenados a 2 anos e 3 meses de prisão. Os restantes foram condenados a 4 anos e 6 meses. A defesa e o Ministério Público vão recorrer da decisão.
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Julgamento dos 15+2 em imagens
"Dia triste para a liberdade de expressão"
"Este é um dia muito triste para a liberdade de expressão e de associação", disse Ana Monteiro, da Amnistia Internacional, reagindo às sentenças. "Não deveria ter existido sequer um julgamento. Estamos a falar de cidadãos angolanos que estavam reunidos a falar sobre liberdade e democracia". Zenaida Machado, investigadora da HRW, considerou a condenação ridícula.
Autoria: Filipa Serra Gaspar