Angola: Falta de união no caso Cabinda
4 de janeiro de 2018Para a Frente de Libertação de Cabinda (FLEC-FAC) está claro: uma intervenção das autoridades portuguesas pode contribuir para encontrar uma solução sobre o futuro do território situado a norte de Angola.
A exortação ainda não mereceu reação oficial em Lisboa. A questão que se coloca é se Portugal poderá ter alguma influência em resposta ao apelo lançado pelos independentistas de Cabinda.
Manuel Dias dos Santos é sociólogo angolano e um dos membros da Plataforma de Reflexão sobre Angola e faz, por sua vez, um apelo à organização: "Antes da FLEC-FAC avançar e solicitar a intervenção do Governo português, no meu ponto de vista devia ela própria colocar-se de acordo com todas as outras fações independentistas e pessoas dentro de Cabinda que também há muitos anos vêm lutando sem pertencerem a nenhuma das fações da FLEC, para uma autonomia, para uma independência."
E o sociólogo justifica: "Porque os processos de independência não se dão da noite para o dia e exigem várias etapas. Há etapa em que Portugal poderia ser convocado por causa justamente do Tratado de Simulambuco."
Falta de união compromete o caso Cabinda
Manuel Dias dos Santos recorda que a FLEC-FAC não representa, de todo, todas as vozes que pugnam pela independência de Cabinda. Para ele o fator união ainda é um "calcanhar de Aquiles": "E um dos grandes dramas de todas as lutas nacionalistas para a independência, para a autonomia, tem sido essa. É que não há uma convergência por parte daqueles que se consideram os injustiçados em se juntar, porque acredito que no tempo da guerra fria e outras circunstâncias isso até se colocava."
E o sóciólogo alerta: "Porque enquanto estiverem em desacordo e não criarem uma espécie de frente unida, voltando aos velhos tempos tempos da década de 60 e 70, não têm a mínima hipótese. Quer dizer, será mais uma voz a ecoar no meio do deserto.
O analista questiona os Acordos de Alvor e a posição de Portugal em não contemplar a questão de Cabinda separadamente, porque, afirma, esta é uma responsabilidade histórica do Governo português, não importa que governo for.
Há cerca de 50 anos que a FLEC-FAC luta pela independência de Cabinda, contestando o que apelida de "invasão militar angolana após o Acordo de Alvor”, assinado em 1975. A organização refere no seu comunicado que "as autoridades portuguesas, sem qualquer consulta aos cabindas, deixaram de respeitar o tratado de Simulambuco, que lhes conferia um estatuto de protetorado português."
Manuela Serrano, da Associação Tratado de Simulambuco, acredita que Portugal não irá intervir junto de Luanda a favor da independência de Cabinda. Mas a Associação espera uma ação do Governo português, argumentando que "se Portugal, ao descolonizar, descolonizou mal entregando o que não fazia parte [de Angola], a Associação Tratado de Simulambuco acha que realmente Portugal tem uma palavra a dizer também a ser parte da solução."
A representante da associação de direitos humanos lembra a Constituição Portuguesa de 1933, que diz que Cabinda nunca fez parte de Angola.
Aproveitar a abertura de João Lourenço
Manuela Serrano diz que o novo Presidente da República de Angola, João Lourenço, tem mostrado uma certa abertura e seria louvável se Portugal exercesse a sua influência no plano diplomático no sentido de sensibilizar o Governo de Angola a ponderar sobre o destino de Cabinda.
Para a representante da Associação "esta é hora ideal": "Porque ninguém gosta de ser subjugado. Angola também não gostou de ser subjugada. Gostou de ser livre. Como disse o próprio Mário Soares numa entrevista – que reconhecia que realmente tinha errado em relação a Cabinda, mas que agora o problema era de Angola – que Angola tinha gostado de ser livre também não devia negar essa liberdade a outros e que devia realmente tentar chegar a um acordo e conversarem sobre isso."
A FLEC-FAC diz no seu comunicado que o primeiro-ministro português, António Costa, e o seu Governo socialista não podem mais ignorar a situação em Cabinda.
A organização apela o primeiro-ministro português a olhar para Cabinda "não como um grande poço de petróleo, mas como um território habitado por gentes sem direitos, com vontade de lutar pela sua autodeterminação".