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O previsível conflito entre o governo Lula e o Banco Central

Alexander Busch | Kolumnist
Alexander Busch
28 de dezembro de 2022

O destino da economia nos próximos anos está principalmente nas mãos do próprio Lula. O futuro presidente desfruta da confiança de investidores estrangeiros, mas no Brasil a desconfiança é grande, escreve Alexander Busch

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Luiz Inácio Lula da Silva
"Contraste entre o sentimento no Brasil e no exterior mostra o dilema que a gestão Lula enfrentará na economia a partir de 1º de janeiro", escreve Alexander BuschFoto: AFP

Desde a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, no fim de outubro, o clima no mercado financeiro brasileiro se deteriorou significativamente: o Ibovespa chegou a despencar 12%. O euro valorizou quase 10% em relação ao real, e crescem os temores de que as taxas de juros subam em vez de cair.

Ao mesmo tempo, a diferença entre as avaliações de investidores do Brasil e do exterior é impressionante: estrangeiros continuam comprando ações do país, enquanto brasileiros as vendem. O interesse dos fundos estrangeiros é crucial para que a Bolsa não continue a cair. As avaliações de risco dos investidores estrangeiros também quase não mudaram desde a eleição de Lula. O índice Embi, que representa os prêmios de risco (juros) que os investidores estrangeiros exigem para comprar títulos brasileiros, pouco mudou desde a vitória eleitoral de Lula.

Esse contraste entre o sentimento no Brasil e no exterior mostra o dilema que a gestão Lula enfrentará na economia a partir de 1º de janeiro: no exterior, investidores por ora tratarão o governo brasileiro com tolerância. Eles olham para o Brasil com interesse, porque as ações e títulos brasileiros são atualmente muito baratos na comparação internacional. A taxa real de juros de cerca de 8% (ou seja, a taxa de juros deduzida a inflação) também continua a atrair investidores estrangeiros, sendo muito alta na comparação global.

Novo boom das commodities?

Além disso, investidores do exterior consideram que Lula poderia se beneficiar do desenvolvimento dos mercados globais de commodities – como há 20 anos, no início de seu primeiro governo. O fim da política de tolerância zero em relação à covid-19 na China poderia desencadear um boom de crescimento no país asiático e elevar os preços globais de commodities.

Desde meados de novembro, os preços de algumas commodities das quais o Brasil é um importante fornecedor para o mercado mundial aumentaram significativamente. Isso se aplica a soja, minério de ferro, suco de laranja, açúcar e café. A economia brasileira poderia, portanto, se beneficiar novamente de ventos favoráveis vindos dos mercados mundiais de commodities em 2023.

Panorama sombrio

Lula não pode contar com um ambiente igualmente favorável para a economia no Brasil. As perspectivas são mistas. A economia irá estagnar em 2023. É previsto um crescimento máximo de 1% no próximo ano. A inflação está atualmente em 6% e não deverá ficar abaixo de 5% no próximo ano. O desemprego está em 8%, mas é provável que volte a aumentar um pouco devido ao fraco crescimento econômico.

Dado o panorama bastante sombrio, os investidores brasileiros prestarão atenção aos sinais de Brasília: eles esperam decisões, reformas e anúncios favoráveis ao mercado por parte do novo governo. Se estes não se concretizarem, continuarão a reagir com cautela, como fizeram após as primeiras declarações de Lula e sua equipe econômica.

É problemático para a economia que o governo queira expandir massivamente os gastos públicos sem explicar como pretende financiar isso. Ao mesmo tempo, o governo quer retomar sua política industrial e fomentar setores como o naval para a indústria de petróleo e gás e petroquímico. O BNDES deverá promover investimentos adicionais. E todas essas instituições estatais deverão ser comandadas principalmente por políticos. Além disso, não deverá mais haver privatizações.

Esse pacote de medidas anunciado até agora concentra-se no Estado como ator. Mas o Estado está falido e muito endividado. Não está claro o papel que as empresas privadas deverão desempenhar.

O perigo é que um grande aumento dos gastos governamentais desencadeie um novo ciclo de baixo crescimento, inflação elevada e altas taxas de juros.

Banco Central X governo

É, portanto, previsível um conflito do novo governo com o Banco Central, que é autônomo desde 2021 e cujo presidente Roberto Campos Neto só pode ter seu sucessor definido pelo governo Lula a partir de 1º de janeiro de 2025.

Isso porque os riscos estão aumentando e o Banco Central só deverá começar a baixar as taxas de juros no fim do ano que vem – ou não o fará de forma alguma. Atualmente, a Selic, a taxa básica de juros, está em 13,75%. Se houver um consenso crescente nos mercados financeiros de que a inflação ainda estará acima do teto de 4,75% dentro de 24 meses, o Banco Central não terá outra escolha senão deixar as taxas de juros em um nível mais alto.

O governo considerará isso uma sabotagem de sua política econômica pelos mercados – e aumentará maciçamente a pressão política.

Conclusão: está em grande parte nas mãos do novo governo Lula como a economia se desenvolverá no ano que vem.

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Há mais de 25 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul do grupo editorial Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt) e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em São Paulo e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.

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Tropiconomia

Há mais de 25 anos, Alexander Busch é correspondente de América do Sul para jornais de língua alemã. Ele estudou economia e política e escreve, de Salvador, sobre o papel no Brasil na economia mundial.