Bissau: "Há manobras para acantonar vozes incómodas"
15 de novembro de 2022Mais de 20 anos após a sua legalização, Silvestre Alves viu o seu partido, o Movimento Democrático Guineense (MDG), ser extinguido pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ), juntamente com outras 27 forças políticas.
A instância máxima da Justiça do país justificou a decisão com a falta de entrega de provas de existência dos partidos. A determinação também se prende com o facto de aqueles partidos não terem provado que possuem sede própria e pelo menos mil militantes.
Silvestre Alves diz que a decisão é ilegal e não o surpreende. "Era de esperar que houvesse manobras para acantonar as vozes mais incómodas", afirma o político, que promete não ficar calado.
Alves diz que é o próprio STJ que está a violar a legislação guineense: "Não há uma lei de aplicação que defina como e quando é que o Supremo pode aferir esses dados."
Em entrevista à DW, o líder do MDG, partido que nunca governou a Guiné-Bissau, diz que o Supremo Tribunaldeveria rever o resultado das últimas eleições legislativas para saber quem é que perdeu militantes para quem, ou então deveria fazer essas exigências quando os partidos forem entregar as candidaturas para as próximas eleições, ainda oficialmente marcadas para 18 de dezembro.
"Democracia de narcotraficantes"
Silvestre Alves considera que a decisão do Supremo evidencia o risco que a democracia corre na Guiné-Bissau-
"Temos uma democracia comercial, uma democracia de narcotraficantes, onde a barriga fala mais alto do que a cabeça", afirmou, acusando o Supremo Tribunal de ter dois pesos e duas medidas no cumprimento das leis entre os partidos.
"Se o Supremo quer cumprir a lei, que não cumpra apenas uma parte, porque há o problema também do financiamento dos partidos e da apresentação das contas, que talvez pudesse evidenciar o financiamento do narcotráfico aos partidos", disse Alves à DW.
PUN diz que está legal
Não é só Silvestre Alves que contesta a decisão judicial. Também Idriça Djaló, líder do Partido da Unidade Nacional (PUN), se queixa da extinção da sua força política
"O PUN defende as liberdades fundamentais, a liberdade de imprensa. Claro que um partido assim, num ambiente de corrupção generalizada, de narcotráfico, de partidocracia, é um partido que incomoda bastante", reagiu Djaló.
"Não é surpreendente que argumentos falaciosos sejam utilizados pelo Supremo Tribunal de Justiça, incluindo argumentos liberticidas só para calar uma voz crítica", prosseguiu.
Posição do PGR
O líder do PUN, partido da oposição extraparlamentar, refere ainda que a legislação guineense dá aos partidos 90 dias para apresentar provas de que têm mil militantes e não apenas os 15 dias concedidos pelo Supremo.
Djaló disse que denunciou isso até ao Procurador-Geral da República, Bacari Biai, que terá concordado com a direção do PUN, de que a decisão do STJ é ilegal. Em seguida, Biai teria comunicado a ilegalidade ao presidente do Supremo Tribunal, Pedro Sambú, que "concordou em corrigir o lapso, mas não o fez".
A DW tentou, sem sucesso, contactar o Procurador-Geral guineense.
Enquanto Idriça Djaló promete recorrer da decisão junto do plenário do Supremo Tribunal, Silvestre Alves apresenta uma solução diferente para os problemas que o país enfrenta: "A Guiné-Bissau já não tem mais nada para oferecer, e o processo neste momento reclama uma revolução autêntica, um corte com o passado, uma refundação do Estado. A podridão é tanta, a mentira é tanta, a falta de caráter e de vergonha é demais", afirmou o jurista e político.
A Guiné-Bissau tem 52 partidos legalizados, mas, segundo o Supremo, "muitos não conseguem dar prova de vida". A decisão do tribunal não abrange nenhum dos seis partidos com representação no último Parlamento eleito da Guiné-Bissau, que foi dissolvido em maio pelo Presidente Umaro Sissoco Embaló.