Guiné-Bissau: Padre alvo de ameaças após "reflexão" sobre PR
7 de janeiro de 2022O padre católico Augusto Mutna Tambá denuncia ameaças de morte na sequência da reação às declarações do Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, contra o bispo de Bissau, Dom José Lampra Cá. Em carta aberta divulgada nas redes sociais, Augusto Tambá, pároco da diocese de Buba, no sul da Guiné-Bissau, classificou as críticas do chefe de Estado como um "ataque desnecessário" ao bispo que, disse, "apenas está ao serviço da sua missão eclesiástica".
Agora, diz estar a ser alvo de ameaças através de mensagens e telefonemas. "A primeira mensagem que recebi é de um senhor que agora não quero revelar o nome, mas com calma e prudência a imagem já está no meu perfil do Facebook. Depois, alguém me ligou insultando e acusando com injúrias. A segunda pessoa disse-me 'sabes que podemos reduzir-te a pedaços por causa daquilo que escreveste'", conta à DW África.
O padre guineense não tem dúvidas: as ameaças são uma tentativa de silenciar vozes críticas à crise social e política que se vive na Guiné-Bissau. "Mas não é por causa de alguém que pode silenciar a minha voz, restringir a minha liberdade, que vou deixar de fazer reflexões como antes fazia", garante. "Assumo em pleno a carta aberta que fiz, ninguém me intimida por causa da minha opinião".
Para Augusto Tambá, as declarações do Presidente da República contra o bispo de Bissau são um atentado contra si e contra a religião. "Sobretudo a religião católica, porque o Presidente disse que não precisa dos bispos na política. É contraditório, porque tem um imã no Conselho de Estado", considera.
Sissoco Embaló é "o responsável moral e político"
O padre Augusto Mutna Tambá pondera abrir um processo para proteger a sua integridade física, caso as ameaças continuem. Um caso que não surpreende Bubacar Turé, vice-presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH): "Não sabemos as origens ou as motivações [das ameaças contra Augusto Tambá], mas não há dúvidas de que o tipo de discurso político do Presidente da República é um claro incentivo a ações de violência desta natureza", afirma, em entrevista à DW.
"Se há algum responsável moral e político é claramente o senhor Presidente da República. A forma como reagiu a uma declaração normal do bispo de Bissau é totalmente inaceitável num estado de direito democrático. É uma forma de condicionar, uma tentativa de chantagear, e tudo isso enquadra-se na estratégia do Presidente de instalar um regime autoritário, absolutista, que quer controlar a mente das pessoas", sublinha.
Bubacar Turé considera que "desde que acedeu ao Palácio da República", Sissoco Embaló "tem habituado os guineenses a contradições e discursos inadequados e que revelam a sua inabilidade para o exercício das mais altas funções que está a exercer".
"Filhos e enteados" religiosos?
"Ele não pode querer chantagear os atores sociais, numa altura em que tenta manipular algumas pessoas ligadas a certas confissões religiosas contra outras", acusa o vice-presidente da LGDH.
Turé concorda que, do lado do Presidente, há "filhos e enteados religiosos". "Tudo isso se insere na estratégia de condicionar o exercício das liberdades e chantagear as vozes discordantes. À luz da nossa Constituição, não há nada que impeça um bispo ou um padre ou um religioso de exercer a atividade política", lembra.
Ainda assim, o representante da LGDH não acredita num conflito inter-religioso iminente, "não obstante o Presidente insistir sistematicamente em manipular alguns setores da comunidade muçulmana contra a igreja católica".
Bubacar Turé afirma que "esta é a segunda vez em que Sissoco Embaló tenta manipular algumas correntes, organizações representativas da comunidade islâmica, a reagir contra a igreja católica" e defende que "a sociedade guineense deve unir-se e tentar travar estas manobras que são muito perigosas e que tendem a criar caos".