Bruxelas admite agravamento da crise climática em Moçambique
16 de março de 2024"As maiores crises em África são bem conhecidas: o Sudão, o Sahel, a República Democrática do Congo no leste do país, Moçambique no norte, especialmente na região de Cabo Delgado, a Somália ou o Corno de África. A maioria destas crises devem-se a conflitos, mas alguns dos conflitos são também alimentados pelas alterações climáticas", afirmou Janez Lenarcic, em entrevista à agência Lusa e a outros meios europeus em Bruxelas.
Antecipando o Fórum Humanitário Europeu, que decorre em Bruxelas na segunda-feira e terça-feira para arrecadar doações para ajuda humanitária, o responsável precisou que "as alterações climáticas são um fator agravante e multiplicador de crise, que se junta à fragilidade dos países e das comunidades e agrava a situação humanitária".
"Este é o caso de Cabo Delgado, em Moçambique. Nos últimos anos, Moçambique tem sido afetado por repetidos ciclones tropicais, algo que não acontecia com tanta frequência no passado e que aponta claramente para uma possível ligação com as alterações climáticas, por isso acreditamos que as alterações climáticas vão aumentar e ser cada vez mais uma causa de crise humanitária", declarou Janez Lenarcic, em resposta a uma questão da Lusa.
"Precisamos de paz em Cabo Delgado", acrescentou o responsável, apontando que, apesar de a União Europeia (UE) avançar com ajuda humanitária para alimentos, água e cuidados de saúde, só a estabilidade permitirá atenuar os efeitos climáticos.
Quando se estima que quase 300 milhões de pessoas em todo o mundo necessitem de assistência humanitária, a UE adotou um orçamento humanitário anual de mais de 1,8 mil milhões de euros para 2024, com mais de metade destas verbas a serem destinadas a África.
"África continua a ser o continente com a maior parte das crises humanitárias com que lidamos", reconheceu Janez Lenarcic.
Ajuda europeia
Do 'bolo' total, a Comissão Europeia destina cerca de 346 milhões de euros para as populações da África Oriental e Austral afetadas por conflitos de longa duração na região dos Grandes Lagos, bem como as pessoas deslocadas devido a fenómenos meteorológicos extremos e a conflitos armados no Sudão, Sudão do Sul, Uganda, Madagáscar, Moçambique e Corno de África (Jibuti, Etiópia, Quénia e Somália).
Além disso, a instituição aloca perto de 200 milhões de euros da UE para fazer face às consequências das deslocações forçadas, da insegurança alimentar, da subnutrição aguda e crónica, dos riscos naturais e das epidemias recorrentes no Sahel (Burquina Faso, Mali, Mauritânia e Níger), na República Centro-Africana e na bacia do Lago Chade (Chade, Camarões e Nigéria), que são alimentadas por conflitos, insegurança e alterações climáticas.
Moçambique é considerado um dos países mais severamente afetados pelas alterações climáticas no mundo, enfrentando ciclicamente cheias e tempestades tropicais durante a época chuvosa, que decorre entre outubro e abril.
A esta situação soma-se a insegurança, já que a província de Cabo Delgado enfrenta há sete anos uma insurgência armada com alguns ataques reclamados pelo grupo extremista Estado Islâmico.
Depois de uma ligeira acalmia em 2023, estes ataques multiplicaram-se nas últimas semanas.
Também nos últimos meses, registaram-se fenómenos climáticos extremos, que levaram dezenas de milhares de pessoas a abandonarem as suas casas.
No final do ano passado, as Nações Unidas apelaram à comunidade internacional para doar 413 milhões de dólares (cerca de 380 milhões de euros) para as necessidades humanitárias de Moçambique em 2024, mas até agora o país só recebeu 6% desses fundos dos doadores.