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Na Alemanha, Sergio Moro tenta vender "terceira via"

25 de março de 2022

Com giro pela Alemanha, Moro quis mostrar que tem audiência internacional. Mas agenda ficou restrita a políticos de segundo escalão. Partido do chanceler Scholz, que não esconde preferência por Lula, manteve distância.

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Brasilien Brasilia | Sergio Moro, Justizminister | Rücktritt
Foto: Reuters/U. Marcelino

Está chegando ao fim a semana de visita à Alemanha do pré-candidato a presidente da República Sérgio Moro. O ex-juiz "lava-jatista" e atual político pelo Podemos cumpriu uma agenda de encontros com alguns políticos e empresários alemães.

"É uma tradição da política brasileira buscar audiência internacional para mandar uma mensagem interna", avalia o cientista político Oscar Vilhena Vieira, professor da FGV de São Paulo.

"Ele quer transmitir a mensagem de que tem uma audiência internacional, de que é capaz de participar de um debate internacional", diz Vilhena em conversa com a DW Brasil.

Depois da Operação Lava Jato, que terminou no desmantelamento dos processos produzidos por Moro, e de sua tumultuada passagem pelo Ministério da Justiça do presidente Jair Bolsonaro, Moro agora está em busca por um certo prestígio.

Segundo pesquisas recentes, Moro está no top 3 de candidatos à presidência, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, e de Bolsonaro, atualmente no PL. Apesar do terceiro lugar, ele apareceu bem atrás no Datafolha publicado nesta quinta-feira. Enquanto Lula tem 43% das intenções de voto e Bolsonaro conta com 26%, Moro aparece com apenas 8%.

Em novembro do ano passado, Lula fez um giro bem-sucedido pelo Europa, no qual foi recebido pelo presidente francês, Emmanuel Macron, pelo novo chanceler alemão, Olaf Scholz, pelo chefe de governo da Espanha, Pedro Sánchez, e pela prefeita de Paris, Anne Hidalgo.

O presidente Bolsonaro, por sua vez, respondeu viajando a Moscou em meados de fevereiro para conversas com o presidente russo, Vladimir Putin. Depois, encontrou-se com o primeiro-ministro Viktor Orbán, da Hungria. Tanto Putin quanto Orbán são figuras isoladas no cenário internacional, assim como Bolsonaro.

Contraponto a Bolsonaro e a Lula

Agora foi a vez de Moro ter uma agenda internacional. Mas seu giro foi bem mais modesto.

Na Alemanha, Moro se encontrou com os deputados federais Anton Hofreiter, do Partido Verde, Gregor Gysi, líder histórico da legenda A Esquerda, e Peter Ramsauer, da União Social Cristã (CSU) e o ex-deputado Alexander Kulitz, do Partido Liberal Democrático (FDP). Todos são políticos apenas do segundo escalão na Alemanha ou perderam influência nos últimos anos.

Destes, apenas Ramsauer, que foi ministro dos Transportes do segundo governo de Angela Merkel, fez questão de divulgar o encontro. "Tive um visitante muito interessante e proeminente do Brasil: Sergio Fernando Moro. Nas próximas eleições presidenciais ele estará desafiando como um candidato promissor o atual presidente Bolsonaro", escreveu o deputado conservador em sua conta no Facebook.

Notáveis exceções na agenda de Moro foram figuras relevantes do Partido Social-Democrata (SPD), a legenda do atual chanceler Olaf Scholz. Entre as figuras do partido, Moro só teve um encontro com o editor e ex-ministro da Cultura Michael Naumann, que tem mais influência no cenário cultural do que na política partidária.

No ano passado, o SPD não escondeu sua preferência por Lula nas eleições brasileiras. O partido tem laços históricos com PT, e Lula foi especialmente próximo do ex-chanceler social-democrata Helmut Schmidt. Diversas figuras do SPD também se manifestaram entre 2018 e 2019 contra a prisão do ex-presidente petista. Em 2021, Lula começou seu giro pela Europa se encontrando com Scholz, que ainda negociava a formação do atual governo alemão.

Não é surpresa, avalia Vilhena. "Moro não é uma figura que tenha o impacto que o Lula tem e as alianças que Lula construiu ao longo de mais de 40 anos de carreira política. Lula é um político com uma densidade muito grande, com alianças históricas."

A agenda sem encontros com figuras de peso não passou despercebida por adversários de Moro. O pré-candidato Ciro Gomes (PDT), aproveitou a publicação de um vídeo de Moro em frente ao Parlamento alemão, em Berlim, para provocar:  "A julgar pela imagem que postou, Sergio Moro foi recebido no Bundestag, o Parlamento Alemão, pelo porteiro do prédio ou pelo jardineiro".

Luiz Inácio Lula da Silva e Olaf Scholz
Lula e Olaf Scholz durante encontro em novembroFoto: Ricardo Stuckert/Instituto Lula

Apenas 8% votariam atualmente em Moro

Mas é com o isolamento no Brasil que Moro deve se preocupar. Sua base está encolhendo, avalia Vilhena. Quando Moro entrou no governo Bolsonaro, perdeu o apoio das pessoas que não gostam de Bolsonaro. E quando Moro deixou o governo Bolsonaro, perdeu o apoio dos bolsonaristas. "Ele tem uma base de apoio bastante pequena, de centro-direita, com movimentos jovens muito instáveis." E tal instabilidade tem prejudicado a campanha de Moro.

É o caso do Movimento Brasil Livre, o MBL, cujo fundador, o deputado federal Kim Kataguiri, se envolveu recentemente num escândalo ao defender a liberdade de expressão para partidos nazistas. Ou do deputado estadual Arthur do Val, que se destacou negativamente por comentários sexistas. 

"É uma frente que se coloca como ultraliberal, mas que tem um liberalismo exacerbado a ponto de defender liberdade de expressão até para apologia ao nazismo. Além disso, Moro não tem, no Podemos, uma estrutura partidária relevante." Para Vilhena, a grande expectativa de Moro era que ele representasse uma direita civilizada. "Mas ele tem dificuldade de fazer isso, pois a base dele não é de uma direita civilizada".

A importância do plano internacional

Para o cientista político Ricardo Ismael, a viagem de Moro à Alemanha é importante para a campanha eleitoral. Há uma série de questões que passam pelo plano internacional, como, por exemplo, a guerra na Ucrânia e o Acordo Comercial entre a União Europeia e o Mercosul. "Ele tem que mostrar que está acompanhando estas agendas e que mantém contato (com o exterior)", avalia o cientista político, em conversa com a DW Brasil.

Segundo Ismael, Moro precisa mostrar que tem conhecimento da agenda internacional, que aparecerá na campanha presidencial. "E a Europa é o lugar onde Bolsonaro tem muitos críticos e um desgaste muito grande." Também tenta se diferenciar de Bolsonaro a respeito da guerra na Ucrânia, reforçar que pensa diferente de Bolsonaro na questão ambiental e que sempre buscou o combate à corrupção.

"Moro continua tentando se tornar uma opção, caso Bolsonaro não chege ao segundo turno. Esse é o sonho que a terceira via alimenta, que, em algum momento, possa haver um segundo turno contra Lula."

Pensamento antipetista ainda existe

Para Ismael, Moro foca no discurso do combate à corrupção, assunto que ele domina bem. "E isso é um tema que ainda desgasta o ex-presidente Lula, o caso Petrobrás ainda está na memória de parte do eleitorado que tem um pensamento antipetista." O assunto também atingiria Bolsonaro, segundo Ismael, que "prometeu uma série de coisas e não fez".

Assim, Moro cresce na classe média antipetista e antibolsonarista, avalia Ismael. Mas, mantém sua falta de diálogo com o eleitorado de baixa renda. Pesa seu fracasso como ministro de Bolsonaro e as revelações da The Intercept, que mostraram ligações indevidas entre o juiz Moro e os delegados da Lava Jato, a fim de prejudicar Lula e o PT.

Hoje, sua rejeição só é superada pela rejeição do eleitorado a Bolsonaro. "Aquela aura de um herói nacional, que existia em 2016 até 2018, desapareceu, de modo que a campanha anti-Moro, feita principalmente pelo PT, tem sido muito eficiente."

Thomas Milz
Thomas Milz Jornalista e fotógrafo