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Portugal: Incidentes no "Bairro da Jamaica" em tribunal

14 de janeiro de 2021

Elementos de uma família angolana estão a ser julgados na sequência de confrontos com agentes da polícia portuguesa, ocorridos no Bairro da Jamaica, arredores de Lisboa, onde vivem maioritariamente afrodescendentes.

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Foto: João Carlos

Uma mãe, três filhos e um polícia suspenso de funções estão a ser ouvidos por vários crimes no Tribunal de Almada, depois do Ministério Público ter deduzido acusação contra os cinco arguidos em outubro de 2019. 

Os advogados de defesa das vítimas de agressões policiais insurgem-se contra a versão dos factos narrados esta quinta-feira de manhã pelo tribunal, no início da sessão, e vão defender que seja feita justiça com a apresentação de novas provas. 

O "incidente" que deu que falar em Portugal

Eram cerca das 10 horas da manhã quando o coletivo de juízes, acompanhado do procurador do Ministério Público, deu início ao julgamento do conhecido "Caso Jamaica". O tribunal ouve nos próximos dias a versão dos factos pela boca dos quatro arguidos, membros de uma família angolana, à luz dos acontecimentos de 20 de janeiro de 2019.

Portugal I Prozessbeginn gegen angolanischen Familie
Advogados de defesa dizem que o que ouviram em tribunal esta quinta-feira (14.01) não corresponde aos factosFoto: João Carlos

Na altura, agentes da Polícia Pública Portuguesa (PSP), então chamados ao bairro por volta das 6 da manhã, por causa de desentendimentos entre mulheres rivais numa festa de aniversário, num café, viriam a confrontar-se com um grupo de moradores. Um vídeo posto a circular nas redes sociais, e que faz parte do processo, mostra a violência entre a polícia e alguns moradores do Vale de Chícharos, no concelho do Seixal, mais conhecido por "Jamaica".

Mas, segundo José Semedo Fernandes, um dos quatro advogados de defesa da família, a versão do que aconteceu em 2019, que consta nos autos, apresentada ao tribunal pela juíza que preside ao julgamento, não corresponde aos factos.

"Na fase de inquérito, a titularidade da ação penal é do Ministério Público, que conduz a investigação e decide, materializando-a na acusação. Neste momento, estamos em audiência de julgamento e queremos neste caso que seja feita justiça. A vida de algumas destas pessoas [sofreu] consequências por esse facto, mas acreditamos que vai ser feita justiça e que parte desse erro vai ser reparado", diz o advogado. 

Elementos da família angolana queixam-se de agressão polícial

Os factos, a serem provados, não serão com base em indícios, acrescenta José Semedo Fernandes.

"Toda a gente viu o vídeo e todas as pessoas podem tirar as suas ilações através do vídeo. O vídeo é o elemento fulcral para esta prova, mas existem outras provas que nós estamos a trazer ao processo e acreditamos que ajudarão na defesa dos nossos interesses." 

Portugal | Afrikaner in Lissabon | Wandmalereien
Famílias africanas passam dificuldades em bairros degradados como o "Bairro da Jamaica"Foto: J. Carlos

Nas considerações diante do tribunal, Lúcia Gomes, outra advogada da família, disse que o processo vem todo ele enviesado desde o início, isto porque "as imagens demonstram que houve agressões gratuitas a pessoas que estão a ser julgadas sem que em nenhum momento tivessem agredido os polícias."

A defesa fala ainda de abuso da autoridade por parte de alguns agentes policiais.

"O Ministério Público não respeitou o princípio da imparcialidade ao deduzir acusação contra os quatro elementos da família. As pessoas agredidas gratuitamente agiram em defesa da família", afirmou a advogada Lúcia Gomes. 

A mãe, Julieta, responde pelo crime de resistência e coação. Um dos filhos, Hortêncio, está pronunciado por nove crimes, dois de resistência e coação e sete de injúria agravada. Outro filho, Flávio, responde por oito crimes, sendo dois de resistência e coação, dois de ofensa à integridade física qualificada, um de dano e de introdução em lugar vedado ao público e dois crimes de ameaça agravada. Sobre a filha, Higina, recaem os crimes de resistência e coação, um de dano, um de introdução em lugar vedado ao público e dois de ameaça agravada. O pai, Fernando, é ouvido como assistente, na qualidade de ofendido. 

Agente da polícia suspenso é arguido

Apenas um polícia, agora suspenso da PSP, faz parte do processo como arguido, sobre o qual recai o crime de ofensas à integridade física simples.

O seu advogado, João C. Pinto, abordado pela DW África, negou comentar o caso, afrrmando que "não presta declarações sobre processos pendentes".

"Os advogados discutem os casos na sala de audiências, que é o local sagrado que os humanos estabeleceram para fazer justiça", referiu.

O advogado disse nas considerações iniciais que, "independentemente da cor, não se deve transformar um caso da vida numa forma avulsa e com preconceito prévio de uma dada maneira sem vermos o final da prova que se produz".