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Moçambique desperdiça dinheiro em material hospitalar

19 de abril de 2021

O Ministério da Saúde viu-se obrigado a destruir material médico avaliado em 300 mil euros que estava fora da validade. CIP denuncia falta de planeamento. Médico e explica que incinerar o equipamento foi a opção correta.

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Mosambik Probleme Gesundheitssystem Manica
Foto ilustrativaFoto: Bernardo Jequete/DW

O Ministério da Saúde de Moçambique (MISAU) mandou incinerar materiais hospitalares fora do prazo de validade que estavam avaliados em 20 milhões de meticais, cerca de 300 mil euros. A denúncia foi feita esta segunda-feira (19.04) pelo Centro de Integridade Pública (CIP), que cita documentos oficiais que autorizaram a incineração dos materiais que estavam num centro de abastecimento em Maputo. 

O relatório avança que a vice-ministra da Saúde, Lídia Cardoso, em novembro de 2020, através de uma nota oficial, "ordenou que fossem retirados e incinerados no mais curto espaço de tempo milhares de materiais fora de prazo, para se ganhar mais espaço em armazém". 

Gesundheitswoche in Cabo Delgado | Nord-Mosambik
Lídia Cardoso, vice-ministra da Saúde de MoçambiqueFoto: Delfim Anacleto/DW

Falta de planeamento

Os produtos incinerados, segundo a ONG, foram adquiridos através do Orçamento do Estado.

Em entrevista à DW, Ben Hur Cavelane, investigador do CIP, aponta que "há um problema gravíssimo de planificação real das necessidades a nível das unidades sanitárias, mas também dos centros de abastecimento de nível provincial e até mesmo aquilo que são as necessidades ao nível do distrito".

Para o CIP, esta situação "gera sempre crises de rutura de stocks nos hospitais e centros de saúde nas províncias e nos distritos enquanto estes insumos se encontram armazenados em Maputo".

"O que acontece nas unidades sanitárias são queixas recorrentes dos próprios profissionais da saúde, que têm falta de produtos hospitalares para o desempenho das suas funções. Muito antes da pandemia nós já verificávamos situações de falta de equipamentos básicos. E com a pandemia essa situação veio a agravar-se", asseverou.

No entanto, Ben Hur Cavelane avança que o problema não é restrito à capital. "Nós, no ano passado, estivemos na província do Niassa e identificámos uma situação semelhante, onde grande parte do material médico e hospitalar tem estado a deteriorar-se nos espaços comuns por falta de condições de armazenamento, mas também por negligência por parte dos próprios técnicos", denuncia.

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Novos casos reportados em África por milhão de habitantes (média a 14 dias)

O médico e investigador da ONG Observatório Cidadãos para a Saúde Jorge Matine diz que o desperdício de material hospitalar e de medicamentos em Moçambique "não é novidade". Uma das razões seria o curto prazo de validade com os quais esses materiais chegam ao país, seja por via de compra pelo Governo ou doação de parceiros.

"A gestão da cadeia logística ainda é deficiente. Normalmente, o que chega por último [aos armazéns] é o que sai primeiro, porque não há um sistema que tenha essa capacidade de fazer uma monitoria permanente, ou um sistema eletrónico, que permita ter uma capacidade de extrair a informação de forma adequada", destaca.

Jorge Matine
Jorge Matine, médico e investigador da ONG Observatório Cidadãos para a SaúdeFoto: Privat

Burocracia, um outro obstáculo

O CIP frisa também que a burocracia é outro obstáculo na gestão dos materiais hospitalares. "Há um excessivo zelo nos processos de requisição desses materiais. Os diretores gerais das unidades sanitárias fazem a requisição deste material, mas até à sua alocação leva tempo. E por vezes os centros de abastecimento respondem negativamente, mesmo tendo esse material", explica.

O médico e pesquisador do Observatório Cidadãos para a Saúde Jorge Matine considera correta a atitude do Ministério da Saúde na incineração dos materiais fora do prazo de validade. 

"Há casos de medicamentos fora do prazo que estavam a ser vendidos no sistema público e no sistema informal. Portanto, nesse caso, o MISAU deve realmente destruí-los para que não sejam um perigo para a saúde pública", defende.

Ainda assim, o CIP faz um apelo: "Para nós é uma situação de impunidade, onde se abre espaço para que quem de direito, seja o Ministério Público e outras entidades interessadas em procurar perceber melhor esta situação, comece a fazer o seu trabalho".

A DW procurou ouvir os responsáveis do Ministério da Saúde para comentar a denúncia de desperdício feita pelo CIP, mas não recebeu qualquer resposta.

Thiago Melo da Silva
Thiago Melo Jornalista da DW África em Bona
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