África e Israel: Uma história de altos e baixos
19 de abril de 2018Nos anos 1950, Israel era um jovem Estado emergente, numa altura em que vários países africanos se tornavam independentes do poder colonial. A ministra dos Negócios Estrangeiros da altura, Golda Meir – que viria a ser a primeira mulher a chefiar o Executivo de Israel – levava a cabo uma iniciativa diplomática junto dos novos Estados africanos. Israel identificava-se com os desafios do continente.
"Israel sentia que um dos objectivos políticos era criar novos laços com as nações africanas emergentes. Era um país jovem, numa região hostil, e procurava vizinhos mais ‘amigáveis' no resto do mundo. E África era um deles", lembra Gil Haskel, vice-diretor da MASHAV – a Agência de Israel para Cooperação Internacional e Desenvolvimento.
Em 1957, Israel reconheceu a independência do Gana. No ano seguinte, era criada a MASHAV, para apoiar os Estados emergentes em África – com o envio de trabalhadores humanitários e conselheiros militares para partilhar experiências. Em 1963, Israel estabelecia a sua primeira embaixada em Nairóbi, no Quénia.
O fim da lua-de-mel
Em 1967, a ocupação da Cisjordânia, da faixa de Gaza e dos montes Golã, depois da Guerra dos Seis Dias, redefiniu as relações israelo-africanas, com Israel a ser visto como um Estado colonizador. Após a guerra israelo-árabe, em 1973, muitos países da África subsaariana cortaram os laços diplomáticos.
Desde então, a União Africana concedeu à Palestina o estatuto de observador nas cimeiras do bloco, mas não estendeu o convite a Israel. "Assumir que as boas relações bilaterais se vão traduzir no apoio às políticas israelitas é ignorar os mais de 50 anos da [auto-determinação para] a independência africana", sublinha Naomi Chazan, especialista em relações israelo-africanas em Jerusalém. "Uma coisa quase unânime no continente é o direito à auto-determinação. Por isso, os países africanos têm sido consistentes no apoio à criação do Estado palestiniano e não há sinais de que isso vá mudar", conclui.
Nos anos 1970, apesar dos cortes diplomáticos com Israel, os programas de desenvolvimento continuaram – ainda que em menor escala. A cooperação dos serviços de inteligência prosseguiu com alguns dos regimes autocráticos africanos. Israel também reforçou os laços com o regime do apartheid na África do Sul, algo que ainda mina as relações entre os dois países.
De olhos postos em África
Nas últimas décadas, as relações israelo-africanas passaram por altos e baixos, bem como períodos de desinteresse diplomático. Mas, nos últimos anos, Israel renovou o seu interesse no continente: em 2009, o então ministro dos Negócios Estrangeiros Avigdor Lieberman visitou a Etiópia, o Gana, o Quénia, a Nígéria e o Uganda. O atual primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, também visitou vários países africanos.
"Israel está a voltar a África e África está a voltar a Israel", disse Netanyahu em 2016, classificando a sua nova iniciativa diplomática com as nações africanas como uma das suas prioridades.
O responsável pelo departamento africano no Ministério dos Negócios Estrangeiros israelita, Yoram Elron, aponta várias razões por trás destes esforços diplomáticos: "O motivo pelo qual África está a ganhar tanta relevância na nossa política externa é a sua crescente importância económica e política. A outra componente é a instabilidade nos países do norte de África e as suas ramificações no continente, direta ou indiretamente."
As lutas contra a influência do Irão e do extremismo islâmico estão na linha da frente dos esforços diplomáticos. Israel tem interesses geo-estratégicos claros no Corno de África e na África Oriental, com a entrada do Mar Vermelho, lembra Naomi Chazan. O país tem também interesses económicos nos mercados emergentes e nas matérias-primas africanas.
Em busca de apoio
Um dos objectivos principais, no entanto, continua a ser aumentar a influência nas organizações internacionais, com a ONU, através do apoio africano. "Conseguir apoio nos fóruns internacionais está no topo da agenda há vários anos. Não podemos esquecer que são 54 países africanos – são muitos votos", explica a especialista.
A nível diplomático, apesar dos laços com 42 países africanos, Israel tem apenas 10 embaixadas no continente. Este ano, espera-se a abertura de uma embaixada israelita no Ruanda. Uma estratégia para ganhar apoio político a longo prazo, diz Yoram Elron.
"Gostávamos de ver mais países a demarcarem-se das posições da União Africana, votando contra resoluções anti-israelitas nos fóruns internacionais. O trabalho está em curso, isto não é algo que acontece da noite para o dia, mas num futuro mais distante."
Uma nova sombra nas relações
Há décadas que a MASHAV leva a cabo programas de desenvolvimento em África. Também ofereceu formação em Israel a especialistas de países africanos interessados nos conhecimentos israelitas em agricultura, sistemas de distribuição de água e rega e energia solar.
O sector militar é também importante, dada a grande procura de equipamento e tecnologias israelitas. Em 2016, as exportações militares de Israel para África ultrapassaram os 220 milhões de euros, segundo o ministério da Defesa israelita.
Recentemente, no entanto, a política de Israel para os requerentes de asilo tem ensombrado as relações com África. Oficialmente, Israel refere-se aos cerca de 38 mil refugiados que chegaram ao país entre 2006 e 2012 vindos do Sudão e da Eritreia como "infiltrados" ou "migrantes económicos ilegais".
E apesar de o Governo israelita continuar sob pressão interna para decidir o futuro destes requerentes de asilo, recentemente cancelou um acordo de transferência de migrantes africanos estabelecido com as Nações Unidas.