Imprensa se divide sobre reproduzir capa do "Charlie Hebdo"
O aviso "Plus de Charlie Hebdo" ("Charlie Hebdo esgotado") foi pendurado em muitas bancas de jornal na França na manhã de quarta-feira. A nova edição do semanário satírico se esgotou rápido na maioria das bancas do país. Três milhões de cópias foram impressas – 50 vezes mais do que antes do ataque.
A empresa francesa MLP, responsável pela distribuição do semanário, disse à DW que a publicação está agora disponível em seis países adicionais aos que já recebiam o jornal antes dos ataques. Entre outros, Estados Unidos, Reino Unido e Noruega receberam exemplares. Ao todo, 26 países constam na lista da MLP, a maioria deles na Europa. E a lista deve aumentar: a distribuidora recebeu pedidos do Líbano, Camarões, Cingapura, Chile, República Dominicana e outros cinco países.
Mas os leitores que não conseguiram comprar uma cópia original puderam de qualquer forma ver – ou foram confrontados com – os desenhos produzidos pela equipe sobrevivente do semanário. A capa do Charlie Hebdo foi amplamente reproduzida pela mídia ocidental, mas também fortemente criticada como blasfêmia por muitos muçulmanos em todo o mundo.
Europa
A maioria dos meios de comunicação franceses decidiu reproduzir a capa, que traz uma charge do profeta Maomé chorando, sob o slogan "tudo está perdoado". Entre eles, estavam os jornais de grande circulação Le Monde, Libération e Le Figaro.
Muitas publicações europeias conhecidas decidiram seguir o exemplo. Na Alemanha, Der Spiegel e Frankfurter Allgemeine Zeitung, que estão entre os veículos mais importantes do país, usaram a charge em seus sites. O Süddeutsche Zeitung dedicou duas páginas para as caricaturas; O Frankfurter Rundschau foi um dos jornais que imprimiram a capa do Charlie Hebdo em sua primeira página. O esquerdista Die Tageszeitung dedicou toda a sua capa ao Charlie Hebdo. A DW também mostrou imagens da capa da revista.
No Reino Unido, The Times of London e The Guardian também reproduziram a capa. O site do The Guardian incluiu o aviso: "este artigo contém a imagem da capa do jornal, que alguns podem achar ofensiva". The Independent também mostrou a charge em sua versão impressa, enquanto o The Daily Telegraph não. A BBC mostrou a capa em seus telejornais.
Na Espanha, os principais jornais diários publicaram a imagem em suas páginas online e a emissora estatal mostrou-a em seus noticiários. Na Dinamarca, o jornal Jyllands-Posten que provocou polêmica ao imprimir caricaturas de Maomé em 2006, não reproduziu a capa.
Mundo muçulmano
O jornal turco pró-secular Cumhuriyet publicou na quarta-feira quatro páginas com trechos do Charlie Hebdo, mas sem incluir a capa controversa mostrando a caricatura do profeta Maomé. O jornal afirmou que a polícia havia permitido distribuição só após verificar que não havia imagens de Maomé impressas. Depois de um pequeno grupo de estudantes pró-islâmicos fazer um protesto do lado de fora da redação jornal em Ancara, guardas protegem o prédio.
Dar al-Ifta, no Cairo, um dos centros mais importantes em questões de direito religioso islâmico, chamou de capa de uma "provocação injustificada" para milhões de muçulmanos e alertou que a charge provavelmente vai desencadear uma nova onda de ódio.
As grandes emissoras internacionais árabes Al-Arabiya e Al-Jazeera decidiram não mostrar a capa. O Irã, que condenou veementemente o ataque da semana passada contra o Charlie Hebdo, chamou a nova capa da revista de um insulto ao Islã. A porta-voz do Ministério do Exterior iraniano, Marzieh Afkham, disse que a publicação "provoca os sentimentos dos muçulmanos de todo o mundo".
Américas
Nos Estados Unidos, muitos meios de comunicação foram relutantes em mostrar a imagem. The New York Times, o segundo jornal mais lido dos EUA, informou na capa sob o título "Capa desafiadora com Maomé do Charlie Hebdo acende debate sobre liberdade de expressão". O jornal preferiu fazer um link para a cobertura no site do francês Libération, em vez reproduzir a capa ele mesmo. A agência de notícias Associated Press tem uma política de evitar imagens ofensivas a religiões e, por isso, não mostrou o desenho. As redes ABC e CNN não mostraram a capa.
As imagens, entretanto, foram exibidas em programas da CBS, assim como nas edições online do The Wall Street Journal e USA Today, respectivamente, os números um e três nos EUA, em termos de circulação. The Washington Post, assim como tabloides como o New York Daily News ou o The New York Post, estavam entre os que mostraram a charge.
A capa foi amplamente divulgada na América Latina. O museu sobre jornalismo Newseum, baseado em Washington, afirmou que 12 dos 58 jornais brasileiros, a maioria deles jornais Metro, publicaram a capa. A imagem do profeta apareceu nas edições online de jornais de destaque em todas as Américas, entre eles, o jornal de maior circulação na Argentina, Clarín, a Agência Brasil, o jornal peruano líder Peru 21, além de La Nacion, na Costa Rica, e El Universal, do México.
África
Na África, muitos jornais não destacaram a mais recente edição do Charlie Hebdo como um de seus assuntos mais importantes em suas primeiras páginas. Muitos meios de comunicação do continente reproduziram na quarta-feira em seus sites matérias de agências de notícias sobre o jornal. A maioria deles decidiu não mostrar a capa. No Quênia, o jornal Daily Nation mostrou uma foto de pessoas em pé na fila para comprar a última edição em Paris. O Conselho de Imãs e Pregadores do Quênia condenou as caricaturas de Maomé como blasfêmia.
Ásia
Na Índia, o canal de televisão de notícias hindi Aaj Tak publicou as caricaturas de Maomé do Charlie Hebdo em seu site. O Diário do Povo Chinês, o jornal oficial do governo, apresentou a capa do jornal em seu site. Sediado em Tóquio, o Yomiuri, um dos jornais com maior tiragem do mundo, fez como muitos outros meios de comunicação: mostrou o alto da capa do Charlie Hebdo, sem mostrar a imagem do profeta Maomé.
Austrália
The Australian, mais vendido jornal de circulação nacional do país, publicou em sua capa uma foto do líder da comunidade islâmica Keysar Trad segurando a última edição do Charlie Hebdo. "Embora as caricaturas possam ser ofensivas para alguns muçulmanos, a revista tem feito a mesma coisa com os líderes religiosos e vem fazendo isso há anos", disse Trad, de acordo com The Australian.