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Beethovenfest Bonn

9 de setembro de 2010

Para Ilona Schmiel, projeto social desenvolvido no bairro paulistano se encaixa no lema "Into the Open: utopia e liberdade na música", que orienta a edição 2010 do festival realizado na cidade de Bonn.

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Schmiel destaca repercussão na imprensa brasileiraFoto: Barbara Frommann

A cada ano, a cidade natal de Beethoven abriga um festival de um mês de duração, a fim de celebrar a obra do compositor e a sua contínua influência na música.

Em 2010, o Beethovenfest começa no dia 10 de setembro em Bonn. Nessa edição, o evento tem como lema "Into the Open: Utopia e liberdade na música" e promete inovar nos formatos dos concertos.

Entre as atrações do festival, está uma apresentação da Sinfônica Heliópolis, um projeto social brasileiro integrado por adolescentes e jovens da maior favela de São Paulo.

A diretora do Beethovenfest, Ilona Schmiel, conversou com a Deutsche Welle a respeito dos eventos deste ano e das suas dimensões internacionais.

Deutsche Welle: O que significa o lema: "Into the Open: Utopia e liberdade na música"?

Ilona Schmiel: Por um lado, o lema "Into the Open" (em alemão, Ins Offene) tem de fato uma origem histórico-cultural. Ele se refere a um poema de Hölderlin, escrito por volta do ano de 1800, chamado Der Gang ins Offene, der Gang aufs Land (Passeio ao campo, numa tradução em português). Partindo dessa época, iremos nos livrar de barreiras neste festival e procurar explorar esse potencial utópico da música. Isso será feito através de performances de obras compostas na época em que Beethoven viveu, uma época de transição da sociedade aristocrática para a sociedade burguesa.

Beethovenfest 2009
Série de concertos dura um mês e homenageia obra de BeethovenFoto: Barbara Frommann

Por outro lado, olhamos bem mais à frente e nos questionamos como seria uma música do século 21 e como poderíamos integrar os trabalhos de compositores contemporâneos ao nosso programa.

Utopia e liberdade na música significa também que observamos modelos sociais e examinamos utopias sociais, como no caso de dois exemplos da América do Sul.

Um terceiro aspecto é que, na nossa programação paralela de filmes, apresentamos por exemplo a West Eastern Divan Orchestra, vinda de Teerã, ou ainda a Sinfônica de Kinshasa. Ou seja, nos ocupamos muitos com países com os quais, a princípio, não se supõe haver qualquer ligação com a música clássica.

O que vocês fazem para conquistar um novo público?

Beethovenfest 2009
Exibição gratuita de concertos é um dos atrativos do Beethovenfest deste anoFoto: Barbara Frommann

É natural que um festival dessa proporção, com 150 eventos em quatro semanas, se preocupe em como se dirigir a um novo público. Por exemplo, milhares de pessoas poderão assistir aos concertos em um telão, através da exibição gratuita por três noites seguidas. Esse é um dos meios de difusão do festival.

Um outro é encontrar artistas que reflitam novas maneiras de se relacionar com o público. Entre eles, eu incluo o multipercussionista Martin Grubinger que, junto com seis outros colegas, transformará a Beethovenhalle em uma nova experiência acústica. Os músicos irão tocar em seis palcos ao mesmo tempo e produzir um efeito semelhante ao sistema surround sound.

Temos também artistas como o violinista britânico Daniel Hope, que colocaremos para tocar com uma banda de rock alemã em uma estação de trem de Bonn. O resultado será uma banda barroca disputando com uma de rock para ver qual dos dois estilos mexe mais com o público.

Esse projeto é dirigido por estudantes. Ao meu lado trabalha uma codiretora de 16 anos. Especialmente com esse público-alvo jovem nós tivemos muitas discussões sobre o que eles esperam de um festival.

Qual é a ligação entre os festivais dedicados a Beethoven? Há alguma espécie de colaboração entre eles ou o clima é mais competitivo?

É mais uma cooperação do que uma disputa. Mantemos contato intenso, por exemplo, com o festival Beethovenfest de Caracas. Em 2004, estive na Venezuela e pude desenvolver nossas relações com José Antonio Abreu, fundador do projeto El Sistema para crianças e jovens carentes do país. Nesse ano, ele foi escolhido como patrono do nosso Beethovenfest. Não consigo imaginar nenhuma outra pessoa que se encaixe tão bem nesse aspecto da "utopia na música" quanto ele.

O que o destaca tanto?

Venezuela Musik Jose Antonio Abreu
Jose Antonio Abreu, fundador do projeto social 'El Sistema' e patrono do Beethovenfest 2010Foto: AP

Há 36 anos, ele desenvolveu um cenário utópico e fez seu sonho virar realidade: ele ofereceu às crianças de regiões pobres, através da música clássica, uma alternativa à vida nas ruas. Desde então, o seu projeto de ensino El Sistema Nacional de las Orquestras é um elemento sólido do sistema de assistência social venezuelano e atinge cerca de 350 mil crianças em todo país.

Nesse ano, 180 desses jovens talentos se apresentam na Beethovenfest com a Teresa Carreño Youth Orchestra of Venezuela, composta por músicos de 12 a 21 anos.

É de grande interesse nosso que os espectadores e ouvintes do festival sejam apresentados a um projeto musical dessa natureza. O El Sistema pode ser considerado como um verdadeiro modelo para nós em termos de educação, cultura e ação social. É um erro enorme que cometemos, principalmente aqui na Alemanha, quando tratamos esses três elementos separadamente.

Ghetto Musik - BdT
O contrabaixista Adriano Costa Chaves no topo da favela de Heliópolis, em São PauloFoto: AP

Os palcos de Bonn contarão com algum outro projeto musical sul-americano desse tipo?

Sim, o nosso Orchestercampus [série de workshops organizada pela Deutsche Welle] irá apresentar um projeto do Brasil, a Sinfônica Heliópolis, nomeada em referência à maior favela de São Paulo. Lá moram 150 mil pessoas, ou seja, praticamente metade da cidade de Bonn em apenas um bairro. E é justamente lá que uma escola de música foi fundada, já há algumas décadas, pelo maestro Silvio Baccarelli, também um visionário como Abreu.

Estamos trazendo esse projeto pela primeira vez para a Europa. Trata-se de uma verdadeira premiére, que podemos celebrar junto com a Deutsche Welle e que teve uma repercussão inacreditável na mídia brasileira. Esses 80 jovens músicos, cujas idades variam entre 15 e 24 anos, estão saindo pela primeira vez do seu país e provavelmente vão se admirar com o idílio onde Beethoven nasceu.

A Beethovenfest Bonn já promoveu o intercâmbio cultural em diversos países. Estão previstas mais cooperações internacionais?

Beethoven desempenha um papel muito importante em todo o mundo. No Brasil, já está claro que haverá mais concertos. Eu acredito que o governo alemão faria bem em apostar num tema como a música. Beethoven não é tido de forma alguma como ultrapassado. Pelo contrário, seu nome gera um grande entusiasmo e tem uma força excepcional. Esse aspecto poderia ser utilizado pela política.

Nós obtivemos muito mais repercussão na mídia de São Paulo do que nossos ministros da Economia ou do Exterior e é claro que isso não foi por acaso. Eu acredito que é possível alcançar bem mais para a união dos povos por meio de abordagens positivas e ideias inovadoras.

Entrevista: Rick Fulker (mdm)
Revisão: Alexandre Schossler