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Coronavírus pode arrastar consigo economias emergentes

Nicolas Martin ca
2 de abril de 2020

Pandemia ainda está no começo nos países em desenvolvimento e emergentes, mas sinais de que eles serão fortemente afetados já são visíveis. Por ora, países ricos estão focados na própria situação, mas isso pode mudar.

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Porto de Santos
Porto de Santos: Brasil sofre com queda do preço de commodities em meio à pandemia de coronavírusFoto: Getty Images/AFP/N. Almeida

Manter distância: na Alemanha, na França ou nos EUA, isso é incomum, mas possível. Nas apertadas favelas de Nova Délhi, do Rio de Janeiro ou da Cidade do Cabo, isso é quase impossível por simples razões de espaço.

O número de casos confirmados de covid-19 ainda é relativamente baixo na maioria dos países em desenvolvimento e emergentes. No entanto, já está claro que o novo coronavírus chegou a todo o planeta. Contramedidas estão sendo tomadas em muitos lugares: a Índia colocou seus 1,3 bilhão de habitantes em quarentena por três semanas. Na África do Sul, o Exército controla os toques de recolher.

Outros países, porém, reagiram bem mais devagar: as feiras de rua em Mianmar continuam superlotadas, o presidente da Tanzânia manteve os templos religiosos abertos, e o presidente Jair Bolsonaro chamou a covid-19 de "gripezinha".

Independentemente de como a epidemia de covid-19 vá evoluir, do ponto de vista econômico muitos países já estão sendo afetados. A crise do coronavírus atinge os países emergentes com toda força, escreve o departamento de análises do banco alemão Deka Bank. O economista Rolf Langhammer, do instituto econômico IfW, também se diz preocupado. Para ele, os países ricos estão focados na sua própria situação, mas isso poderá mudar em breve.

"Com a crise do coronavírus, a migração motivada pela miséria pode aumentar significativamente em todo o mundo", disse o especialista para países em desenvolvimento e emergentes.

Há três fatores a serem considerados na hora de avaliar como a epidemia pode afetar economicamente os países emergentes.

O primeiro: muitos investidores logo retiraram suas aplicações em moedas de países emergentes e em desenvolvimento, fugindo para o dólar. "O capital desapareceu desses países em questão de dias, e o dólar é a moeda de fuga", comenta Langhammer. Só em março, os investidores retiraram 83,3 bilhões de dólares, segundo o IIF, uma associação mundial de bancos. A consequência: as moedas de outros países perdem valor em relação ao dólar. Dívidas contraídas na moeda americana aumentam.

Em segundo lugar, muitos países estão contando, em seus orçamentos, com preços elevados de commodities, como petróleo. Mas, com a crise, esses preços estão em queda. "Países como Nigéria, Brasil e África do Sul esperam um aumento rápido a fim de obter novas divisas externas."

Em terceiro lugar, quase todos os países também estão sendo afetados pela baixa demanda da China, que, para muitos deles, é o principal comprador de suas matérias-primas. "Temos esses três fatores negativos acontecendo ao mesmo tempo", analisa Langhammer.

Além disso, países onde o turismo é importante ‒ como a Tailândia ‒ foram duramente atingidos pela crise. Esses países podem levar ainda mais tempo para conseguirem alguma receita do que nações integradas à cadeia global de produção.

Para 2020, o Deka Bank também já está revisando sua previsão de crescimento econômico para a Ásia de 5,3% para 2,8% e para a América Latina de 1% para -1,7%. Desde a eclosão da pandemia do coronavírus, muitas moedas nacionais perderam significativamente valor. O peso mexicano e o rublo russo se desvalorizaram em até 20% em relação ao dólar nas últimas quatro semanas, o rand sul-africano e o real cerca de 11% cada.

Pacotes de resgate

Enquanto a Europa e os Estados Unidos preparam pacotes gigantescos de ajuda financeira, não se sabe como os países em desenvolvimento e emergentes vão tentar compensar as perdas causadas pelo coronavírus e garantir a paz social. O plano de resgate financeiro de cerca de 41,5 bilhões de dólares da Índia parece insignificante diante do programa de 2 trilhões de dólares dos EUA.

"Muitos países emergentes descobrirão que contraíram dívidas muito altas", comenta o economista Kenneth Rogoff, professor de Harvard e ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), em entrevista à revista alemã Cicero. Com isso, será difícil mobilizar fundos para pacotes de ajuda.

Já os países emergentes que ainda obtêm empréstimos no mercado internacional de capitais podem exagerar na dose e caminhar para uma crise financeira. "Isso não pode ser descartado se a demanda da China não voltar a subir rapidamente, se os preços das matérias-primas não subirem e se o dólar continuar sendo a moeda de fuga", diz Langhammer.

O ministro alemão da Cooperação e Desenvolvimento, Gerd Müller, exigiu um corte da dívida para os países mais pobres devido à crise do coronavírus. Embora isso possa ser um alívio, não muda nada no acesso dos países mais pobres a recursos financeiros, já que eles não dependem de avaliações de agências de rating, mas dos cofres de organizações de ajuda.

Por isso, um corte da dívida faria sentido especialmente para os países emergentes, argumenta Langhammer. Mas os bancos que atuam internacionalmente teriam que estar dispostos a isso. "Isso não aconteceu com muita frequência na história. Além disso, os bancos também vão apontar para sua difícil situação devido à crise do coronavírus em seus países de origem e exigirão ajuda dos governos.”

No final, principalmente os fundos de organizações internacionais poderão oferecer recursos. A diretora-gerente do FMI, Kristalina Georgiewa, num cálculo cauteloso, falou que apenas os mercados emergentes estariam precisando de 2,5 trilhões de dólares. O FMI está trabalhando numa resposta rápida, comunicou a organização com sede em Washington.

As novas instituições financeiras financiadas principalmente pela China também poderiam estar a postos. Isso inclui o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura e o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) dos países do Brics. "Tenho minhas dúvidas se eles ainda dispõem de tanto dinheiro", diz Langhammer. "Se os chineses puderem fornecer essa ajuda, será em interesse próprio."

Portanto, para os países em desenvolvimento e emergentes, resta esperar que as medidas para conter a pandemia de covid-19 sejam suficientes ‒ porque o dano econômico já é enorme. Mas, dada a rápida disseminação do vírus, a situação atual se parece mais com uma tragédia humana.

A ONG de ajuda ao desenvolvimento Ação Agrária Alemã também alertou para o enorme impacto nas regiões mais pobres do mundo: "É de se esperar que lá tenhamos que contar muitas mortes nas próximas semanas e meses", afirmou a organização.

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