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HistóriaAlemanha

Como tratar o legado de sobreviventes do Holocausto?

Julia Hitz
7 de julho de 2022

Testemunhas dos horrores do nazismo desempenham um papel importante até hoje. Exposição em Berlim discute como lidar de forma responsável com os preciosos relatos, também após sua morte.

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Prisioneiros do campo de Auschwitz em 1945
Sobreviventes no campo de concentração de Auschwitz, pouco após sua libertação em janeiro de 1945Foto: picture-alliance / akg-images

Eles experimentaram sofrimento e crueldade imensuráveis −​ e ainda assim sobreviveram ao Holocausto. E, como testemunhas desse triste capítulo da história, têm desempenhado um papel importante na Alemanha desde o fim da Segunda Guerra Mundial.

Agora, os últimos sobreviventes estão morrendo de causas naturais, e a responsabilidade por seu legado está gradualmente passando para as mãos de várias instituições. Este não é um processo fácil: as testemunhas do Holocausto oferecem apenas uma das muitas perspectivas da história, mas podem servir como um importante lembrete.

"Nunca mais!", este juramento está esculpido em pedra em diferentes idiomas no memorial do antigo campo de concentração de Dachau. É um princípio orientador central da política interna e externa alemã, que estabelece como metas combater o antissemitismo, defender o direito de existência do Estado de Israel e lembrar os atos cruéis dos nazistas e dos muitos que os apoiam.

A exposição O Fim das Testemunhas, aberta nesta quinta-feira (07/07) na Nova Sinagoga de Berlim é dedicada à questão de como museus, memoriais e outras instituições podem lidar de forma responsável com os testemunhos literários e entrevistas em vídeo dos sobreviventes.

É o resultado de uma cooperação entre o Museu Judaico Hohenems, o memorial do campo de concentração de Flossenbürg e a Fundação Nova Sinagoga de Berlim. A exposição também coloca as testemunhas oculares em um contexto histórico: na Alemanha, os sobreviventes só começaram a se manifestar na década de 1980.

Importantes testemunhas nos julgamentos de Nurembergue

As testemunhas do Holocausto nem sempre estiveram tão presentes em público como nos últimos anos: a então jovem Anita Lasker-Wallfisch, por exemplo, foi uma das poucas sobreviventes a dar uma entrevista à BBC em 1945. A Comissão Central dos Judeus na Polônia, fundada em Lodz em 1944, fez um trabalho básico muito importante por volta do fim da guerra: entre 1944 e 1947, realizou centenas de entrevistas com sobreviventes e também criou instruções e questionários para lidar com os interlocutores traumatizados.

O horror dos campos de concentração no leste da Europa foi documentado principalmente pelo Exército Vermelho, as forças armadas da antiga União Soviética, que, entre outras coisas, libertaram o campo de extermínio de Auschwitz-Birkenau.

Alguns fotojornalistas ocidentais também contribuíram com importantes documentos fotográficos. Muito conhecidas são as fotos tiradas por Eric Schwab e Meyer Levin para a agência de notícias francesa Agence France Presse após a libertação do campo de concentração de Buchenwald.

Centenas de cadáveres em vala em Bergen-Belsen em abril de 1945
Vala com cadáveres no campo de Bergen-Balsen em foto de abril de 1945 Foto: akg-images/picture-alliance

Mas as testemunhas e seus relatos fizeram parte principalmente da coleta de evidências legais até a década de 1960: seja nos julgamentos de Nurembergue, de 1945 a 1949, no julgamento de Majdanek, de 1944 a 1981, nos julgamentos em Jerusalém em 1961 ou nos julgamentos de Auschwitz em Frankfurt, de 1963 a 1968.

Testemunhas como autoridades morais

Enquanto na década de 1970 havia um grande foco nos perpetradores, foi a série de TV americana Holocausto: a história da família Weiss, de 1979, que abriu um amplo debate na sociedade como um todo na Alemanha.

A partir de então, as testemunhas contemporâneas passaram a ser mais ouvidas em público, mas também na historiografia. Tratava-se também de neutralizar uma falsa historicização do Holocausto por círculos de direita. Ao mesmo tempo, sobreviventes como Margot Friedländer, Anita Lasker-Wallfisch e Esther Bejerano se manifestaram – e se tornaram autoridades morais.

Nova responsabilidade das instituições

Historiadores estão cientes dos grandes desafios envolvidos ao lidar com sobreviventes: seus relatos contêm informações valiosas, classificações importantes, mas também alguns obstáculos. O conhecimento factual às vezes não condiz com as memórias das testemunhas da época.

Para combater interpretações errôneas, é necessário um conhecimento amplo. Esta é uma das razões pelas quais a exposição se dedica à questão do papel que a opinião pública ou as instituições atribuem aos sobreviventes. Ela olha para as intenções das testemunhas e, ao mesmo tempo, questiona como foram feitas as entrevistas, o papel dos entrevistadores e as expectativas sociais.

Para a exposição também foram feitas novas entrevistas com sobreviventes do Holocausto: além das faixas de áudio selecionadas, também é possível ouvir as conversas na íntegra e no áudio original, sem cortes. Dessa forma, a exposição tenta criar a consciência de que os excertos não podem representar o todo – e dependem fortemente da respectiva intenção de uso.

E o que acontecerá depois?

A exposição também não pode dar essa resposta. Mas deixa claro o quanto a memória e seu respectivo contexto social estão conectados. A lembrança de hoje do Holocausto é alimentada por perspectivas muito diferentes, algumas das quais a exposição também mostra. Entre outras coisas, ela permite que jovens de hoje se manifestem em entrevistas.

Artur Bakaev, de 31 anos, natural do Tajiquistão e morador de Berlim, por exemplo, critica o fato de que os judeus ainda sejam retratados como vítimas. Para Bakaev, a memória é instrumentalizada: "Ela deve servir a um propósito, de alguma forma aliviar a Alemanha ou o que quer que seja, e as pessoas não olham ou ouvem realmente de que tipo de pessoa se trata."

Assim, a exposição também aponta para um futuro incerto: embora as novas gerações ouçam as vozes dos falecidos, elas ainda terão que encontrar suas próprias respostas.