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Dívidas ocultas: CIP pede responsabilização criminal

29 de janeiro de 2018

A Procuradoria-Geral da República de Moçambique anunciou que vai pedir a responsabilização financeira dos gestores envolvidos no caso das dívidas ocultas. Para Baltazer Fael, do CIP, falta a responsabilização criminal.

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Mosambik - Metical
Foto: DW/M. Sampaio

Em comunicado, a Procuradoria-Geral da República (PGR) afirma que "o Ministério Público submeteu ao Tribunal Administrativo, a 26 de janeiro, uma denúncia com vista à responsabilização financeira dos gestores públicos e das empresas participadas pelo Estado, intervenientes na celebração e na gestão dos contratos de financiamento, fornecimento e de prestação de serviços". No entanto, a PGR não menciona os governantes que autorizaram as transações e muito menos refere a responsabilização criminal dos envolvidos, no caso da dívida oculta avaliada em 1,8 milhões de euros contraída entre 2013 e 2014, tarefa de sua alçada.

Baltazar Fael, investigador do Centro de Integridade Pública (CIP) de Moçambique, espera que o caso não pare por aqui. Em entrevista à DW África, critica a PGR por ter proposto no seu comunicado ter uma palavra a dizer quanto à emissão de garantias do Estado para evitar novos escândalos com a dívida pública.

DW África: A PGR fala apenas na responsabilização dos gestores das empresas, não menciona os governantes que autorizaram as famosas dívidas e muito menos menciona a responsabilização criminal. Não era de se esperar mais da PGR, num caso desta natureza?

Dívidas ocultas: CIP pede responsabilização criminal

Baltazar Fael (BF): Eu penso que as coisas vão continuar a girar à volta da questão do segredo de justiça. O processo criminal está em segredo de justiça. Para a questão administrativa, neste caso, da responsabilização, não me parece que a questão do segredo de justiça se imponha. A PGR, na minha óptica, fez aquilo que é o seu trabalho: descobrir infracções de natureza financeira. Como não tem competência para tratar essas matérias, submeteu-as ao órgão competente. A situação agora passa para o Tribunal Administrativo, que pode dar informações sobre quem são essas pessoas que, segundo a PGR, há indícios de que terão cometido crimes de responsabilidade financeira. Houve uma troca de expediente entre duas instituições.

DW África: A PGR também quer ter uma palavra a dizer sobre a emissão das garantias do Estado. Este desejo seria ajustado às suas competências?

BF: As questões que vêm no comunicado – sobre as dívidas, que isto foi feito pela Assembleia da República ou por aquele outro órgão – penso que não cabem na esfera da PGR. A Procuradoria colocou-as lá apenas para encher o comunicado. Essas recomendações foram produzidas pela Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembleia da República, pela consultora Kroll, e devem ser submetidas aos órgãos competentes: a Assembleia, para rever a legislação, e outras entidades. Isso não cabe à PGR, porque a PGR não faz leis. Não deve intrometer-se nesta matéria, deve limitar-se à sua função, que é o exercício da acção penal. Explicar o que é que está a acontecer, em matéria criminal, com estas pessoas envolvidas no processo das dívidas ocultas.

DW África: A PGR defende o apuramento de algumas leis. Não se trata de um falso problema? Mesmo as leis vigentes são constantemente violadas…

BF: Penso que este é um problema que foi levantado exactamente por causa da questão das dívidas, em que procuramos saber onde existem lacunas, ao nível da legislação, para permitir que servidores públicos façam aquilo que fizeram. De facto, existe matéria suficiente para tratar desse assunto. A nossa legislação é clara sobre como se deve proceder. Não é um problema de falta de legislação. Há um claro desrespeito dessa legislação. Temos que melhorar alguns pontos, isso é normal. Qualquer lei usada durante um certo período de tempo vai perdendo a sua acção concreta para um determinado ato, porque quem pratica esses atos também vai aprimorando a sua forma de atuação. Mas não é claramente um caso de lacunas existentes na legislação. Há um aproveitamento claro da PGR para ter maneira de sustentar o seu comunicado. Isto não é um assunto da PGR.

DW África: O que é que o CIP espera da PGR no que diz respeito às suas competências?

BF: Esperamos que a PGR não pare por aqui. Num dos primeiros comunicados da PGR, o procurador disse claramente que há indícios de infrações de natureza financeira, mas que também levantou situações criminais. Esperamos que a PGR não esteja a tentar fazer-nos dormir e continue com as ações com vista à responsabilização criminal dos envolvidos neste processo. Estamos a acompanhar e não nos vamos cansar de consciencializar a sociedade sobre a necessidade de esclarecer este caso. Que este caso não pare na responsabilidade financeira e que se procure apurar a responsabilidade criminal.

DW África: Acha que a PGR quer atirar areia para os olhos da sociedade moçambicana?

BF: Já nos foi habituando a isso. Há uns tempos, veio com um comunicado sobre a detenção dos envolvidos no caso da Embraer, um pouco para sacudir a poeira e reposicionar-se. Estes casos de corrupção com contornos internacionais têm de ser resolvidos, mas a sociedade quer saber, porque isto afecta directamente a vida da população. O custo de vida sobe, porque o país deixa de receber o apoio internacional em termos de fundos. Os doadores acham que este assunto tem de ser esclarecido. Quando temos dores de barriga por causa da fome, não conseguimos dormir. Portanto, o povo não vai dormir, quer saber quem são os envolvidos. Nós, enquanto sociedade civil, vamos continuar a fazer o nosso trabalho e a PGR, como órgão que exerce acção penal, tem de nos dizer, de facto, o que é que aconteceu neste processo.

Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África
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