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A longa batalha da Tanzânia contra a SIDA e a tuberculose

Da Rocha Alves Sampaio, Maria Madalena23 de novembro de 2013

Todos os anos, a SIDA e a tuberculose matam centenas de milhares de pessoas em África. Mas há sinais positivos. A Tanzânia, no leste do continente, tem tido sucesso na luta contra estas doenças.

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John Andrea Mashimba, de 58 anos, está sentado já há algumas horas num dos vários bancos de madeira em frente ao Hospital Distrital de Temeke. O calor é sufocante. "Estou aqui para tratar a tuberculose. Descobri há seis semanas que tenho a doença", conta.

Um telhado fornece sombra na zona de espera, que é aberta. Sente-se uma ligeira brisa. O ar fresco também é importante para reduzir o risco de infeção para médicos e enfermeiras. A tuberculose propaga-se por via aérea, através da inalação de gotas de saliva contaminadas. Em espaços confinados é grande o risco de infeção.

Temeke é o centro industrial de Dar es Salaam, a capital da Tanzânia. A maioria dos cerca de 800 mil habitantes ganha uma quantia modesta, trabalhando por conta de outrem ou como proprietários de pequenos negócios.

Antes de adoecer, John Andrea Mashimba vendia carvão. No teste que fez, também descobriu que tem HIV. "Senti dores no peito, comecei a sentir-me mais fraco e depois fui ao hospital para saber que problema tinha. E então descobri que tinha tuberculose."

A Tanzânia é um dos vinte países do mundo mais afetados pela tuberculose. Todos os anos são diagnosticados cerca de 60.000 novos casos. Nas últimas três décadas, o número de casos de tuberculose aumentou cinco vezes, em consequência da epidemia de HIV. A tuberculose é a infeção mais comum e a principal causa de morte de pessoas com SIDA.

Diagnóstico e recuperação

Detetada e tratada a tempo, a tuberculose é curável. A Tanzânia tem feito grandes progressos no diagnóstico e no tratamento da doença, confirma Christoph Benn, diretor do Fundo Global de Combate à SIDA, Tuberculose e Malária.

Entretanto, a taxa de sucesso dos tratamentos atingiu os 88%, "ou seja, 88% pessoas que começam o tratamento também o concluem com sucesso e deixa de existir o risco de contágio para outras pessoas", explica Benn, que durante muitos anos dirigiu um hospital na Tanzânia. "Isso também tem sido fundamental na redução da taxa de mortalidade por SIDA", acrescenta.

O tratamento é gratuito. A terapia - uma combinação de antibióticos - dura pelo menos seis meses e custa cerca de cem dólares. A Tanzânia recebe os recursos financeiros necessários para importar os medicamentos do Fundo Global de Combate à SIDA, Tuberculose e Malária. Esta organização é financiada por fundos provenientes de países e doadores privados. Até agora, a Alemanha doou 1,2 mil milhões dólares.

Assistência de antigos pacientes

Loic, de 27 anos, está sentada sob um cobertor num pequeno pátio, rodeada de caixas de comprimidos e folhetos sobre alimentação saudável. A sua camisola amarela destaca-se entre as paredes cinzentas de cimento das favelas de Temeke. Loic é uma assistente voluntária que visita pacientes com tuberculose.

Hoje, já explicou a Elisabeth, uma jovem de 21 anos, como e quando deve tomar os seus comprimidos e como pode evitar que a sua filha de um ano e meio, Neema, seja infetada com tuberculose. "Conheci a Loic no hospital e ela fez-me sentir à vontade para falar sobre a tuberculose. E ela agora visita-me e traz-me os medicamentos a casa."

Loic trabalha para a Mukikute, uma organização fundada por antigos pacientes com tuberculose. O objetivo é educar os portadores da doença e apoiá-los durante o tratamento. Há uns anos, também ela teve tuberculose. Hoje, visita em média três pacientes por dia.

"Não sei quantas vidas já poderei ter ajudado a salvar. No trabalho que faço, sempre que me veem por aí, dizem-me: tenho sintomas de tuberculose, por favor ajude-me. Normalmente, ando pelas comunidades da zona onde vivo, visito consumidores de drogas e alcoólicos e falo-lhes sobre os sintomas da tuberculose."

Quando têm problemas de saúde, muitas pessoas na Tanzânia ainda procuram primeiro um curandeiro. A organização Mukikute já conseguiu convencer muitos dos curandeiros tradicionais em Temeke a cooperar com o hospital local.

O atendimento de pacientes em casa alivia os hospitais. E durante as visitas domiciliares as pessoas infetadas podem ser tratadas clinicamente logo que são detetados os primeiros sintomas. Um conceito que agrada a Christoph Benn, do Fundo Global, uma vez que "o perigo geralmente está nos casos não diagnosticados", explica.

Última esperança

Apesar da elevada taxa de sucesso de 88% no tratamento da tuberculose, também há alguns casos de resistência da doença. Para os pacientes que não reagem aos antibióticos comuns, a última esperança de tratamento é o hospital Kinbong'oto, em Moshi, no norte da Tanzânia. Aqui, no sopé do Monte Kilimanjaro, a 900 metros acima do nível do mar, o clima é temperado.

Quarenta das 320 camas disponíveis estão reservadas para os pacientes resistentes aos medicamentos. Atualmente, estão a ser tratados na estação de isolamento 45 pacientes que já não respondem à terapia padrão. Uma nova ala, financiada pelo Fundo Global, já está em construção.

Mary Benardi, de 20 anos, chegou há dois dias a Moshi, vinda do hospital de de Temeke, a 540 quilómetros de distância. "Ela é resistente aos medicamentos", relata Riziki Kisonga, um dos médicos. "Ela tem tosse há oito meses e perdeu muito peso. Tem constantemente febre e dores no peito", explica.

Mary Benardi terá de ficar mais oito meses no hospital de Kibong'oto, mas espera recuperar e abrir um pequeno negócio quando voltar.

Em Temeke, também John Andrea Mashimba espera poder, em breve, voltar a vender carvão. Mas primeiro tem de contar à família que tem HIV. Não sabe onde nem como foi infetado.

Progressos na luta contra a SIDA

Todos os anos, ainda morrem na Tanzânia 84 mil pessoas devido a doenças relacionadas com o HIV-SIDA. No entanto, o país tem feito enormes progressos na luta contra a pandemia.

Há 20 anos, funerais de doentes com SIDA eram uma ocorrência diária. "Os jovens estavam a morrer. As crianças deixavam de ter quem cuidasse delas. Em todas as aldeias havia órfãos. Podia ver-se como este país estava a sofrer tanto social como economicamente", recorda Christoph Benn do Fundo Global de Combate à SIDA, Tuberculose e Malária.

Nos anos 90 tornou-se possível tratar a SIDA. Antes, ninguém queria fazer o teste do HIV sabendo que o resultado podia ser uma sentença de morte. Entretanto, a taxa de SIDA na Tanzânia diminuiu cerca de 20% para 5,8% em 15 anos.

Já se fala sobre SIDA

Quando o Governo da Tanzânia lançou uma campanha de sensibilização em 2005, convidando as pessoas a fazer o teste do HIV, Japo Hemedi foi ao médico. Há muito que se sentia doente e fraca. O diagnóstico confirmou os seus piores temores: o resultado do teste do HIV foi positivo.

Mas graças ao tratamento gratuito e a cuidados médicos intensivos, ela já aprendeu a viver com a doença. Esta mãe solteira de 50 anos tem cinco filhos e vende sumos e frutas frescas em frente a um hospital no distrito de Temeke, em Dar es Salaam.

A sua família e muitos de seus clientes sabem que ela tem HIV. "Nunca me senti estigmatizada", confessa. "Quando contei à minha família e aos meus vizinhos, eles aceitaram-me. Continuo a fazer tratamento, mas no geral tenho-me sentido bem."

Diariamente, são tratados no hospital em Temeke até 200 pacientes com HIV. As pessoas aprenderam, entretanto, que é possível viver com SIDA e que podem sobreviver, desde que tomem regularmente os medicamentos e consultem imediatamente a um médico em caso de infecção, explica o diretor clínico do hospital, Suleiman Muttani.

"Um paciente já é capaz de vir ter connosco só com uma fratura e dizer: 'Quero que saiba que também sou HIV positivo e estou a tomar estes medicamentos.' Isto nunca aconteceria na década de 90", observa o responsável.

Preservativos recomendados, mas não distribuídos

Todos os meses, a clínica da organização de ajuda cristã Pasada em Dar es Salaam atende cerca de 3.000 pacientes adultos e cerca de 6.000 crianças, incluindo órfãos, todos os meses.

A organização recebe apoio financeiro da Associação Alemã de Assistência aos Hansenianos e Tuberculosos (DAHW, na sigla em alemão) e do Fundo Global de Combate à Sida, Tuberculose e Malária e participa no programa do Governo da Tanzânia para prevenir a transmissão do HIV de mãe para filho. Durante a gravidez, as mulheres com HIV tomam medicamentos para evitar a transmissão da doença no útero.

No entanto, a lealdade da organização à Igreja Católica impõe limites à sua capacidade de evitar a propagação da SIDA, admite o diretor da clínica, Frank Manasse. Por isso, apesar de esclarecerem as pessoas sobre o uso de preservativos e onde podem obtê-los, não os distribuem.

"É um conflito, é verdade, porque algumas pessoas precisam desse serviço", reconhece Frank Manasse. "Há pessoas que se dirigem a nós por causa do planeamento familiar, mas não as mandamos embora. O que lhes dizemos é que oferecemos planeamento familiar natural. Mas para esse determinado tipo de serviço encaminhámo-los para serviços específicos que existem por aqui", afirma.

Como por exemplo, a organização não governamental Population Services International (PSI), com a qual o Governo alemão tem trabalhado em África desde 2005. Só no ano passado, a ONG já distribuiu cerca de 80 milhões de preservativos. A PSI também esclarece sobre o HIV/SIDA através de apresentações de teatro de rua, eventos musicais e sessões de vídeo em bairros de lata e aldeias.

Khadija Azoma esteve recentemente numa dessas apresentações de vídeo ao ar livre, nos arredores de Dar es Salaam, com os seus dois filhos. A mensagem do vídeo é clara, afirma Khadija: "Se tens um relacionamento com alguém, sê fiel. Se tiveres um caso fora do casamento, então usa preservativo". A tanzaniana gostava que o seu marido também visse este tipo de filme para ficar a "saber muito mais sobre estas coisas."