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HistóriaAlemanha

TikTok como ferramenta para não esquecer o Holocausto

Johanna Rüdiger
27 de janeiro de 2023

Com vídeos de poucos segundos, sobreviventes do Holocausto e memoriais de antigos campos de concentração alcançam o público jovem e propagam conhecimento sobre os horrores do nazismo.

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Logotipo da plataforma TikTok em tela de smartphone sendo segurado no Memorial do Holocausto de Berlim, Alemanha
Vídeos no TikTok conscientizam sobre o Holocausto e atraem jovens visitantes a antigos campos de concentração nazistasFoto: Johanna Rüdiger/DW

Uma garota de 15 anos olha expressivamente para a câmera com as bochechas carregadas de maquiagem e ao som de uma música do cantor americano Bruno Mars. No texto que acompanha o vídeo, ela diz que em breve será deportada para um campo de concentração. Em seguida, um jovem de uniforme listrado encena sua suposta chegada ao céu – e conta que foi assassinado em uma câmara de gás em Auschwitz.

Essa moda de encenar histórias de vítimas do Holocausto foi o grande escândalo do TikTok em agosto de 2020. Jovens interpretavam as vítimas, adicionavam uma música de fundo e fingiam ter morrido em um campo de concentração. O memorial de Auschwitz classificou a tendência na rede social de "dolorosa e ofensiva".

Uma das jovens TikTokers tentou se defender em uma entrevista, dizendo que a intenção dela era justamente a oposta: ela pretendia usar seu vídeo para esclarecer e conscientizar outras pessoas sobre o Holocausto. Mas na época, parecia haver um consenso geral entre o público: vídeos curtos e conscientização sobre o Holocausto em uma plataforma famosa por vídeos de dança não faz o menor sentido.

Escultura no memorial de Neuengamme, com grinaldas de flores à sua frente.
O memorial de Neuengamme homenageia mais de 100 mil vítimas de toda a EuropaFoto: Markus Scholz/dpa/picture-alliance

Um memorial no TikTok

Agora avancemos um pouco no tempo: dois anos depois, também em agosto. Era um daqueles raros dias quentes de verão em Hamburgo, algo incomum no norte da Alemanha. Férias de verão e clima de praia perfeito — mas David Gutzeit e sua irmã Jonna não entraram no carro para ir em direção ao mar.

Em vez disso, a adolescente e o jovem de 21 anos dirigiram para o distrito de Neuengamme, onde pedras cuidadosamente empilhadas simbolizam as barracas em que milhares de prisioneiros de campos de concentração eram amontoados.

O memorial de Neuengamme homenageia mais de 100 mil pessoas de toda a Europa presas no campo principal e em mais de 85 campos satélites durante a era nazista. Metade dessas pessoas não sobreviveu ao campo de concentração.

"Os jovens vêm aqui porque nos viram no TikTok", diz Iris Groschek, historiadora responsável pelo perfil do memorial na plataforma social.

Em novembro de 2021, Neuengamme se tornou o primeiro memorial de um campo de concentração a ter sua própria conta no TikTok. Um passo corajoso, mas também importante para alcançar na internet jovens que não se encontram mais em redes como Facebook e companhia, ressalta Groschek.

O sobrevivente do Holocausto Gidon Lev senta-se ao lado de uma mulher em um sofá em seu apartamento em Ramat Gan, Israel.
Gidon Lev, TikToker de 88 anosFoto: Tania Kraemer/DW

Interesse da Geração Z

"Não me contento em apenas ler sobre o tema nos livros escolares. Quero ver e sentir onde essas atrocidades nazistas aconteceram", diz David. Ele olha em volta, visivelmente emocionado.

David e Jonna não foram os únicos jovens a visitar o campo naquele dia. Também foi ao local Nicolas, de 17 anos, de Madri, por exemplo, que em uma viagem turística à Alemanha convenceu seus pais a parar em Neuengamme. As americanas Starlett, do Kansas, e Hannah, do Havaí, também foram conhecer a história do campo de concentração no mesmo dia.

Estudos mostram que a Geração Z, ou seja, os jovens nascidos entre 1995 e 2010, sabe pouco sobre campos de concentração, mas se interessa muito mais pela era nazista do que a geração de seus pais.

"Queremos dar visibilidade ao tema entre o público jovem e atingir os usuários da Geração Z no TikTok, que, de outra forma, dificilmente conseguiríamos alcançar com nosso trabalho educacional", explica Groschek. A conta do memorial agora tem 27 mil seguidores, seus vídeos continuam viralizando e atingem um público de milhões.

Apoio de voluntários na criação de conteúdo

Jovens voluntários de todo atuam como criadores de conteúdo no memorial como parte de seu compromisso com a organização pacifista Aktion Sühnezeichen Friedensdienste (Ação Serviço de Reconciliação para a Paz).

"Temos muito cuidado para que nossos vídeos não sobrecarreguem os usuários emocionalmente. Queremos que a comunidade aprenda algo; que ganhe, por exemplo, uma explicação sobre um fato histórico", diz Groschek. "Nós não fazemos reencenação de histórias de vítimas, ou seja, essa interpretação de cenas, como é comum no TikTok."

Neuengamme já não está mais sozinho no TikTok. Seu trabalho pioneiro inspirou outros memoriais de campos de concentração, como Bergen-Belsen, na Alemanha, e Mauthausen, na Áustria, a seguirem os mesmos passos.

E os números falam por si. Marlene Wöckinger, responsável pela conta do memorial de Mauthausen no TikTok, calcula que cerca de 200 mil pessoas visitam o local todos os anos. "Esse mesmo número eu alcanço no TikTok com um vídeo se ele se tornar viral."

Segundo Wöckinger, como o memorial também investe off-line em uma educação voltada para o diálogo, fazer o mesmo na plataforma de mídia social não foi tão difícil. "Não pregamos, e sim fazemos trocas — isso pode ser facilmente transportado para o TikTok. Queremos construir uma comunidade."

Testemunhas do Holocausto no TikTok

Há sobreviventes do Holocausto que chegaram à plataforma ainda antes: Lily Ebert, por exemplo, que, junto com o bisneto, já alcançou 1,9 milhão de seguidores — a idosa de 99 anos faz até as dancinhas da moda, mas sempre acompanhadas de informações sobre sua história de sobrevivência.

Gidon Lev, que sobreviveu ao campo de concentração de Theresienstadt, é outro exemplo. Para o Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto de 2023, comemorado nesta sexta-feira (27/01), o TikToker de 88 anos produziu um vídeo em cooperação com Neuengamme. O material faz parte de uma série de vídeos com vários memoriais do Holocausto que ele publica em seu canal no TikTok.

Mas por que usar o TikTok para esse trabalho de conscientização? "Para minha grande consternação, o ódio, a violência, o antissemitismo e outros males aumentaram novamente nos últimos anos", diz Lev.

Como sobrevivente, ele assumiu a missão de lutar contra isso e conscientizar as gerações mais jovens sobre esse "fenômeno horrendo e destrutivo" de todas as maneiras possíveis. "Temos que dizer a verdade, alertar sobre os perigos e nos defender. Não cedam, não desistam, não se esqueçam!"

TikTok lança sua própria campanha de conscientização

A própria plataforma também reconheceu a popularidade do tópico: para cada vídeo sobre o Holocausto, o TikTok agora oferece automaticamente um link para o portal informativo holocaust.org, do Congresso Judaico Mundial e da Unesco. A plataforma também iniciou sua própria "Iniciativa de Educação e Comemoração da Shoah", que recebeu o Prêmio Shimon Peres. Através dela, o TikTok apoia 15 memoriais — como Neuengamme ou Mauthausen —, nos quais a plataforma oferece workshops e intercâmbio em cooperação com a Universidade Hebraica de Jerusalém.

"Precisamos impedir que o Holocausto seja degradado a apenas mais um capítulo de um livro didático", diz Yaki Lopez, chefe de relações públicas da embaixada de Israel em Berlim. "Por isso, é importante adaptar a memória do Holocausto e a transmissão de conhecimento às realidades de vida das novas gerações." A Iniciativa Shoah do TikTok visa fornecer uma contribuição importante nesse sentido.

Tela de celular mostra jovem em vídeo no TikTok
Em um vídeo no TikTok, Daniel Carthwright explica como se comportar em campo de concentraçãoFoto: Johanne Rüdiger/DW

Milhões de visualizações

Conscientização sobre o Holocausto no TikTok — claro, por que não? Foi assim que os usuários da conta da DW no TikTok Berlin Fresh reagiram a uma série de vídeos explicativos sobre campos de concentração que a emissora produziu em cooperação com o Neuengamme Memorial.

Uma rápida olhada nos números da conta Berlin Fresh mostra que o interesse pelo tópico é de fato bastante alto: apenas um dos vídeos explicativos de 30 segundos da série da DW teve mais de 9 milhões de visualizações — principalmente entre jovens com menos de 24 anos.

Nele, o TikToker Daniel Cartwright, que atua como voluntário no memorial, explica como se comportar ao visitar um antigo campo de concentração. "Três coisas que você nunca deve fazer em um antigo campo de concentração" — a partir de sua perspectiva pessoal, ou seja, de alguém que está lá todos os dias.

Mas o que acontece com um jovem de 23 anos que grava vídeos diários sobre tamanho horror? "Às vezes, os horrores deste lugar me deixam mal", diz o britânico na série da DW. "Mas então ouço que os jovens estão vindo ao memorial por causa de nossos vídeos e querem saber ainda mais. Então percebo o quão importante é o nosso trabalho."

Para ver mais vídeos educativos sobre o Holocausto, acesse nosso canal TikTok DW Berlin Fresh.