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"Petroeuro" em vez de petrodólar?

Assis Mendonça12 de abril de 2003

O dólar – símbolo do poderio econômico dos EUA – perde cada vez mais o seu valor em relação ao euro. Após a guerra no Iraque, a situação precária da economia americana pode acelerar ainda mais esse processo.

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Em Londres, o mais importante centro financeiro da Europa, os especialistas já não excluem a possibilidade de que o euro venha a ser cotado em 1,40 dólar, a médio prazo. Nos últimos doze meses, a moeda americana já perdeu 17% do seu valor em relação à moeda única européia. Uma performance desastrosa para uma moeda considerada como a principal divisa nas reservas nacionais em quase todo o mundo.

A queda do valor comparativo do dólar não é causada pela pujança econômica dos países que compõem a chamada zona do euro. Pelo contrário, a crise européia é quase generalizada, sendo a Alemanha atualmente um dos países com a pior evolução econômica nesse grupo. A má situação européia não favorece, contudo, a moeda americana. Sua desvalorização é decorrente de fatores internos nos Estados Unidos.

Bem-estar à base de dívida

O bem-estar americano está sendo financiado à base de um endividamento galopante. O confortável superávit herdado de seu antecessor foi transformado pelo presidente George W. Bush num enorme déficit público, em menos de dois anos: somente no corrente ano, o governo americano teve de contrair dívidas da ordem de 380 bilhões de dólares. A maior parte desse capital destinou-se ao financiamento da redução de impostos – um presente de Bush aos seus eleitores das classes altas – e aos preparativos para a guerra no Iraque.

Ao mesmo tempo, cresce também o déficit na balança de pagamentos dos Estados Unidos. Empresas e consumidores americanos importam e consomem mais do que podem pagar. As contas são financiadas através do capital investido no país e que, em grande parte, é proveniente do exterior. Só no corrente ano, os investidores estrangeiros fizeram aplicações de mais de 500 bilhões de dólares nos Estados Unidos, um valor correspondente a 5% do PIB americano.

A revista semanal alemã Der Spiegel cita a este respeito o economista Jim O'Neill, do Banco de Investimentos Goldman Sachs: "O presidente George W. Bush está tentando contradizer as teorias econômicas e a história da economia. Ele não conseguirá". A prova de que O'Neill tem razão é a desvalorização da moeda americana em 17% nos últimos doze meses.

Reservas em euro

A desconfiança em relação ao dólar é crescente, não apenas entre os investidores internacionais, mas também entre os bancos centrais. Um grande número de países começou a reduzir suas reservas de dólar, em prol do aumento das reservas de euro. É o caso, por exemplo, da China, que tem a segunda maior reserva de divisas do mundo, depois do Japão. Mas é o caso também da Rússia, de Taiwan, de Cingapura e até mesmo do Canadá.

Tal evolução poderá ser fomentada ainda mais, caso o comércio mundial de petróleo passe a ser feito em euro, em vez de dólar. Então, os países importadores de petróleo se veriam obrigados a aumentar sensivelmente as suas reservas da moeda européia. Uma queda abrupta do dólar seria inevitável, a economia americana cairia numa depressão maior que a da década de 30.

Guerra em defesa do petrodólar?

Segundo o historiador americano William Clark, tal ameaça é bem mais real do que se supõe. Alguns países da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) estariam cogitando um passo nesse sentido, principalmente o Irã. Um outro país chegou mesmo a concretizar a medida: o Iraque de Saddam Hussein, que desde o ano 2000 só aceitava euro como pagamento pelo petróleo vendido.

De tal fato, Clark deduziu o que seria – a seu ver – a verdadeira razão para a intervenção militar dos Estados Unidos no Iraque: derrubar Saddam Hussein para que o Iraque retorne ao petrodólar, impedindo também que qualquer outro país da OPEP cogite a adoção do euro como moeda-padrão para as transações petrolíferas.

Com a ocupação militar do Iraque, a influência de Washington na região do Golfo Pérsico passa a ser tão abrangente que nenhum dos demais países árabes se atreverá a apoiar o Irã na tentativa de impor o euro como a nova moeda do petróleo.