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As polêmicas de Juscelino Filho, ministro das Comunicações

Publicado 28 de fevereiro de 2023Última atualização 23 de novembro de 2023

Investigadas pela PF, suspeitas de desvios na Codevasf envolvendo o deputado federal licenciado (União-MA) se juntam a histórico de controvérsias, como uso de avião da FAB em agenda particular e ocultação de patrimônio.

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Juscelino Filho fala ao microfone na Câmara
Em 2022, o hoje ministro apresentou um único projeto na Câmara: para criação do "Dia Nacional do Cavalo"Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Primeiro ministro do novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a ver seu nome envolvido em uma investigação da Polícia Federal, Juscelino Filho, titular das Comunicações, teve R$ 835 mil bloqueados por ordem do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), no escopo de uma operação deflagrada no começo de setembro de 2023.

A PF apura possíveis desvios na Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) por meio de emendas parlamentares, daí o bloqueio contra Juscelino – deputado federal maranhense licenciado pela União Brasil, ele é autor de parte dessas emendas e seria supostamente um dos beneficiários de uma organização criminosa que, segundo a PF, fraudava licitações, desviava recursos públicos e lavava dinheiro da estatal.

Segundo o jornal Folha de S.Paulo, Juscelino Filho destinou ao menos R$ 42 milhões a contratos com empreiteiras suspeitas de irregularidades. Uma delas, a Contruservice, teria usado laranjas para disputar contratos licitados durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro

 Ainda de acordo com a Folha, apuração junto à PF mostra que Juscelino seria o dono da Arco Construção, empreiteira contratada para realizar obras no valor de cerca de R$ 2,5 milhões no entorno de fazendas da família do ministro. Ou seja: além de beneficiar a família o dinheiro, segundo a Folha, teria ido para o bolso do próprio ministro. 

A defesa de Juscelino nega irregularidades e que ele seja dono da Arco, diz que o ministro está à disposição das autoridades e ressalta que emendas "são instrumentos legítimos e democráticos do Congresso Nacional".

Parte do Centrão, a União Brasil tem 59 deputados e 10 senadores. Embora não integre oficialmente a base do governo Lula, o partido controla três ministérios: além das Comunicações, detém ainda o Turismo e a Integração.

Irmã prefeita no interior do Maranhão sob a mira da PF

Embora Juscelino Filho não tenha sido alvo de mandado de busca e apreensão – Barroso negou pedido nesse sentido feito pela PF –, a irmã dele, Luanna Rezende, teve endereços revistados pelos agentes no começo de setembro e chegou a ser afastada do cargo de prefeita de Vitorino Freire, no Maranhão. Dias depois, por decisão do prórpio Barroso, ela foi reconduzida ao cargo.  

Segundo o portal de notícias UOL, o bloqueio de valores de Juscelino Filho ocorreu justamente em função de suspeita de desvios em uma obra de asfaltamento executada pela Construservice na cidade gerida pela irmã dele. 

Loteada entre partidos do centrão durante o governo Bolsonaro, a Codevasf se transformou naquele período em um dos principais escoadouros do dinheiro de emendas do orçamento secreto, usadas como moeda de troca pelo governo federal no trato com o Legislativo – a prática se manteve sob o governo Lula, ainda que sob nova roupagem e com algumas diferenças.

Na legislatura anterior, Juscelino Filho teria destinado ao menos R$ 13,4 milhões em emendas do orçamento secreto e outros R$ 11,1 milhões em emendas individuais ao município de Vitorino Freire, informou o jornal O Globo. A cidade tem pouco mais de 30 mil habitantes.

Cavalos de raça

Em fevereiro, o jornal O Estado de S.Paulo revelou que o ministro deixou de informar ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) um patrimônio de pelo menos R$ 2,2 milhões em cavalos de raça na declaração de bens entregue no ano anterior, quando disputou – com sucesso – a eleição para deputado federal pelo Maranhão.

A investigação do jornal mostra que, na época em que fez a declaração ao TSE em 2022, o atual ministro das Comunicações teria ao menos 12 cavalos da raça Quarto de Milha, adquiridos em leilão. Quando concorreu pela primeira vez a deputado federal, em 2014, Juscelino chegou a declarar vários animais. Já em 2018 e 2022, ele não fez menção a animais.

No ano passado, ele declarou ao TSE um patrimônio de R$ 4,4 milhões – incluindo fazendas, carros, metade de uma aeronave, apartamento e o terreno onde está instalado um haras. De acordo com o jornal, o valor é quase o mesmo que ele teria movimentado em leilões desde 2018, período no qual também teria vendido 14 animais da raça Quarto de Milha.

Haras no Maranhão

Não bastasse a omissão, os animais de raça seriam criados no haras do ministro, na cidade maranhense de Vitorino Freire, onde seu pai já foi prefeito e que atualmente é governada por sua irmã. 

No papel, o haras pertence à irmã do ministro e a Gustavo Marques Gaspar, um ex-assessor da Câmara. No entanto, um funcionário do haras disse ao Estadão que não conhece nenhum Gustavo Gaspar.

De acordo com O Estado de S.Paulo, o terreno da propriedade de 165 mil metros quadrados pertencia à prefeitura de Vitorino Freire. Mas, em 1999, a área foi adquirida por Juscelino Filho por R$ 1 mil. Na época, ele tinha apenas 14 anos e seu pai, Juscelino Rezende, era o prefeito da cidade.

Em 2007, Juscelino Filho vendeu a área por R$ 50 mil para Gustavo Gaspar e readquiriu a propriedade em 2018 por R$ 167 mil.

Estrada em benefício próprio

Sobre o haras também recai outra suspeita: o atual ministro teria mandado asfaltar uma estrada que passa por fazendas da família com dinheiro do orçamento secreto, recebido quando era deputado federal. 

De acordo com O Estado de S.Paulo, Juscelino teria indicado R$ 5 milhões em emendas do orçamento secreto que foram usados para melhoria de 19 quilômetros da estrada que circunda ao menos oito fazendas da família.

Quando a notícia veio a público, Juscelino argumentou que as propriedades beneficiadas são cercadas por "inúmeros povoados". 

Parte das verbas do orçamento secreto destinadas por ele à cidade de Vitorino Freire também teriam sido usadas para contratar pelo menos quatro empresas de amigos, ex-assessores e uma cunhada do ministro.

Reportagem publicada pela Folha de S.Paulo em 23 de novembro aponta que uma emenda parlamentar destinada a Juscelino quando ele era deputado, no valor de R$ 2,56 milhões, foi usada para a recuperação de uma estrada vicinal no entorno de uma fazenda da família, em obras que ocorreram entre 2017 e 2019.

Parte do dinheiro de outra emenda no valor de R$ 7,5 milhões foi usada para asfaltar a mesma estrada, sob obras da Construservice que ainda estão em andamento. 

Uso de avião da FAB para ir a leilão

Quando já era ministro, Juscelino Filho teria usado aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) para cumprir agendas pessoais – incluindo um leilão de cavalos em São Paulo. O caso ensejou uma investigação da Comissão de Ética da Presidência da República.

No caso do leilão de cavalos, a justificativa oficial do ministro foi de que a viagem – uma agenda em São Paulo em 27 de janeiro, uma sexta-feira, com duração de menos de três horas e encerramento ao meio-dia – seria "urgente". Ele deixou Brasília na quinta-feira, dia 26 de janeiro, e permaneceu em São Paulo até 30 de janeiro. Naquele fim de semana, assessorou compradores de animais, promoveu um de seus cavalos, recebeu um prêmio de criadores e inaugurou praça em homenagem a um cavalo de seu sócio.

Além do uso do avião da FAB, o ministro recebeu quatro diárias e meia, mesmo seus compromissos de trabalho tendo terminado ainda na sexta-feira. De acordo com O Estado de S.Paulo, a viagem teria custado cerca de R$ 140 mil.

Ao serem questionados sobre o fato pelo portal Poder360, os advogados do ministro responderam que a viagem "se tratava de agenda oficial" e tinha "claro interesse público".

Chips para Terra Indígena

Recentemente, como ministro das Comunicações, Jucelino Filho também se envolveu em mais uma polêmica: enviou mil chips de celular para serem utilizados nas operações humanitárias na Terra Indígena Yanomami, em Roraima. No entanto, os chips não funcionam na área porque não há cobertura da operadora de celular.

Escolhido por "cotas parlamentares"

Médico radiologista, Juscelino não tem experiência na área de Comunicações, mas vem de uma família influente no Maranhão. A nomeação dele – no passado, apoiador de Bolsonaro e que votou a favor do impeachment de Dilma Rousseff – faz parte das chamadas "cotas parlamentares" para facilitar a relação com o Congresso.

Releito deputado federal pela terceira vez em 2022, ele apresentou naquele ano um único projeto na Câmara, justamente para criar o "Dia Nacional do Cavalo".

Embora evite publicar em suas redes sociais postagens sobre cavalos, ele aparece frequentemente em filmagens de leilões, sendo ovacionado.

As explicações de Juscelino

Em março, quando a história do leilão de cavalos veio à tona, Juscelino divulgou um vídeo em que se defendia das acusações de uso indevido de verba pública. Sobre o recebimento das diárias, apontou "erro no sistema", que acabou incluindo valores relativos aos finais de semana, quando ele não teve agenda de trabalho.

"O que aconteceu foi que o sistema gerou automaticamente as diárias para todo o período, um erro de sistema, sem diferenciar o final de semana”, afirmou. Em outra postagem no Twitter, o ministro exibe cópia de dois comprovantes de depósito na conta única do Tesouro Nacional. Um no valor de R$ 2.004,45, realizado no dia 28 de fevereiro e outro no valor de R$ 2.786, feito no dia 19 de janeiro. 

Sobre seus investimentos em cavalos de raça, Juscelino Filho diz declarar tudo ao fisco e chama as acusações de "ataques distorcidos".

"Desde sempre declaro todos os meus bens na minha declaração de Imposto de Renda [IR], inclusive os meus cavalos. E faço questão de deixar claro: a Receita Federal sempre aprovou todas as minhas declarações de IR. E mais, a Justiça Eleitoral também aprovou as minhas contas", afirmou. "Sou ficha limpa e não respondo a nenhum processo e é importante deixar isso bem claro", defendeu-se.

O ministro também negou na época uso de emendas parlamentares em benefício próprio e de familiares.

"Não houve obras nas proximidades da minha fazenda nem na via de acesso. E o projeto tem o objetivo de atender inúmeras comunidades que convivem com lama e com a poeira", argumentou.

ra/le/md (ots)