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"Medidas imediatas", mas para quando?

Laís Kalka24 de abril de 2003

Ainda inconsoláveis com as pilhagens de bens culturais no Iraque, museólogos e cientistas exigem medidas imediatas para a proteção do patrimônio.

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Ninguém sabe quantas obras de arte foram roubadas no IraqueFoto: AP

Mais de dez dias após os saques no Museu Nacional de Bagdá e outras instituições iraquianas, os cadernos de cultura da Alemanha continuam preenchendo páginas na busca de uma resposta para a pergunta sobre como foi possível que pilhagens dessa extensão ocorressem praticamente sob as barbas das tropas norte-americanas. Museólogos e cientistas, por sua vez, ainda inconsoláveis com as perdas irreparáveis — sobre cuja extensão exata ninguém tem idéia até agora —, exigem medidas imediatas da comunidade internacional.

Fronteiras fechadas e olhos abertos

Em coletiva de imprensa organizada na capital alemã pelos Museus Estatais de Berlim, a diretora do Museu da Ásia Menor, Beate Salje, defendeu a proibição em todo o mundo da importação de bens culturais iraquianos, acompanhada de um controle severo nas fronteiras do país — para evitar que peças de arte e arqueológicas continuem sendo levadas para fora —, e do destacamento de guardas para a segurança dos museus e instituições.

São medidas que exigem a adesão e a cooperação de toda a comunidade internacional, inclusive o financiamento do pessoal de segurança: um guarda custa, segundo Salje, apenas três dólares por dia.

O perigo de que os locais em que se realizam escavações arqueológicas continuem sendo saqueados é grande. Peter Miglus, arqueólogo de Heidelberg que dirigiu uma expedição à antiga capital Assur, lembra que, depois da última Guerra do Golfo, as pilhagens prosseguiram durante anos.

Cobiça dos colecionadores

Das geplünderte Nationalmuseum in Bagdad
O Museu Nacional de Bagdá durante as pilhagensFoto: AP

São inúmeros os especialistas que estão convencidos de que os saques foram organizados por uma máfia internacional, para atender aos interesses do mercado internacional de arte. Ulli Seegers, diretora da seção de Colônia do Art Loss Register (ALR), tem certeza de que a maior parte das peças roubadas ainda vai aparecer e ser colocada à venda. "Isto é o que mostram as experiências da primeira Guerra do Golfo", diz.

A ALR possui o maior banco de dados privado do mundo com informações sobre 130 mil objetos de arte desaparecidos, pilhados ou roubados, e observa o mercado internacional a pedido de museus, galerias, seguradoras e compradores particulares. A entidade, fundada em Londres em 1991, consegue esclarecer 25% dos casos de busca de que é incumbida.

No caso das pilhagens no Iraque, a ARL aguarda um comunicado oficial sobre os objetos desaparecidos. O problema é que não apenas a quantificação como também a identificação das peças roubadas é uma tarefa dificílima. Teme-se que as listas dos objetos resgatados em escavações dos últimos 60 a 70 anos, que ainda nem haviam sido publicadas, tenham sido igualmente roubadas ou destruídas.

Alemanha oferece ajuda

Existe, no entanto, um determinado acervo já inventariado em cuja identificação e busca a Alemanha pode ajudar. Cópias da documentação de escavações, depositadas nos museus berlinenses, contêm inclusive o número de inventário que os objetos receberam ao ser catalogados no Iraque.

Os museólogos alemães, de qualquer forma, estão dispostos a colaborar com os colegas iraquianos. Mas eles manifestam estranhamento, diante da notícia veiculada pelo jornal londrino Independent on Sunday de que os mais importantes museus do mundo estariam enviando especialistas ao Iraque, sem citar nenhum alemão entre eles. "A gente se pergunta por que os alemães estão sendo deixados de lado", admira-se Beate Salje. E o diretor-geral dos Museus Estatais de Berlim, Peter-Klaus Schuster, garante que arqueólogos e restauradores alemães estariam em condição de partir imediatamente para Bagdá.

Tarde demais?

Nesse meio tempo, as primeiras peças saqueadas no Iraque nesta guerra já foram apreendidas por autoridades alfandegárias, na Europa e nos Estados Unidos. Não deve tardar que elas surjam na Suíça, que tem se mostrado um verdadeiro paraíso para o mercado negro de objetos de arte. Uma lei que proíbe a importação e exportação de bens culturais só agora está em debate no país alpino. Até que ela seja aprovada, é possível que os primeiros objetos provenientes de museus iraquianos já tenham passado para a mão de novos donos.

Os especialistas em arte e culturas antigas continuam debatendo em encontros internacionais sobre como agir. Em fins de abril, a Unesco dá seqüência, em Londres, à conferência que realizou na última quinta-feira (17/04) em Paris; em maio, tem lugar em Berlim um simpósio sobre arqueologia ilegal e, logo em seguida em Bonn, mais um sobre a arqueologia na terra de ninguém, tratando de escavações no Afeganistão.

A Interpol — a Polícia Internacional — também apóia todos o empenhos pela recuperação dos bens pilhados e já constituiu uma comissão especial para tratar do assunto. Uma conferência para coordenar as atividades internacionais neste setor será realizada a 5 e 6 de maio em Lyon, na França.