Irmandade Muçulmana perde credibilidade no Egito
12 de dezembro de 2012A maior parte dos oposicionistas egípcios rejeita o referendo popular sobre a nova Constituição nacional, marcado para sábado (14/12). Entre os grandes partidos, somente a facção islâmica moderada encabeçada pelo físico Abdel Moneim Abul Futuh é a favor da votação – embora Futuh seja contra a nova Lei Fundamental, em si.
Apesar da retirada do decreto que dava plenos poderes ao presidente Mohammed Morsi, a oposição segue indo às ruas em protesto. "Nós tememos que os direitos fundamentais venham a ser restringidos e não estejam mais ancorados em nossa Constituição": assim Abdul Bar Zahran, cofundador e funcionário do Partido dos Egípcios Livres, justifica a continuação da resistência contra o presidente e o planejado referendo. "Por isso conclamamos a manifestações em todo o país."
Para Zahran, a retirada do decreto é apenas parte de uma manobra política da Irmandade Muçulmana. Desde o início, a intenção de Morsi teria sido impor sua Constituição contra a resistência da oposição. Com o decreto, ele apenas evitou a dissolução da Assembleia Constituinte, e agora o prazo até o referendo é curto demais para tal passo. E o esboço de Constituição estará salvo, uma vez que seja aceito na votação popular, prossegue o oposicionista.
Manobra do presidente
A oposição do Egito não está apenas contrariada com o documento, em si, mas também com a forma como foi elaborado, explica Elijah Zarwan, pesquisador do European Council on Foreign Relations, sediado no Cairo.
"Digamos que Morsi lance cinco decretos que encolerizam a oposição. Aí, ele retira um deles. E já aparenta ser nobre de sentimentos e disposto a ceder, enquanto a oposição parece extremamente teimosa. Na realidade, porém, os outros decretos permanecem em vigor."
Zarwan lembra que, antes mesmo do polêmico decreto, os oposicionistas já vinham protestando contra a Constituição que agora deverá ser submetida a referendo. Por esse motivo, quase todos os membros da Constituinte que não fossem islâmicos ortodoxos a haviam abandonado.
Assim, o esboço a ser votado no sábado foi elaborado sem a participação dos partidos liberais, moderados ou cristãos, e aos olhos da oposição o processo de decisão como um todo é ilegítimo, comenta o especialista em direitos humanos. "O Egito não merecia um esboço de Constituição como este. A Assembleia Constituinte não representou o povo, mas apenas a posição dos islamistas ortodoxos", observa Abdul Bar Zahran, do Partido dos Egípcios Livres.
Perda total de confiança
Como mais um motivo para o boicote do referendo, o político oposicionista cita os recentes atos de violência da Irmandade Muçulmana contra manifestantes pacíficos.
"Quem viveu e viu isso com os próprios olhos não pode mais ter confiança neles. Pois vimos as imagens e vivenciamos nas ruas como as milícias da Irmandade partiram para cima das pessoas", diz Zahran. A maioria dos manifestantes diante do palácio presidencial partilha essa opinião: para eles, os "irmãos" perderam toda credibilidade.
Zahran defende que, num país em que há um presidente livremente eleito, também deve ser permitido manifestar-se de forma pacífica, sem ser atacado pelos adversários políticos. Ele reconhece que ambos os lados investiram um contra o outro com grande violência. Porém, o exame dos relatórios das testemunhas, material de vídeo e outros indícios mostram ter sido a Irmandade Muçulmana a dar início aos confrontos.
Por isso, para o ativista é impensável um referendo sem a presença de observadores internacionais, sob o governo dos radicais islâmicos. Segundo Elijah Zarwan, os acontecimentos recentes indicam que a preocupação da oposição vai além de rejeitar medidas isoladas da Irmandade: ela quer impor limites nos radicais.
"A principal motivação da oposição é que tanto os 'irmãos muçulmanos' quanto Morsi extrapolaram o mandato obtido através de eleições. Os opositores querem agora mostrar aos 'irmãos' que eles são o governo eleito, mas que isso não lhes dá o direito de fazer o que bem entenderem."
Autoria: Matthias Sailer (av)
Revisão: Francis França