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DW premia jornalistas perseguidos em meio à pandemia

Helena Kaschel as
3 de maio de 2020

Premiados representam profissionais que, mesmo com todas dificuldades impostas por autoridades, informam de forma imparcial sobre a crise provocada pelo novo coronavírus em lugares como China, Tchetchênia e Venezuela.

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Fang Bi
Fang Bi havia colocado vídeos e live-streams sobre a situação na sua cidade natal, Wuhan, antes de desaparecerFoto: Getty Images/AFP/I. Lawrence

A DW distingue neste ano, com o Prêmio Liberdade de Expressão (Freedom of Speech Award), mais de uma dezena de jornalistas pelo seu trabalho durante a crise do novo coronavírus.

As premiadas e os premiados de quatro continentes representam todos os profissionais de mídia do mundo que, em condições adversas, divulgam informações imparciais sobre o novo coronavírus e sua propagação.

"Em tempos de uma crise global de saúde, o jornalismo tem uma função essencial, e cada jornalista carrega uma grande responsabilidade", disse o diretor-geral da DW, Peter Limbourg, durante o anúncio dos vencedores, em Berlim.

"Cidadãos de todos os países têm o direito de receber informações baseadas em fatos e resultados independentes. Todas as formas de censura podem custar vidas! Tentativas de criminalizar a cobertura jornalística sobre a atual situação ferem claramente a liberdade de expressão", disse Limbourg.

A alta comissária de Direitos Humanos das Nações Unidas, Michelle Bachelet, disse, numa mensagem de vídeo aos premiados, que a opinião pública necessita de "informações completas e exatas sobre a pandemia e deve ser envolvida nas decisões que são tomadas em nosso nome".

"A informação salva vidas", diz Bachelet

Segundo ela, "é chocante que jornalistas sejam atacados, ameaçados, presos, acusados de crimes que não cometeram e até mesmo desapareçam porque informaram sobre uma pandemia".

Organizações de defesa dos jornalistas denunciaram amplas restrições na liberdade de imprensa no âmbito da pandemia de covid-19. "Em todas as partes do mundo, regimes autoritários não conseguiram resistir a usar essa crise sem precedentes para controlar as mídias nacionais ou elevar o controle sobre elas ou fortalecer a censura estatal",afirmou a organização Repórteres sem Fronteiras (RSF).

A ONG International Press Institute (IPI) documentou mais de 150 agressões à liberdade de imprensa em inúmeros países, no âmbito da epidemia, até 29 de abril. A IPI lista casos de censura, cerceamento do acesso à informação e sobretudo também prisões de jornalistas e ataques verbais e físicos a jornalistas.

Desaparecimentos na China

A situação é especialmente difícil em países onde a liberdade de imprensa já é fortemente limitada. Por exemplo na China, onde o novo coronavírus foi identificado pela primeira vez, em dezembro de 2019. Na crise que se seguiu, o mundo inteiro pôde sentir "os efeitos do controle quase total sobre a notícia na China", analisou a RSF.

Na dúvida, "a execução de ordens de censura é posta acima da proteção da saúde", escreveu a ONG. No atual ranking de liberdade de imprensa da instituição, a China está na posição anterior à antepenúltima.

A imprensa internacional destacou sobretudo o desaparecimento de vários chineses que praticavam o jornalismo cidadão no contexto da pandemia. O advogado Chen Qiushi informava, no Twitter e no YouTube, sobre a quarentena na cidade de Wuhan até desaparecer em 6 de fevereiro.

"Tenho medo: diante de mim está a doença, atrás de mim estão a polícia e a Justiça da China", disse Chen num vídeo de YouTube, poucos dias antes de desaparecer.

"Mas, enquanto eu viver, continuarei relatando – e informando apenas o que eu mesmo vi e ouvi. Eu não tenho medo da morte. Partido Comunista: acha mesmo que eu tenho medo de você?", disse Chen no vídeo, que já foi visto quase 3 milhões de vezes. Chen já havia dado mostras de não temer o PC em 2019, quando relatou sobre os protestos em Hong Kong.

Também o empresário Fang Bi havia colocado vídeos e live-streams sobre a situação na sua cidade natal, Wuhan, antes de desaparecer. Em 1º de fevereiro, ele filmou sacos para transportar cadáveres num veículo estacionado diante de um hospital. No dia seguinte, Fang relatou que a polícia confiscou seu laptop e o interrogou. Desde 9 de fevereiro, o paradeiro dele é desconhecido.

E a repressão continua: desde 19 de abril, três ativistas chineses que trabalharam num projeto contra a censura desapareceram.

Chen Qiushi
Chen Qiushi informava, no Twitter e no YouTube, sobre a quarentena em Wuhan até desaparecer em 6 de fevereiroFoto: Chen Qiushi

Ameaças na Tchetchênia

Outro caso de grande repercussão internacional foi o da jornalista investigativa Jelena Milaschina, na Rússia.

Desde 1996, essa jornalista premiada internacionalmente escreve para o jornal Nowaja Gaseta. Por causa de sua cobertura jornalística crítica sobre a maneira como a Tchetchênia está lidando com a crise do coronavírus, ela entrou na mira do chefe dessa república autônoma, Ramzán Ajmátovich Kadyrow.

Em meados de abril, Milaschina escreveu que moradores da região com sintomas de covid-19 não buscavam tratamento com medo de represálias. Um dia depois, Kadyrow chamou os serviços de segurança russos, por meio de um vídeo divulgado nas redes sociais, a parar "esses monstros que escrevem e provocam o meu povo". Se as autoridades desejam "que cometamos crimes e nos tornemos criminosos, então que o digam", acrescentou. ONGs humanitárias entenderam a declaração como ameaça de morte a Milaschina.

Essas declarações levaram a encarregada de direitos humanos do governo alemão, Bärbel Kofler, e o embaixador de direitos humanos da França, François Croquette, a exigir da Rússia que investigue as ameaças a Milaschina. "Ameaças pode detentores de cargos públicos são algo totalmente inaceitável e contrárias ao Estado de Direito",afirmaram, em nota conjunta.

Milaschina, que há anos investiga a corrupção e agressões a direitos humanos na Tchetchênia, havia sido agredida em fevereiro num hotel de Grozny, a capital tchetchena.

Doze dias de detenção

Escrever sobre o coronavírus trouxe graves consequências também para o jornalista Darvinson Rojas, de 25 anos. Ele divulga informações sobre a pandemia na Venezuela em sua conta do Twitter.

Em 21 de março, o jornalista foi preso quando estava em casa, em Caracas, pela unidade especial da polícia Faes. No Twitter, Roja escreveu que as forças de segurança haviam dito terem recebido uma denúncia anônima de um caso de coronavírus. Mas, segundo a Anistia Internacional, ele foi mais tarde interrogado pela polícia, que queria saber quem lhe repassara os números de casos de coronavírus que ele havia divulgado.

Rojas foi libertado depois de 12 dias na cadeia, após o pagamento de caução, e acusado de "incitação ao ódio" e "incitação pública". A Anistia afirmou que as acusações tem caráter político e são "uma tentativa de coibir a cobertura jornalística de Rojas sobre a pandemia na Venezuela".

Desde 2017, a Repórteres sem Fronteiras registra um número recorde de detenções arbitrárias e violência contra jornalistas por policiais e serviços secretos no país sul-americano.

DW exige libertação de jornalistas

"Destacamos todas e todos os nossos colegas que, nestes tempos difíceis, são impedidos, por meio de violência, de realizar o seu trabalho",afirmou Limbourg. "A DW exige que todos os jornalistas em todo o mundo, que foram presos por causa de sua cobertura da crise do coronavírus, sejam imediatamente libertados."

O prêmio Freedom of Speech é concedido desde 2015 a iniciativas ou pessoas que se empenharam de forma destacada pelos direitos humanos e pela liberdade de expressão.

Entre os agraciados estão o blogueiro saudita Raif Badawi, a Associação dos Correspondentes da Casa Branca e a jornalista mexicana Anabel Hernández.

Em situação normal, a entrega do prêmio é um dos pontos altos do evento de mídia Global Media Forum (GMF), em Bonn. Este ano, porém, o GMF ocorrerá apenas de forma virtual.

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