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A nova disputa migratória entre Turquia e União Europeia

2 de março de 2020

O presidente turco declarou aberta a fronteira de seu país com a Europa. Ato gerou crise na divisa com a Grécia e tensões com países europeus, enquanto a UE se articula para impedir nova onda de refugiados ao continente.

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Atrás de cerca de arame farpado, homem com puôver branco levanta tijolo para protestar contra barragem na fronteira da Turquia com a Grécia. Atrás dele, vários homens também protestam, levantando os braços, ou esperam pela passagem
Migrantes esperam do lado turco da fronteira, na esperança de cruzar para a GréciaFoto: Reuters/A. Avramidis

Muitos políticos na União Europeia (UE) estão em pânico diante das ameaças de uma nova fuga em massa para a Europa, a exemplo da onda migratória de 2015. O receio é de novas tensões entre a população, novas demonstrações de extremismo político e uma divisão ainda maior entre os países dispostos a acolher refugiados e aqueles que se recusam.

É sobretudo a política alemã que está em pânico. Foi justamente a chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, quem prometeu que 2015 não se repetiria.

Eis a nova situação: a tensão na fronteira entre a Turquia e a Grécia se escalou no fim de semana, depois que Ancara disse que abriria suas divisas com a UE, em reação aos combates na província de Idlib, no noroeste da Síria. Milhares de migrantes se posicionaram na fronteira, na esperança de seguir em direção à Europa.

Enquanto isso, políticos da legenda governista alemã CDU se manifestam, entre eles Friedrich Merz, aspirante a sucessor de Merkel na presidência do partido. Merz quer enviar o seguinte sinal à fronteira grego-turca: a Alemanha não pode acolher esses migrantes.

O vice-líder da bancada da CDU no Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão), Thorsten Frei, exige até que migrantes possam ser rejeitados na fronteira alemã, caso cheguem até ali.

Até mesmo a deputada Sevim Dagdelen, do partido A Esquerda, não quer que a Alemanha volte a receber refugiados em massa, como fizera em 2015. Já o Partido Verde vê o acolhimento como uma obrigação do país – mas no contexto da União Europeia.

Sem processos para requerer refúgio

Até o momento, a UE vem adotando uma estratégia de defesa. A Grécia reforçou as tropas na fronteira com a Turquia: no fim de semana e nesta segunda-feira (02/03), forças de segurança gregas voltaram a investir contra migrantes com jatos d'água e gás lacrimogêneo para impendir sua entrada.

A Grécia considera a situação extremamente crítica, e pediu auxílio à agência europeia de proteção de fronteiras, a Frontex. Ainda não se sabe que medidas a Frontex vai tomar. "Vamos observar como podemos ajudar a Grécia o mais rápido possível", tuitou a agência nesta segunda-feira. Como precaução, a Frontex elevou o nível de alerta nos países que fazem fronteira com a Turquia.

Além disso, a Grécia suspendeu, por um mês, os processos de requerimento de refúgio para novos migrantes que chegaram ilegalmente ao país. As opiniões divergem sobre se a medida é legal ou não, já que todo migrante tem o direito de ter seu processo avaliado sem ser extraditado.

Organizações de ajuda a migrantes enxergam uma violação desse princípio. Já o eurodeputado alemão Manfred Weber, do conservador Partido Popular Europeu, justificou a atitude da Grécia nesta segunda-feira, em fala à rádio alemã Deutschlandfunk.

"Não se trata de pessoas individuais que querem pedir refúgio na Grécia. São ônibus pagos por Erdogan, conduzidos até a fronteira, que geralmente vêm de campos de refugiados já existentes – ou seja, pessoas que já têm abrigo. E é preciso salientar que a Turquia é considerada um país seguro para cidadãos de terceiros países."

Imagem aérea mostra estrada de terra em meio a campo cultivado. Imigrantes caminham em direção ao horizonte, rumo à Grécia, a partir da Turquia
Migrantes caminham de Edirne, na Turquia, rumo à GréciaFoto: Reuters/U. Bektas

Merkel também afirmou que a decisão do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, de transportar em ônibus milhares de migrantes de campos de refugiados à fronteira turca com a Grécia foi uma abordagem errada, mesmo que Ancara "atualmente não se sinta suficientemente apoiada" pela Europa.

"Apesar de toda a vontade de negociar sobre fornecer ainda mais apoio [à Turquia], é totalmente inaceitável que se desconte nos refugiados", disse a chanceler federal nesta segunda-feira. Segundo ela, Erdogan está levando pessoas desesperadas a um "beco sem saída", já que a Grécia deixou claro que não pretende permitir a entrada desses migrantes.

O ministro do Exterior alemão, Heiko Maas, acrescentou: "Não devemos permitir que os refugiados se transformem em brinquedos de interesses geopolíticos. Não importa quem tente fazer isso, sempre terá nossa resistência."

O preparo de países da rota dos Bálcãs

Segundo dados das Nações Unidas, cerca de 13 mil migrantes aguardam a oportunidade de passar do lado turco da fronteira para a Grécia. Além deste país, o único Estado-membro da UE que faz fronteira com a Turquia é a Bulgária, onde a situação está calma.

O governo búlgaro tomou medidas preventivas e enviou tropas adicionais à fronteira para impedir a entrada de migrantes em caso de urgência. O objetivo do primeiro-ministro Boyko Borissov é conseguir, junto a Erdogan, que o lado búlgaro não seja atingido por uma onda de refugiados. Segundo Borissov, a chegada de mais pessoas desestabilizaria a região.

As palavras mais recentes de Erdogan, no entanto, deverão piorar a situação. O presidente turco disse nesta segunda-feira que, ao abrir sua fronteira com a UE, "milhões" de pessoas deverão cruzar a divisa em breve. Segundo Erdogan, cabe à União Europeia "carregar a sua parte do peso".

Há cerca de 3,5 milhões de refugiados sírios vivendo na Turquia. Políticos europeus admitem que Ancara arca com grande parte da responsabilidade pelos refugiados, e se dispuseram a ajudar mais, mas não querem ser pressionados.

Ao mesmo tempo, os países ao longo da chamada rota dos Bálcãs se dizem bem preparados – foi por essa rota que centenas de milhares de migrantes chegaram ao noroeste europeu em 2015/2016.

O ministro do Interior austríaco, Karl Nehammer, disse em coletiva de imprensa conjunta com seu homólogo húngaro Sandor Pinter: "Aprendemos as lições de 2015. Nosso objetivo é e continua sendo: parar e não deixar passar."

O primeiro-ministro croata, Andrej Plenkovic, cujo país detém atualmente a presidência rotativa do Conselho da UE, afirmou que seu governo vai ajudar a Grécia e a Bulgária "a proteger suas fronteiras externas com todos os meios".

O ministro do Interior esloveno, Bostjan Poklukar, espera que a UE encontre "uma solução eficaz sobre como fechar as fronteiras" com os países da rota ocidental dos Bálcãs.

Fim do acordo entre UE e Turquia?

Em nível europeu, o comissário de Promoção do Modo de Vida Europeu, Margaritis Schinas, pediu em breve uma reunião extraordinária dos ministros do Interior da UE. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, e o presidente do Parlamento Europeu, David Sassoli, querem participar do encontro.

O tom, também aqui, parece se concentrar principalmente na defesa. O primeiro-ministro grego, o conservador Kyriakos Mitsotakis, disse que se trata de "um sinal importante do apoio das três instituições num momento em que a Grécia está protegendo as fronteiras europeias com sucesso".

Ao dizer que a fronteira para a UE estava aberta no fim de semana, Erdogan parece ter encerrado o acordo com a União Europeia.

No pacto sobre refugiados de 2016, a Turquia havia concordado em combater a imigração ilegal. O acordo também prevê que a UE pode enviar de volta todos os refugiados e migrantes que chegam ilegalmente às ilhas gregas pela Turquia. Em contrapartida, o bloco europeu admite sírios vindos da Turquia com regularidade. Ancara também recebe apoio financeiro para acolher refugiados.

A Alemanha considera o acordo bom para ambos os lados e diz que o pacto está sendo cumprido, segundo o porta-voz do governo alemão, Steffen Seibert.

Na última sexta-feira, a UE sublinhou que espera que a Turquia cumpra sua parte no acordo. O eurodeputado Manfred Weber falou na possibilidade de mais ajuda para a Turquia, mas disse que Erdogan precisa saber que "a Europa não se deixará chantagear".

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