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"Cresce junto o que foi criado para estar junto"

26 de março de 2013

Uma cidade, duas metades – e um homem de Estado que pronunciou as palavras certas sobre a situação. Willy Brandt era um grande orador. Sua frase mais famosa, porém, surgiu numa entrevista.

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Foto: picture-alliance/ZB

Há várias frases significativas proferidas em Berlim que entraram para a história. Ernst Reuter, prefeito no pós-guerra da cidade destruída, disse num discurso aos berlinenses: "Povos do mundo, olhem para esta cidade". A frase foi um grito de socorro dirigido às potências vencedoras.

Os norte-americanos apoiaram em especial a cidade que, ainda assim, acabaria sendo dividida na década de 60. Em 1963, o então presidente dos EUA John F. Kennedy demonstrou à população sua solidariedade pessoal e a de seu povo na mais breve prova de amizade: "Ich bin ein Berliner!" – "Sou um berlinense".

Uma frase que Willy Brandt gostou de ouvir. Na qualidade de então prefeito de Berlim, ele recebeu o ilustre convidado de Washington. Em 1989, ano histórico para a Alemanha por causa da queda do Muro, o mesmo Brandt declarou algo cujo efeito e sentido só atingiriam seus contemporâneos aos poucos.

Willy Brandt Maueröffnung Kundgebung Schöneberger Rathaus Berlin
Willy Brandt (ao microfone) durante discurso de 10 de novembro de 1989Foto: picture-alliance/ dpa

Berlim, lugar histórico

"Cresce junto, o que foi criado para estar junto": assim o popular ex-chanceler federal dos anos 70 comentou a queda do Muro de Berlim em 9 de novembro de 1989. Uma afirmação tão breve e simples quanto lógica e tranquilizadora naquele período emocionalmente conturbado para o país.

A frase não teve a mesma força eletrizante da dita por Kennedy, mas ajudou a orientar. O Muro apresentava apenas pequenas fissuras e o futuro da Alemanha Oriental era completamente incerto. Falava-se de socialismo reformista, outros refletiam sobre a possibilidade de uma confederação, até mesmo a criação de uma Aliança Alemã foi cogitada. Mas Brandt disse tudo, sem pressionar. A reunificação deveria crescer de maneira orgânica.

O que até hoje poucos sabem é que essa famosa frase não foi dita por ele na manifestação do dia 10 de novembro, um dia após a queda do Muro de Berlim, em frente à prefeitura de Berlim. Na ocasião, entre lágrimas e aclamações de "Willy! Willy!", o presidente honorário do Partido Social-Democrata (SPD) se referiu em seu discurso aos berlinenses ao crescimento conjunto da Europa, não da Alemanha.

Willy Brandt 1989 Schöneberger Rathaus Berlin
Ex-chanceler federal (esq.) com o então prefeito de Berlim, Walter Momper, após a abertura do MuroFoto: picture-alliance / dpa

Historiadores foram mais tarde buscar a origem dessa frase que definiu o processo de reunificação, sendo citada por políticos de todos os partidos. A descoberta foi surpreendente: as famosas palavras não aparecem na gravação do discurso de Brandt, na sacada da prefeitura, ao lado do chanceler federal Helmut Kohl e do ministro do Exterior, Hans-Dietrich Genscher.

Willy Brandt tampouco mencionou a frase em seu livro Erinnerungen (Recordações). Na verdade, a declaração histórica, palavra por palavra, pode ser lida em duas entrevistas para jornais. Foram entrevistas realizadas antes ou depois do discurso, às pressas, num círculo reduzido de pessoas. Ela passou despercebida, até mesmo para os jornalistas que o entrevistaram naquela noite. Os jornais poderiam tê-la escolhido como manchete, mas a repercussão viria bem mais tarde.

A frase só se tornou popular através de um boletim do SPD. No final de novembro de 1989, o partido de Willy Brandt mandou imprimir 6 mil exemplares de um informativo com as palavras do ex-chanceler, para colocar nos quadros de aviso das sedes locais. Em dezembro, a espirituosa frase seria definitivamente consagrada, como lema do congresso do Partido Social-Democrata.

Brandt como visionário

Durante toda a vida, Willy Brandt foi um grande orador. "Não aprendi a discursar, já nasci sabendo", disse certa vez, confiante a respeito de suas habilidades retóricas. Por isso, não é de surpreender que as palavras históricas em relação à Quedo do Muro já tenham aparecido bem antes em seus discursos.

Em 1958, como prefeito, durante a inauguração de um novo trecho de metrô em Berlim Ocidental, disse: "que um dia esteja ligado o que foi predestinado a ficar junto." E seis anos mais tarde, por ocasião do terceiro aniversário da construção do Muro, ele usou uma formulação semelhante: "A Alemanha precisa ser reunificada para que se una o que é para ficar junto".

Na época, o chefe de governo e seu partido eram acusados pelos adversários políticos de aceitarem a divisão da Alemanha como uma realidade incontestável. Em suas Memórias, Brandt escreveu que a reunificação talvez tenha sido uma ilusão para se poder continuar vivendo – note-se, porém, o uso do advérbio talvez.

Deutsche Wiedervereinigung 1990
Reunificação em outubro de 1990 (da esq. para a dir.): ex-chanceler federal Willy Brandt, ministro do Exterior, Hans-Dietrich Genscher, Hannelore Kohl, chanceler federal, Helmut Kohl, presidente, Richard von Weizsäcker; último premiê da RDA, Lothar de Maizière, e líder social-cristão, Theo WaigelFoto: picture-alliance/dpa

Brandt e Kohl: unidos no espírito político da época

Willy Brandt já estava aposentado da vida política quando vivenciou a queda do Muro de Berlim. Após acontecer o inimaginável, o partido SPD ficou feliz de tê-lo como seu representante entre as autoridades políticas do país. Muitos social-democratas, inclusive do primeiro escalão, tiveram problemas com a revolução pacífica na Alemanha Oriental. Círculos influentes do partido queriam reformá-la e mantê-la como um segundo Estado alemão.

Já posição de Brandt era clara. Sua formulação havia tocado o coração das pessoas, por expressar o grotesco dessa separação. No teor de suas palavras, nota-se também paciência e humildade. Por seu desempenho no processo da reunificação, Brandt obteve, naquelas semanas e meses históricos, grande reconhecimento tanto de seus antigos adversários políticos quanto dos companheiros de partido.

É possível dizer que, apesar das fortes diferenças em relação às convicções políticas e histórias de vida, o então chanceler federal Helmut Kohl e o ex-chanceler federal Willy Brandt nunca estiveram tão próximos como logo após a queda do Muro.

Autor: Volker Wagener (smc)
Revisão: Roselaine Wandscheer