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PolíticaColômbia

O retorno de Íngrid Betancourt à arena eleitoral da Colômbia

Emilia Rojas Sasse
20 de janeiro de 2022

Duas décadas após seu sequestro pelas Farc, uma figura emblemática da política colombiana volta a aspirar à presidência, representando a Coalizão Centro Esperança. Analistas avaliam as chances de êxito de Betancourt.

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Política colombiana Ingrid Betancourt
Ex-candidata presidencial Ingrid Betancourt foi uma das personagens determinantes da política colombiana, 20 anos atrásFoto: Luisa Gonzalez/REUTERS

Como diz a letra do tango Volver, 20 anos não são nada. Mas podem ser muito na política, especialmente num país como a Colômbia, que nesse período selou de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e ainda percorre o árduo de sua implementação prática.

Vinte anos tampouco transcorrem sem marcas na vida de uma mulher como Íngrid Betancourt, que passou grande parte deles radicada na França e afastada da política, embora não inteiramente. Ela seguiu lutando pelas vítimas da violência, escreveu e participou de conferências.

Ela agora aspira a fechar o ciclo iniciado duas décadas atrás, quando sua candidatura presidencial foi abruptamente truncada por um sequestro que durou seis anos, transformando-a na refém da guerrilha colombiana mais conhecida em nível internacional.

Neste ínterim investida de distinções internacionais como a Ordem da Legião de Honra francesa e o Prêmio Príncipe de Astúrias da Concórdia, Betancourt retorna ao palco eleitoral. E o faz em meio a um clima de incerteza, num país que vive o ocaso do uribismo, com uma direita em processo de reordenamento e uma esquerda que lidera, mas vai engasgando nas pesquisas.

Betancourt acaba de anunciar sua pré-candidatura às eleições presidenciais de 29 de maio, representando a Coalizão Centro Esperança. Sua esperança é oferecer uma opção dissociada dos extremos de direita e esquerda, numa Colômbia altamente polarizada.

Ingrid Betancourt em 2008
Betancourt como refém das Farc, em 2008, um sequestro que durou seis anosFoto: Presidencia Colombia/picture alliance/dpa

Uma outra Colômbia

Para Ariel Ávila, cientista político e subdiretor da Fundação Pares (Paz e Reconciliação), Betancourt tomou a decisão tarde demais, pois outros candidatos já estão se consolidando. Além disso, durante sua longa ausência ela teria enfraquecido seu perfil no cenário político nacional.

"Hoje em dia, se você pergunta a qualquer garoto de 25 anos, ele diz: 'Ah, sim, aquela que sequestraram' – não mais do que isso", afirma o politólogo à DW, frisando que o país já está em outro debate, outra situação, e os focos da campanha são outros. "Hoje, a sociedade colombiana está pensando em temas de igualdade social, de luta contra a corrupção e de ordenamento territorial."

O combate à corrupção foi precisamente um aspecto que deu notoriedade a Betancourt no fim do século 20, quando criticou severamente figuras de destaque e rompeu com seu Partido Liberal, para fundar a primeira legenda ambientalista da Colômbia, o Partido Verde Oxigênio.

"Em termos políticos, ela teve em seu passado três bandeiras, que eram avançadas para a época. Em primeiro lugar, uma bandeira ambientalista; em segundo lugar, foi uma líder anticorrupção; e em terceiro lugar foi uma candidata que apoiava a busca de uma paz negociada", analisa Jorge Restrepo, diretor do Centro de Recursos para Análise de Conflitos (Cerac) e professor da Pontifícia Universidade Javeriana.

"Eu diria que ela tem uma grande vigência como vítima do conflito armado, tem uma grande autoridade moral", prossegue, acentuando que "é uma figura emblemática, valiosíssima para a reconciliação nacional, mais do que uma líder combativa, em termos ideológicos".

O diretor do Cerac concorda com Ávila em que o que mais preocupa os colombianos atualmente é a situação econômica e social e "embora o tema da paz esteja presente, não vai ser decisivo na campanha".

Ambos fazem notar que nesse ínterim outras figuras ocuparam os espaços e estimam que, nos poucos meses que faltam para as eleições, será muito difícil para Betancourt reverter essa situação. No entanto ela não se desligou dos acontecimentos nacionais e, em suas esporádicas visitas à Colômbia, não se absteve de opinar. Por exemplo: no pleito presidencial de 2018, deu abertamente respaldo a Gustavo Petro, que foi derrotado por Iván Duque.

A importância de ser mulher

Agora é a própria Betancourt quem busca a candidatura presidencial. "Creio que ela também sabe que será difícil ganhar, e que está buscando, antes, uma vice-presidência", observa Ariel Ávila. Ao mesmo tempo, ele reconhece a importância da gestão dela para forjar a Coalizão Centro Esperança.

"Ela vai desempenhar um papel-chave de articuladora, muito importante como engrenagem da coalizão de centro e como ponte para uma coalizão alternativa grande, num segundo turno", prevê.

De todo modo, a entrada dela na arena dá um novo rosto à disputa e poderia mobilizar o eleitorado feminino, com uma mensagem de igualdade de gênero. Nesse ponto, os analistas também concordam: um dos grandes trunfos de Betancourt é justamente o fato de ser mulher.

Uma mulher que Jorge Restrepo qualifica como "uma pessoa sem medos", como já era no passado. Vinte anos atrás, seu arrojo e sua maneira de fazer política sem rodeios não estiveram isentos de controvérsias. Mas o tempo também deixou marcas nela.

Para o professor da Universidade Javeriana, "Íngrid Betancourt, como líder política e como figura pública na Colômbia, é muito diferente hoje da que era antes do sequestro. Hoje a vejo como uma figura muito mais tranquila, conciliadora e emblemática das vítimas da violência."