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O Acordo de Paris para o Clima foi quebrado?

Alistair Walsh
9 de fevereiro de 2024

Por mais de um ano a temperatura média da Terra ultrapassou a marca de 1,5 ºC acima dos níveis pré-industriais. A situação é séria, porém (ainda) não é irreversível. E, de um modo ou outro, houve progressos desde 2015.

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Homem a cavalo, com socorristas ao fundo, nuvens de fumaça no céu
Incêndio florestal em Viña del Mar, Chile: mais provável devido às emissões carbônicas aceleradasFoto: Esteban Felix/AP/picture alliance

Pela primeira vez, desde que começaram os registros, por 12 meses consecutivos a média global das temperaturas da Terra esteve 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais. De fevereiro de 2023 a janeiro de 2024, as temperaturas médias foram 1,52ºC mais elevadas do que entre os anos de 1850 e 1900 – quando os humanos começaram a aquecer o planeta com grandes queimas de combustíveis fósseis e a emitir grandes volumes de gases causadores do efeito estufa.

Isso se expressou no janeiro mais quente já registrado, segundo o Copernicus Climate Change Service (C3S), da União Europeia. "É um marco significativo", observou Matt Patterson, pós-doutorando de física climática da Universidade de Oxford.

O pico se deveu, em parte, ao fenômeno climático El Niño, e espera-se que, assim que ele passe, nos próximos meses, o aquecimento global volte à marca ligeiramente abaixo de 1,5ºC. No entanto, as emissões carbônicas originárias dos combustíveis fósseis seguem sendo as principais responsáveis.

Quer dizer que a humanidade violou o Acordo de Paris?

Não exatamente, mas quase. Em 2015, em conferência na capital da França, quase todos os países concordaram em manter o aumento médio da temperatura global, em relação à era pré-industrial, bem abaixo de 2ºC; de preferência mirando 1,5ºC.

Esse limite foi estipulado como linha de defesa para evitar os efeitos mais extremos e irreversíveis da mudança climática. Excedê-lo, ameaça causar danos graves aos sistemas globais, às populações humanas e ao meio ambiente, à medida que tempestades, ondas de calor e secas se tornam mais extremas.

A mudança já agravou os eventos meteorológicos extremos. Segundo especialistas em distribuição meteorológica, em 2023 o aquecimento planetário tornou muito mais provável a temporada mais extrema de incêndios florestais do Canadá; e piorou tanto a seca sem precedentes no Chifre da África, quanto as inundações devastadoras na Líbia. As ondas de calor fatais na Europa, na América do Norte e na China teriam sido praticamente impossíveis sem a influência humana.

O relatório mais recente do C3S mostra que a alta das temperaturas médias excedeu o limite de 1,5ºC ao longo de 12 meses. Porém, o Acordo de Paris se refere a um período mais longo. Alguns anos podem romper a marca, contanto que outros fiquem abaixo, pois o importante é a média. Assim, segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) das Nações Unidas, só se considerará o limite ultrapassado se isso se mantiver ao longo de 20 anos.

Ainda assim, o fato é que a humanidade está rapidamente perdendo a oportunidade de agir. "Ter atingido esse nível em por um período tão contínuo, e isso um tanto abruptamente, exige mais do que nunca ações atenuantes para abandonar gradativamente os combustíveis fósseis", comenta a cientista-chefe do C3S, Francesca Guglielmo.

Os humanos ainda têm opções para limitar o aquecimento a 1,5ºC?

O IPCC estima que, na velocidade atual, o aquecimento global deve chegar a 1,5ºC entre os anos 2030 e 2052. Mas se a humanidade parar rapidamente de queimar combustíveis fósseis e reduzir as emissões de CO2 à metade até 2030, as metas de Paris ainda podem ser cumpridas.

Isso exigiria a conversão dos sistemas de energia, economias, agricultura e transportes, além do fim do desmatamento. Envolveria ainda proteger os sumidouros de carbono, como as florestas e zonas úmidas, e empregar em ampla escala as tecnologias de captura e armazenamento carbônico.

"A menos que as emissões globais sejam urgentemente reduzidas a zero, o mundo em breve vai ultrapassar os limites estipulados pelo acordo de Paris", reforça Joeri Rogelj, professor de ciências e políticas do clima do Imperial College London.

Apesar de tudo, a humanidade já fez grandes progressos em desacelerar a mudança climática. Energias renováveis e outras tecnologias verdes vão se expandindo rapidamente e ficando mais baratas. E, antes de Paris, o mundo estava caminhando para um potencialmente catastrófico aquecimento de 3,5ºC até 2100. Graças às políticas climáticas governamentais, agora essa perspectiva é de 2,5ºC a 2,9ºC. Contudo, é preciso fazer muito mais para se manter aquém dos limites de Paris.

Permanecer abaixo de 1,5ºC também não significa que a humanidade escapará de todos os efeitos das mudanças climáticas, como meteorologia extrema e problemas na cadeia de alimentação, lembram cientistas. Porém, dá ao planeta uma chance muito melhor de evitar os efeitos climáticos mais extremos e irreversíveis, que são bem mais prováveis com níveis mais altos de aquecimento.