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Nova tensão militar com Ucrânia não gera apoio entre russos

Emily Sherwin
11 de dezembro de 2021

Aumento das tropas russas na fronteira com país vizinho não é só mensagem a Kiev e parceiros da Otan. Demonstração de força de Putin mira também público doméstico. Mas eleitores não parecem querer mais um conflito.

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Poucas pessoas andando numa rua de pedestres
Arredores da estação Kievskaya de Moscou: para maioria na capital russa, as tensões crescentes na fronteira parecem distantesFoto: Emily Sherwin/DW

A estação de metrô Kievskaya de Moscou é decorada com murais elaborados que mostram como os ucranianos ingressaram na União Soviética. É uma celebração de unidade. Mas hoje Moscou e Kiev parecem mais divididas do que nunca.

Recentemente, oficiais de inteligência ocidentais advertiram que a Rússia estacionou cerca de 70 mil soldados perto de sua fronteira com a Ucrânia e que o presidente russo, Vladimir Putin, pode estar planejando uma invasão no início do próximo ano.

Do lado de fora da estação Kievskaya  nome que faz referência a Kiev , os passageiros param para tomar ar fresco ou fumar um cigarro. Para a maioria das pessoas na capital russa, as tensões crescentes na fronteira parecem muito distantes.

"Nós, russos, não queremos guerra. Ninguém quer. Os ucranianos são o mesmo povo que nós, um povo eslavo, nossos amigos", diz uma jovem à DW, puxando o xale da cabeça com mais força para se proteger do frio. "Mas tudo é decidido por políticos lá de cima – sem nós."

Putin passa diante de tropa de soldados enfileirados em trajes negros
Putin foi à Crimeia anexada neste ano para as celebrações do Dia da Unidade Nacional da RússiaFoto: Mikhail Metzel/AP/picture alliance

Em 2014, a Rússia anexou a península ucraniana da Crimeia. Moscou também tem apoiado separatistas que lutam no leste da Ucrânia – embora as autoridades russas neguem envolvimento direto. Mais de 14 mil pessoas morreram no conflito.

"Durante a União Soviética, todos nós vivíamos muito bem", afirma um homem mais velho com um chapéu de pele, acrescentando que tem raízes bielorrussas e polonesas. "Depois, tudo desmoronou."

Uma história complicada

A ideia de que ucranianos e russos são "nações irmãs" é comum na Rússia. Isso torna o conflito em curso no leste da Ucrânia emocional para muitos – diferente de outras guerras travadas entre grupos étnicos no espaço pós-soviético, como a recente luta por Nagorno-Karabakh, por exemplo.

Hoje, pelo menos 2 milhões de ucranianos vivem na Rússia, e existem centenas de laços familiares entre as duas nações. Muitos russos realmente veem Kiev como o local de nascimento da nação russa, já que a capital ucraniana de hoje era o centro de Kyivan Rus, uma federação medieval de povos eslavos.

Em um ensaio publicado em julho, o presidente russo, Vladimir Putin, chegou ao ponto de argumentar que russos e ucranianos são "um só povo" – e que é o Ocidente que está separando as nações.

Linhas vermelhas de Moscou

Agora, Putin está usando seus militares para expressar uma renovada fixação pela Ucrânia – o recente aumento de tropas é o segundo neste ano. muitos analistas russos argumentam que o conflito armado sobre a Ucrânia se tornou para Putin uma estratégia, não algo que resulta de um sentimento difuso de nostalgia pela unidade do passado.

Pessoas diante de mural
Mural "Festivais populares em Kiev" na estação de metrô KievskayaFoto: Natalia Kolesnikova/AFP/Getty Images

"O Kremlin acredita que o Ocidente ignora completamente os interesses russos quando a Rússia usa a linguagem da diplomacia", opina Dmitri Trenin, chefe do think tank Carnegie Moscow Center. "Parece que agora a Rússia está usando instrumentos militares como um meio para fazer a diplomacia avançar."

O atual aumento de tropas na fronteira com a Ucrânia e outro no início deste ano levaram Putin a se reunir com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden. Após uma cúpula bilateral em junho, o presidente russo falou esta semana com seu homólogo americano por meio de videoconferência.

Putin insistiu que a adesão da Ucrânia à aliança militar da Otan cruzaria uma "linha vermelha" para a Rússia e está exigindo garantias de que a Otan não se expandirá mais para o leste – inclusive permitindo a adesão à Ucrânia. Tanto Trenin quanto o analista político Konstantin Kalachev argumentam que o presidente russo vê a Otan como uma ameaça real – especialmente com os recentes exercícios militares da Otan e dos EUA no Mar Negro, perto da península anexada da Crimeia, que a Rússia considera seu território.

“Putin quer duas coisas: estabilidade e soberania”, diz Kalachev, explicando que vê a Otan como uma ameaça para ambas.

Nova Crimeia?

Mas os movimentos militares da Rússia perto da Ucrânia também visam um público doméstico, na opinião do analista político e ex-redator de discursos de Putin, Abbas Gallyamov. Afinal, a anexação da península da Crimeia em 2014 levou a um grande aumento na popularidade de Vladimir Putin (88% na época). Gallyamov diz que a situação atual mostra que Putin não quer que seus simpatizantes pensem que ele "não é mais quem costumava ser" ou que mostre fraqueza em relação à Ucrânia.

Mas o analista não acredita que uma invasão em grande escala da vizinha Ucrânia seria uma atitude popular entre os russos.

Uma invasão russa na Ucrânia?

"Os russos já sabem que vitórias internacionais não levam apenas a um sentimento de orgulho nacional, mas também são seguidas por repressão em casa e queda dos padrões de vida." A invasão da Crimeia há seis anos isolou a Rússia internacionalmente, levando a sanções dos EUA e da UE e relações tensas com o Ocidente.

Estabilidade e soberania

Stepan Goncharov, sociólogo do Levada Center, uma agência de pesquisas independente, argumenta que, para a maioria dos russos, os últimos anos já os fizeram sentir como se estivessem vivendo em um "estado de guerra".

"Essa sensação de tensão constante começou a pesar nas pessoas. Antes, o tema [da guerra] era algo novo, ele retornava um senti mento de pertencer a um império, parte de uma grande e forte nação", afirma Goncharov em referência ao conflito na Ucrânia e ao envolvimento da Rússia na guerra na Síria. "Agora, as pessoas preferem viver em um país menos ambicioso [internacionalmente] e mais generoso com seus cidadãos, um país mais estável, previsível e economicamente próspero."