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"Moro no Brasil": ritual de amor à música brasileira

Paulo Chagas21 de fevereiro de 2002

Rodado em Pernambuco, Salvador e Rio de Janeiro, o filme do diretor finlandês Mika Kaurismäki é um olhar apaixonado sobre a diversidade de tradições da música brasileira.

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Tavares da Gaita, personagem de Moro no Brasil

"O Brasil que se conhece na Europa através da mídia, é, infelizmente, o país do crime e da violência", disse o diretor finlandês Mika Kaurismäki, na pré-estréia do seu filme "Moro no Brasil", na quarta-feira (20), em Colônia. Por isso ele quis mostrar o lado bonito de um outro país que conheceu em suas inúmeras viagens pelo Brasil, a alegria de viver da gente simples e sofrida, e que se exprime, sobretudo, através da música.

A música tem um importante papel na vida do brasileiro, constata Mika Kaurismäki: é um ritual de sobrevivência, um instrumento de auto-ajuda e respeito próprio. A música exprime, portanto, a alegria da nossa gente. Ou seja, temos aqui todos os ingredientes dos estereótipos que caracterizam o Brasil aos olhos dos europeus: o país dos que sofrem e caem no samba, do carnaval, das belas mulatas e do sexo farto e ao alcance dos turistas.

"Moro no Brasil", entretanto, revela uma certa sutileza ao abordar esta temática tão desgastada pelos chavões. Talvez, pelo fato de Mika Kaurismäki ter evitado es estrelas da música popular brasileira para buscar tradições e aspectos musicais pouco conhecidos pelos próprios brasileiros.

Maracatu rural e embolada

- "Moro no Brasil" começa em Helsinque, num dia de tempestade de inverno, mas logo pula para o sertão de Pernambuco, onde Mika nos revela a música dos índios Fulni-ô. Os cantos e danças indígenas, celebrados aos som de chocalhos e tambores, nos levam ao mundo rico e diversificado da música de Pernambuco: maracatus rurais e urbanos, banda de pífanos, frevo, afoxé, coco, forró, baião, xote, embolada, repentistas, etc.

Os músicos, dançarinos, produtores e construtores de instrumentos aparecem ao longo do filme para contar suas histórias, falar de si e de sua música, expor emoções, sempre acompanhados pela presença e a curiosidade de Mika, o narrador. Vez ou outra seu olhar se detém para admirar a beleza da paisagem - a natureza, o cenário urbano, o corpo e a expressão da pessoas.

De Pernambuco, a viagem nos leva ao Rio de Janeiro com uma escala em Salvador, onde Mika visita candomblés, (Afoxés Alafin Oyô e Oxum Pandá), uma banda de samba-reagge (Grupo Cultural Bagunçaco) e dá espaço para que Margareth Menezes fale das influências das religiões africanas. Margareth Menezes é uma das poucas artistas da mídia que aparece no filme.

Palácio do samba

- Chegando no Rio de Janeiro, "Moro no Brasil" mergulha no mundo do samba, visita o Palácio do Samba, a quadra da Mangueira, sobe o morro, infiltra-se no labirinto da favela. A miséria, aliás, está sempre presente mas a película não se preocupa em extrair lições das desigualdades sociais.

Ao lado da Velha Guarda da Mangueira, aparecem figuras carismáticas como Walter Alfaiate, Dona Zélia, Seu Jorge - um ex-menino de rua que descobriu na música uma saída, e a celebração apoteótica do Funk 'n Lata de Ivo Meirelles, síntese de música americana (rap) e bateria de escola de samba. Finalmente, Mika Kaurismäki revela que abriu um clube de música no Rio, e que resolveu morar na cidade.

Co-produção

- "Moro no Brasil" é uma co-produção de televisões e produtoras européias com a TV Cultura de São Paulo. O filme foi financiando, entre outros, com recursos brasileiros do Ministério da Cultura (Lei Rouant) e alemães da Fundação para o Cinema do estado da Renânia do Norte Vestfália.

Mika Kaurismäki, 47 anos, formou-se na Academia de Cinema de Munique. Visitou o Brasil pela primeira vez em 1988, tendo rodado aí o documentário Amazonas (1990). Seu documentário "Tigrero - Um Filme que Nunca foi Feito" (1994), ganhou o Prêmio Internacional da Crítica na Festival de Cinema de Berlim (Berlinale).