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SociedadeJapão

Japão propõe quatro dias de trabalho por semana

Julian Ryall de Tóquio
24 de junho de 2021

Em diretrizes econômicas recém-divulgadas, governo japonês recomenda que companhias permitam encurtar a jornada semanal em um dia. Vantagens iriam de impulso à economia e mais saúde até elevar a taxa de natalidade.

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Homem de terno adormecido em banco de estação de trem de Tóquio
Excesso de trabalho é motivo de doenças e até suicídio no JapãoFoto: Yoshikazu Tsuno/AFP

Famosos por sua diligência, os assalariados japoneses – e, cada vez mais, as assalariadas – deverão serão encorajados a reduzir o tempo que passam no ambiente de trabalho, como parte de uma iniciativa governamental para melhorar o equilíbrio entre vida privada e profissional no país.

As diretrizes anuais de política econômica do Japão, recentemente divulgadas, incluem novas recomendações para as empresas darem a seus funcionários a opção de trabalharem apenas quatro dias por semana, em vez dos usuais cinco.

A pandemia de covid-19 já acarretou enormes mudanças no modo como as corporações japonesas conduzem seus negócios, inclusive muitas rígidas e tradicionais. Agora, os líderes políticos esperam convencer as diretorias de que pode ser um benefício manter, mesmo após a crise sanitária, jornadas diárias flexíveis, trabalho à distância e outras mudanças.

Estratégia com muitas finalidades

Em sua descrição da campanha, Tóquio afirma que, graças à semana de quatro dias, companhias poderão manter pessoal capaz e experiente que talvez tivesse que se demitir por estar tentando formar uma família ou ter que cuidar de parentes mais idosos.

Outra vantagem seria encorajar mais empregados a investirem o tempo extra em melhorar seu nível educacional ou até fazer trabalhos paralelos, ao lado do emprego regular. Acima de tudo, espera-se que os cidadãos usem o dia livre para sair e gastar mais, assim impulsionando a economia.

As autoridades contam, ainda, proporcionar aos jovens mais tempo para se encontrarem, casar e ter filhos, minorando o o problema da queda de natalidade, que se agrava à medida que a população do Japão míngua e envelhece.

"O governo está realmente ansioso para que essa mudança de atitude se sedimente nas companhias japonesas", confirmou à DW Martin Schulz, chefe de política econômica da Unidade de Inteligência de Mercado Global da Fujitsu.

Os últimos governos da nação asiática têm experimentado diferentes táticas para reaquecer a economia nacional, mas a política fiscal impõe suas próprias prioridades, e ao Banco Central só sobraram ferramentas limitadas. Assim, a próxima abordagem é reformar os estilos de vida e trabalho de milhões de japoneses.

"Durante a pandemia, as companhias passaram a novos modos de operação e estão vendo um acréscimo gradual da produtividade", prossegue Schulz. "Elas deixam seus funcionários trabalharem de casa e remotamente, em escritórios-satélites ou em locações da clientela, o que para muitos pode ser bem mais conveniente e produtivo."

A vida na frente da profissão

A Fujitsu aproveitou a oportunidade para cortar pela metade sua área de escritórios na sede, em Tóquio, à medida que investe mais no trabalho remoto. "No futuro, alguns do meu departamento vão estar no escritório, mas será raro todos nós estarmos lá juntos, e esse espaço agora é principalmente para reuniões cara a cara, que não podem ser feitas de maneira remota", explica Schulz.

Há alguns entraves aos planos do governo, contudo, com o Japão já vivenciando escassez de mão de obra pelo fato de menos jovens estarem integrando a força de trabalho. Também se teme que as diretorias relutem em abandonar algumas das atitudes de negócios que, há gerações, têm servido tão bem à "Japão S.A." – mesmo havendo indicações de que as abordagens tradicionais são menos eficazes hoje do que eram no passado.

Os empregados, por sua vez, acham atraente a ideia de uma jornada semanal reduzida, mas também se preocupam com a redução de seus salários e acusações de não estarem inteiramente comprometidos com a empresa.

Junko Shigeno acaba de se formar em estudos comerciais e idiomas e recebeu diversas ofertas de emprego de grandes empresas. No entanto, optou por uma firma menor de tecnologia da informação, que fica mais longe de sua casa, por sentir que a "filosofia" empresarial combinava mais com ela.

"Pesquisei bastante sobre as companhias que me ofereceram uma vaga de tempo integral, e fiz questão de falar com quatro ou cinco empregados atuais de cada uma delas. Fiquei chocada quando uma das mulheres, a que perguntei sobre seu equilíbrio vida privada-profissional, simplesmente caiu em prantos."

Perigo de recaída

Uma das grandes questões para os jovens, atualmente, são as horas-extras não remuneradas, conhecidas como "serviço extra". A empresa escolhida por Shigeno prometeu que ela nunca fará mais de 15 horas-extras mensais. Outra em que foi entrevistada adiantou que ela deveria contar com cerca de 60 horas adicionais, todo mês.

A mídia do Japão noticia regularmente sobre jovens assalariados que ficam doentes em decorrência do trabalho excessivo, ou cometem suicídio devido ao estresse, no que se denomina karoshi. Uma conclusão frequente dos inquéritos é que os funcionários colapsaram após fazer mais de 100 horas-extras, por meses a fio.

"Isso não é para mim", assegura Shigeno. "Estou contente de trabalhar e aprender novas aptidões, mas também quero ter meu tempo próprio, ver minha família e amigos, e manter os meus hobbies. Isso é muito importante para mim, e é por que escolhi essa firma."

Para Schulz, da Fujitsu, a chave está no aumento de produtividade: "No último ano, os assalariados mostraram que não precisam estar fisicamente no escritório, cinco dias por semana e até tarde da noite, para se manter produtivos. O maior risco agora é algumas companhias recaírem no velho modo de funcionamento, insistindo que seu pessoal volte a vir para o local de trabalho o dia inteiro, todos os dias. Para as que não cometerem esse erro, o resultado é ambas as partes saírem ganhando."