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Ivermectina não reduz hospitalização por covid, diz estudo

31 de março de 2022

Pesquisa publicada em revista médica americana analisou dados de mais de 1,3 mil pacientes brasileiros infectados pelo coronavírus. "Não há realmente nenhum sinal de benefício da ivermectina", diz especialista.

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Caixa de ivermectina
Ivermectina é usada como vermífugoFoto: Almeida Aveledo/ZUMA Wire/picture alliance

Um estudo publicado nesta quarta-feira (30/03) na revista médica americana The New England Journal of Medicine aponta que o medicamento antiparasitário ivermectina, cujo uso foi incentivado pelo presidente Jair Bolsonaro para tratar a covid-19, não reduz o risco de hospitalização pela doença.

Para chegar à conclusão, o estudo acompanhou 1.358 pessoas infectadas pelo coronavírus no Brasil. Metade do grupo recebeu ivermectina, e a outra, placebo, ou seja, um comprimido sem o princípio ativo. 

"Em algum momento, será um desperdício de recursos continuar estudando uma abordagem pouco promissora. Não há realmente nenhum sinal de benefício", apontou David Boulware, especialista em doenças infecciosas da Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos.

Os cientistas já tinham revelado parte dos resultados do estudo em agosto do ano passado, em um evento virtual do National Institutes of Health dos EUA.

"Agora que as pessoas podem inteirar-se dos detalhes e dos dados, esperamos que isso desvie a maioria dos médicos da ivermectina para outras terapias", sublinhou Boulware.

Como foi a pesquisa 

No Brasil, os pesquisadores montaram um ensaio clínico conhecido como Together, em junho de 2020, para testar em pacientes com covid-19 uma série de medicamentos amplamente utilizados para outras doenças, incluindo a ivermectina.

Da amostra inicial de 10.467 pacientes ambulatoriais, cerca de 3,5 mil foram selecionados para o estudo. Dentre eles, 1.358 foram designados para o estudo da ivermectina, e 2.157 pacientes foram direcionados, de forma aleatória, para outros tratamentos.

A ivermectina foi administrada em 679 pacientes entre março e agosto de 2021. Cada um recebeu o medicamento ao longo de três dias. O restante do grupo recebeu placebo. Os pacientes estavam em estágios distintos da doença, mas o medicamento não foi eficaz nem mesmo entre os recém-diagnosticados. Os voluntários que tomaram ivermectina nos primeiros três dias após um teste positivo de coronavírus tiveram quadros piores do que os do grupo placebo.

Os resultados foram claros: tomar ivermectina não reduziu o risco de um paciente com covid-19 ser hospitalizado.

De onde vem a fama da ivermectina contra a covid-19

A ivermectina é utilizada há décadas contra infecções parasitárias. No início da pandemia, quando pesquisadores começaram a testar vários medicamentos antigos como possíveis tratamentos para a covid-19, experimentos em laboratórios sugeriram que a ivermectina poderia bloquear o coronavírus.

Alguns médicos começaram a prescrever o vermífugo para o tratamento da covid-19, apesar dos alertas contrários de entidades responsáveis pela aprovação.

Em dezembro de 2020, Andrew Hill, virologista da Universidade de Liverpool, no Reino Unido, estudou 23 ensaios clínicos com o medicamento e concluiu que ele parecia reduzir significativamente o risco de morte por covid-19. Depois disso, durante o segundo ano da pandemia, a ivermectina ganhou popularidade, apesar dos alertas de entidades de saúde.

Em março do ano passado, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou que a ivermectina não fosse utilizada no tratamento de pacientes com covid-19, independentemente do nível de gravidade ou da duração dos sintomas. Um mês antes, afarmacêutica americana Merck, empresa que desenvolveu a ivermectina nos anos 1980 e até hoje é a principal fabricante, havia afirmado que não existem evidências sobre a eficácia do medicamento contra a covid-19.

Mesmo assim, nos Estados Unidos, numa única semana de agosto, as companhias de seguro gastaram mais de 2,4 milhões de dólares em tratamentos com o medicamento.

Mais tarde veio à tona que a pesquisa de Andrew Hill, continha estudos com falhas e até mesmo um acusado de ser fraudulento. Meses depois, o pesquisador publicou uma revisão do trabalho, focada em estudos menos propensos a serem tendenciosos, na qual o benefício do medicamento tinha desaparecido.

Em abril do ano passado, a Justiça Federal em São Paulo proibiu que o governo de Jair Bolsonaro fizesse campanhas, em qualquer meio de comunicação, para promover o chamado "tratamento precoce" contra a covid-19, com medicamentos sem eficácia comprovada contra a doença, entre eles a ivermectina.

le/lf (Lusa, ots)