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Grécia procura respostas para a catástrofe

Florian Schmitz md
26 de julho de 2018

País está em estado de choque depois que incêndios nos arredores de Atenas mataram mais de 80 pessoas. Após período de luto, começa busca por culpados. Tragédia também pode ter consequências políticas.

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Devastação no vilarejo de Mati: mais de 80 mortos
Devastação no vilarejo de Mati: mais de 80 mortosFoto: Reuters/Eurokinissi /A. Nicolopoulos

Dia dois depois da catástrofe. O balanço é chocante: 84 mortos, mais de 200 feridos, incluindo crianças. O vilarejo de veraneio Mati, a leste de Atenas, não é mais habitável. Equipes de resgate acreditam que o número de vítimas ainda vai aumentar.

"É muito provável que ainda encontremos pessoas em casas aonde ainda não conseguimos chegar", diz um bombeiro.

Imagens de vilas e terrenos queimados dominam a internet. Pessoas desesperadas vagueiam incrédulas através dos campos em cinzas. Alguns procuram por parentes. Muitos perderam tudo.

Nesta sexta-feira, termina o luto de três dias declarado pelo primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras. Em um discurso na televisão, ele prometeu que todos receberão ajuda e que nenhuma pergunta ficará sem resposta – uma mensagem aos que, já na segunda-feira, iniciaram a busca pelos culpados. Muitos na Grécia interpretam as palavras do chefe de governo como censura.

"Por que não começar a discutir sobre responsabilidades já agora?" escreve um jornalista no Facebook.

Para a maioria das pessoas, ainda é hora de se concentrar na ajuda às vítimas. Já durante a catástrofe, cadeias de supermercados e lanchonetes forneceram água e comida de graça. Centenas de pessoas em toda a Grécia doaram alimentos, roupas e remédios. Há pedidos por doações de dinheiro e de sangue nas mídias sociais. Nos centros de ajuda organizados de forma improvisada, as mesas afundam sob o peso dos mantimentos doados. O país está em choque, mas não paralisado.

"Não podemos abandonar as pessoas nessa hora", diz uma mulher de 48 anos de Tessalônica.

Ela carrega duas sacolas com mantimentos para um pavilhão de feiras, depois de ter lido num jornal local que as doações deveriam ser entregues ali. Estes gestos de humanidade lembram a atitude com os refugiados nos anos de 2015 e 2016. Por experiência própria, os gregos têm pouca confiança no Estado, especialmente em situações em que a ajuda deve ser rápida e sem burocracia. Iniciativa própria não é aqui uma atitude de pura filantropia, mas um mecanismo de sobrevivência.

A partir de sexta-feira, o esclarecimento das causas estará em foco. O ministro grego da Ordem Pública, Nikos Toskas, no entanto, afirmou nesta quinta-feira que atos criminosos podem causado o incêndio na região de Mati.

"Há sérios indícios de mão criminosa e sinais significantes que sugerem um ato criminoso", disse Toskas. Sem dar maiores detalhes, o ministro acrescentou que foi encontrado um objeto suspeito em Mati.

Somente uma coisa é clara: o clima seco e as temperaturas em torno de 40 graus criaram condições ideais para o incêndio. Fortes rajadas de vento alimentaram as chamas e espalharam o fogo tão rápido que as equipe de resgate quase não conseguiram impedir o pior.

A suspeita de um incêndio criminoso não é nenhuma novidade. Não só na Grécia, mas também em países como Itália, Espanha e Portugal, incêndios são provocados para liberar terrenos em áreas protegidas para o mercado imobiliário. Também é possível que o incêndio tenha começado através de restos de cigarro descartados ou queima de lixo – mas no momento tudo é apenas especulação.

Só o bispo ortodoxo Amvrosios, de Kalavrita, no sul da Grécia, parecia saber exatamente quem foi o responsável pelo desastre na segunda-feira. Em seu blogue, ele publicou uma declaração em que descreve o incêndio como uma punição para o primeiro-ministro ateu, Alexis Tsipras.

Muitos gregos condenaram de forma atipicamente dura o religioso pela acusação. Até a própria Igreja Ortodoxa se distanciou de Amvrosios. Um jovem padre declarou publicamente: "Ele deveria finalmente calar a boca".

No momento, os políticos gregos se preocupam com o gerenciamento de crise. Mesmo o líder da oposição, Kyriakos Mitsotakis, se manteve reticente. Geralmente, ele não perde uma oportunidade para descreditar Tsipras. Eventos de luto, conversas com vítimas e com ajudantes: Mitsotakis tenta, depois de muitas lutas políticas perdidas, ganhar mais simpatia do eleitorado. Eleições parlamentares estão programadas para o próximo ano.

Nikos Sachinidis, chefe da Corporação Grega dos Bombeiros Voluntários e de Reflorestamento (Esepa), levantou graves acusações contra o governo grego, em uma entrevista ao jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung.

Sua organização é especializada em incêndios florestais. Mas uma lei de 2014 proíbe que o corpo de bombeiros voluntários intervenha por iniciativa própria. O combate a incêndios continua reservado aos bombeiros profissionais, que têm menos pessoas que o necessário, devido à crise. Sachinidis acredita que o desastre poderia ter sido menor com a ajuda de voluntários treinados.

Embora essa lei tenha entrado em vigor na época do antecessor de Tsipras e colega de partido de Mitsotakis, Antonis Samaras, isso pode se tornar um escândalo para o atual primeiro-ministro. Em agosto, chega ao fim o programa europeu de empréstimos, e Tsipras se esforça para fazer disso um trunfo político.

Ao mesmo tempo, o lento crescimento econômico é quase imperceptível para a maioria dos gregos. Muitos também o acusam de ter fechado o acordo que deu fim à disputa em torno do nome com a Macedônia em detrimento da história grega e contra a vontade do povo. O clima é tenso. E emoções pesam mais que os fatos. Os próximos dias mostrarão como o meio político reage à catástrofe. Uma coisa é certa: a Grécia está em modo de campanha eleitoral permanente, e a catástrofe terá consequências políticas.

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