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Fábrica de notícias falsas em ação no referendo da Itália

Christoph Ricking md
2 de dezembro de 2016

Movimento Cinco Estrelas lança notícias falsas nas mídias sociais, acusa portal jornalístico americano. Partido controverso pode influenciar referendo sobre reforma constitucional através de rede de desinformação.

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Comediante, blogueiro e político italiano Beppe Grillo (esq.) é líder do Movimento Cinco Estrelas
Comediante, blogueiro e político italiano Beppe Grillo (esq.) é líder do Movimento Cinco EstrelasFoto: Getty Images/AFP/G. Cacace

Para um grupo de adolescentes da cidade macedônia de Veles, a campanha eleitoral nos Estados Unidos foi um bom negócio. Os jovens entre 16 e 18 anos de idade criaram cerca de 150 sites imitando portais de notícias americanos. Os adolescentes ganharam dinheiro divulgando notícias falsas sobre Hillary Clinton. O fato foi noticiado, entre outros, pelo jornal britânico The Guardian.

Donald Trump e sua equipe de campanha não sabiam da ajuda adicional que recebiam da Macedônia. O mesmo não se pode dizer de caso semelhante na Itália. Segundo uma análise do portal jornalístico americano Buzzfeed, o populista Movimento Cinco Estrelas (M5S) opera toda uma rede de desinformação.

"Diferentemente de outros países que analisamos até agora, na Itália existe uma ligação direta entre um partido político e as notícias falsas", aponta Alberto Nardelli, jornalista e autor da análise da Buzzfeed. "Isso é algo verdadeiramente único. É como se Trump fosse dono dos sites macedônios de notícias falsas."

Neste domingo (04/12), os italianos vão votar em referendo sobre uma controversa emenda constitucional que, entre outras coisas, prevê a redução do Senado e mais poder ao partido mais forte.

O primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, argumenta que o país se tornará mais governável com a reforma. Críticos temem um enfraquecimento da divisão de poderes e dos freios e contrapesos entre as duas câmaras do Parlamento. Mas o referendo também é uma votação sobre o próprio governo de Renzi, já que o premiê anunciou sua renúncia no caso de vitória do "não".

Premiê italiano, Matteo Renzi
Premiê italiano, Matteo Renzi, ameaça renunciar, caso o "não" vença referendoFoto: picture-alliance/dpa/T. Barchielli

Milhões na onda populista

O Movimento Cinco Estrelas, que faz forte oposição a Renzi, surfa na mesma onda anti-establishment  dos defensores do Brexit no Reino Unido ou de Donald Trump. Fundado pelo comediante Beppe Grillo, o partido é considerado antieuropeu e pró-Rússia.

O Buzzfeed  afirma que a rede de desinformação do M5S é formada por blogs dos líderes do partido, como Beppe Grillo, e de vários defensores de teorias da conspiração, assim como por vários outros sites que supostamente publicam "notícias independentes".

Mas na verdade eles estão sob o controle da liderança do partido. Líderes da legenda, blogueiros e os supostos sites de notícias "independentes" compartilham notícias falsas entre si. Com isso, podem atingir uma audiência de milhões de leitores. Só a página do Facebook de Beppe Grillo tem quase 2 milhões de seguidores; um blogueiro que se chama TzeTze, cerca de 1,2 milhões, enquanto a página do Facebook do partido tem 900 mil seguidores.

Nas páginas da rede do M5S, o primeiro-ministro Renzi é vilipendiado com insultos e tiradas de ódio. Supostas notícias soam aventureiras: o presidente dos EUA, Barack Obama financiaria secretamente contrabandistas para trazer refugiados para a Europa ou planejaria derrubar o regime sírio para mergulhar a região no caos, impedindo que a China tenha acesso ao petróleo do país.

Democracia em perigo

Segundo a Buzzfeed, muitas das notícias citam supostas fontes russas. "Tudo isso cria um clima de conspiração", alerta Nardelli. "Cria um contexto em que as pessoas não confiam mais na mídia tradicional, porque constantemente recebem a mensagem de que estão sendo enganadas."

Em sua página no Facebook, Beppe Grillo chama a análise da Buzzfeed  de conspiração. É difícil saber se as eleições dos EUA ou o referendo sobre o Brexit teriam outro resultado sem as notícias falsas, e ninguém afirma que elas darão ao M5S destaque significativo durante o referendo na Itália.

"Não se trata de partidos políticos ou candidatos", ressalta Nardelli. "A preocupação é o tipo de democracia em que vivemos. O que está em jogo é menos este ou aquele resultado eleitoral e mais o processo democrático, que é influenciado pela falta de fatos."