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"Deixei a Rússia a pé para voltar a Berlim durante a guerra"

Juri Rescheto
9 de março de 2022

Desde que Moscou invadiu a Ucrânia, está quase impossível encontrar voos diretos entre a Rússia e a União Europeia. Mas algumas rotas ainda estão abertas, como descobriu o correspondente da DW na Rússia, Juri Rescheto.

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Em foto interna, homem de terno abraça mulher, com outras duas pessoas observando.
O correspondente da DW na Rússia, Juri Rescheto, se despede depois de o Kremlin obrigar o fechamento do escritório da DW em MoscouFoto: Juri Rescheto/DW

Clack! O carimbo vermelho de saída em meu passaporte abre o caminho para deixar a Federação Russa em direção à União Europeia (UE). Pouco antes da meia-noite, sou autorizado a sair do território russo. O jovem guarda de fronteira me dá um sorriso amigável. "Tenha uma boa viagem de volta para casa! Acho que você não pode mais voar", diz. Não, não podemos. Não diretamente, pelo menos. Mas podemos atravessar a pé.

Passamos por uma pequena barreira, e depois por um grande portão de ferro e sobre uma ponte rodeada por uma cerca. Um vento frio noturno me acompanha enquanto arrasto minhas duas malas por cima do rio Narva, que delimita a fronteira entre a cidade russa de Ivangorod e a cidade estoniana com o nome do rio. São 162 metros de terra de ninguém. À esquerda, uma faixa de veículos para caminhões; à direita, abaixo de mim, está a água escura. O castelo medieval de Narva, iluminado, brilha na margem oposta. Atrás de mim está um país cuja política medieval enfrenta a resistência de boa parte do mundo.

Uma caminhada de cinco minutos sobre a Ponte da Amizade me leva não apenas à outra margem, mas a outro mundo. A amizade que outrora existia entre a Rússia e a União Europeia não existe mais.

Sanções afetam viagens

Antes da travessia, fiz uma viagem de trem de dez horas de Moscou e São Petersburgo até a fronteira com a Estônia. Depois de uma noite em Narva, passarei mais quatro horas em um ônibus até a capital estoniana, Tallinn, e duas horas em um voo de lá para Berlim. Enquanto trabalhava como correspondente na Rússia, nos últimos sete anos, eu podia completar essa viagem em duas horas e meia com um voo direto de Moscou para Berlim. Desta vez, levou um dia e meio.

Homem passa com carrinho em praça com letreiro da cidade onde está escrito Narva.
Narva, que faz fronteira com a Rússia, é a terceira maior cidade da EstôniaFoto: Juri Rescheto/DW

A rota que fiz a pé através da fronteira não é a única maneira de deixar a Rússia. Ainda há voos disponíveis. No entanto, qualquer um que queira voar para o Ocidente nestes dias deve estar preparado para desembolsar muito dinheiro, e para esperar. Neste momento, os voos via Turquia, Emirados Árabes Unidos, Azerbaijão e Armênia são exorbitantemente caros, e mais procurados do que nunca. O espaço aéreo da UE está fechado para aviões russos, e o espaço aéreo russo está fechado para os aviões do Ocidente.

Há também riscos se você decidir voar. Algumas companhias aéreas russas não estão mais autorizadas a utilizar aviões alugados no Ocidente. Há, portanto, pelo menos um risco teórico de que os passageiros das companhias aéreas possam ficar presos no solo em um terceiro país se o avião fizer uma escala e for apreendido lá. A Airbus, sediada na Holanda, e a americana Boeing também suspenderam seu serviço de suporte técnico para aviões de propriedade de companhias aéreas russas.

Temores dos russos que ficam

Não há nenhum êxodo em massa da Rússia no momento. À luz das sanções impostas pelo Ocidente, não há muitas pessoas que possam sequer se dar ao luxo de deixar o país, de qualquer forma. Nem mesmo temporariamente, porque ninguém sabe o que vai acontecer em seguida. Há rumores de que algumas estrelas do pop famosas fugiram do país. Algumas delas criticaram publicamente o ataque russo à Ucrânia, e há rumores de que elas têm medo de ser alvo dos serviços de segurança.

Foto externa mostra ponte com carros parados sobre ela.
A Ponte da Amizade conecta a Rússia à Estônia sobre o rio NarvaFoto: Wikipedia

Muitas pessoas que permanecem na Rússia temem a alta da inflação, o aumento do desemprego e a piora dos padrões de vida. O rublo vem caindo há dias, e as taxas de juros estão subindo. Alguns analistas econômicos advertem que a economia russa pode encolher até 10% neste ano.

Mas em Narva, do outro lado da Ponte da Amizade, os estonianos também estão preocupados que sua situação econômica se agrave. Todos aqui estão falando sobre o preço da gasolina, ele vem subindo há dias.

E, na minha curta noite em um hotel estoniano em meio ao inverno europeu, não posso deixar de notar que a temperatura no meu quarto é consideravelmente mais baixa do que na Rússia. O gás é caro aqui.