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Brics tenta avançar em meio a rivalidades e divergências

Srinivas Mazumdaru fc
1 de setembro de 2017

Países-membros têm influência política e econômica, mas também são muito desiguais e divergem entre si com frequência, chegando até mesmo à rivalidade. Ainda assim, especialista vê avanços.

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Temer, Xi, Modi, Putin e Zuma durante encontro do Brics na Índia
Temer, Xi, Modi, Putin e Zuma (da esq. para dir.) participaram em 2016 da 8ª cúpula do Brics, na cidade indiana de BenaulimFoto: Reuters/D. Siddiqui

Os líderes dos países emergentes mais populosos e poderosos – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, o chamado grupo dos Brics – reúnem-se entre 3 e 5 de setembro na cidade de Xiamen, no sudeste da China, para sua nona cúpula. Estarão presentes os presidentes Xi Jinping, Michel Temer, Vladimir Putin, Jacob Zuma e o primeiro-ministro Narendra Modi.

Originalmente um termo cunhado por economistas que trabalham para o banco de investimento americano Goldman Sachs em 2001, o Bric (na época sem o 's' ) evoluiu para algo muito maior desde então. Ele virou um grupo formal em 2006 e se tornou Brics em 2011, após a inclusão da África do Sul.

Temer diz à televisão chinesa que Brics não está em declínio

Com mais de 40% da população mundial, espalhada por três continentes, 25% da área terrestre e mais de 20% do Produto Interno Bruto (PIB) global, o Brics é um ator influente nos assuntos mundiais.

"Desde sua formação, o Brics já avançou muito", diz o pesquisador Jagannath Panda, do Instituto de Estudos e Análise de Defesa, de Nova Déli. "O grupo fez um trabalho impressionante, especialmente em termos de promover a conscientização sobre questões de governança global, como mudanças climáticas, pobreza, desemprego e infraestrutura", afirma.

O grupo também criou pressão para a reforma de instituições financeiras internacionais, como o FMI e o Banco Mundial. "É um fato que, desde que o Brics foi criado, o poder de voto da Índia e da China melhoraram nessas instituições", afirma Panda.

Para muitos, a aliança representa os motores da expansão econômica do século 21 e uma ordem geopolítica e geoeconômica em evolução. Assim, a instituição de crédito criada pelo Brics – o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) – foi vista como um rival do Banco Mundial, uma instituição dominada pelos países ricos e com sede em Washington.

Problemas e desafios

Previsões diziam que os países do Brics iriam se transformar nos principais atores da economia mundial nas próximas décadas, superando a maioria das principais economias atuais, incluindo as do G7 (grupo das sete principais nações industrializadas).

Hoje, essas projeções parecem pouco convincentes diante da série de problemas e desafios políticos e econômicos que os cinco países enfrentam. O crescimento econômico de dois dígitos da China desacelerou para cerca de 6%. A segunda maior economia do mundo enfrenta uma série de problemas, incluindo o excesso de capacidade produtiva da indústria pesada, o boom imobiliário altamente especulativo e o elevado e generalizado endividamento corporativo.

A economia russa foi duramente atingida pela queda dos preços do petróleo e pelas sanções impostas pelo Ocidente devido à anexação da Crimeia e o envolvimento de Moscou no conflito na Ucrânia. Brasil e África do Sul enfrentam crises políticas e os efeitos dos baixos preços das commodities, que causaram um baque em suas economias.

Mesmo que a economia da Índia esteja se expandindo a um ritmo mais rápido, economistas dizem que o país está longe de criar empregos para os milhões de indianos que ingressam todos os anos no mercado de trabalho.

A maioria das economias do Brics também sofre com questões como corrupção e burocracia excessiva, que atuam como obstáculos para seu potencial de crescimento. E os países continuam mal classificados no ranking de facilidade de fazer negócios do Banco Mundial.

Para sinalizar confiança nas perspectivas do grupo, o banco Goldman Sachs, que cunhou o termo, lançou um Fundo Bric em 2006. Mas a instituição decidiu encerrá-lo, em novembro de 2015, devido ao mau desempenho.

Concorrentes estratégicos

Observadores ocidentais afirmam que as economias do Brics nunca tiveram muito em comum, e os interesses econômicos também divergem. Por exemplo, Rússia e Brasil são grandes produtores de energia, que se beneficiam de preços altos. Em contraste, a Índia é um grande importador de energia e prefere preços baixos. Se a China – que representa dois terços da produção econômica do grupo – for posta de lado, as relações comerciais entre os países-membros são muito limitadas.

Os cinco membros também compartilham poucos objetivos políticos ou de política externa. Além disso, China e Rússia desempenham um papel internacional muito maior e mais influente devido a seus assentos permanentes no Conselho de Segurança da ONU. Seus governos são considerados autoritários, enquanto os de Índia, Brasil e África do Sul são vistos como democráticos.

"Devido às incoerências entre os cinco membros do Brics, o desempenho geral do grupo é muito difícil de ser mesurado", afirma o analista Paul Kohlenberg, do Instituto Alemão para Política Internacional e Segurança (SWP). Ele acrescenta que, além de resultados econômicos desiguais, há também muita divergência política e até competição entre os países. "Em muitos contextos, os cinco países-membros, particularmente o triângulo formado por Rússia, Índia e China, veem-se como concorrentes estratégicos."

O ceticismo dos analistas decorre, em parte, da difícil relação entre China e Índia. Os dois países têm uma disputa de fronteira não resolvida, e seus laços são prejudicados por uma profunda desconfiança mútua. Pequim e Nova Déli concordaram recentemente em acabar com um impasse de mais de dois meses na disputada fronteira do Himalaia. Esse foi o confronto militar mais sério em décadas.

Plataforma para negociações

Apesar das tensões, analistas desses países dizem que a questão das diferenças entre as nações do Brics, particularmente entre a China e a Índia, tem sido exagerada. Panda reconhece que elas não têm muito em comum em termos de política externa, mas ressalva: "É isso que distingue o Brics".

"Mesmo que não haja semelhanças entre os países do Brics, eles decidiram se reunir para conversar sobre questões de governança e alcançar um consenso", afirma. Ele acrescenta que divisões e interesses divergentes também são comuns em outros fóruns globais. "No Brics não é diferente", diz.

Kohlenberg afirma que a China gostaria que o Brics se alinhasse cada vez mais com sua iniciativa One Belt, One Road, mais conhecida pelo nome de Nova Rota da Seda, um projeto de infraestrutura em países da Ásia, Europa e África. "Mas a Índia se recusou a se unir a essa iniciativa", constata. Já os esforços da Índia de tentar inserir o terrorismo oriundo do Paquistão na agenda do encontro em Xiamen foram bloqueados pelos chineses, o que piorou ainda mais a relação entre os dois países.

Ainda assim, "pode-se argumentar que uma função implícita do Brics – oferecer uma plataforma adicional para negociações para a manutenção de relações bilaterais pacíficas entre Índia, China e Rússia – tornou-se mais evidente e reconhecida", afirma Kohlenberg.