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MigraçãoAlemanha

Amor levou brasileiro de Buenos Aires a Berlim

22 de dezembro de 2021

Há seis anos na Alemanha, Rafael Rodrigo da Silva diz que tem saudades do sol do Brasil e conta que, com o marido, a comunicação é num português misturado com inglês, espanhol e algumas palavras de alemão.

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Rafael Rodrigo da Silva e seu marido, Jahn
Jahn e Rafael no dia do seu casamento na embaixada britânica de BerlimFoto: Privat

Contando assim, quase ninguém acredita — parece até enredo de filme. Rafael Rodrigo da Silva conheceu seu marido alemão num aplicativo gay de encontros, só que o encontro mesmo demorou quase um ano para acontecer. E não foi por falta de vontade. Mas 12 mil quilômetros e Oceano Atlântico estavam entre os dois, o brasileiro vivendo em Buenos Aires, e Jahn em Berlim.

Depois de 11 meses de relacionamento virtual, em janeiro de 2016 o brasileiro resolveu que passaria as férias na Europa. Os primeiros dias ele reservou para conhecer pessoalmente o namorado. Depois seguiu viagem, já que Jahn tinha uma viagem, a trabalho, para o Brasil. "Na minha volta a Buenos Aires, eu tinha uma conexão de dez horas no aeroporto de Guarulhos. Acredita que juntei toda a minha família para um almoço com o Jahn?", conta o brasileiro.

Sim, se parece enredo de filme, é desses com final feliz. Em maio Rafael se mudou definitivamente para a Alemanha. "O Jahn falou: vem para cá, vamos fazer um trial e ver o que acontece", recorda o brasileiro.

Em agosto, casaram-se. Como Jahn tem cidadania britânica, a cerimônia foi realizada na embaixada do Reino Unido em Berlim. Foi então o primeiro casamento homossexual masculino realizado pela instituição — antes, um casal de lésbicas havia dito o sim ali.

A demora para o encontro pessoal pode ter contribuído para que eles tivessem a certeza de que, enfim, combinavam. "Ficamos nos conhecendo por quase um ano", comenta Rafael.

Bagagens internacionais

Vivências internacionais nunca foram problemas para os dois. Paulistano, Rafael decidiu tentar a sorte em Buenos Aires tão logo terminou a faculdade. Na capital argentina, trabalhava numa empresa multinacional e fazia uma pós-graduação em artes visuais — e lá estava havia quase cinco anos quando o aplicativo de encontros fez seu coração bater mais forte.

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Histórias de imigração também não são inéditas em sua família. Uma de suas primas vive na Suécia, outra na Suíça.

Jahn nasceu em Munique mas, filho de pai britânico e mãe americana, já se sentia um pouco cidadão do mundo. Engajado em políticas públicas, chegou a ir diversas vezes para o Brasil antes mesmo de conhecer o hoje marido — aventava a possibilidade de montar uma organização não-governamental para fomentar questões ambientais no país e, por isso, já arranhava um pouco a língua portuguesa.

Cinco anos e meio depois do casamento, Rafael parece adaptado ao dia a dia em Berlim. OK, não a ponto de encarar o inverno todinho numa boa — neste fim de ano, decidiu alugar um apartamento em Lisboa por um mês para passar as festas, com Jahn, em temperaturas mais amenas.

Adaptação e discriminação

Se foi um aplicativo que uniu o casal, foi também nesse setor que o brasileiro encontrou oportunidade profissional. Ele trabalha no desenvolvimento de aplicativos, prestando serviços para duas empresas alemãs.

"Estamos para lançar um que deve ajudar terapeutas e pacientes a organizarem melhor os atendimentos em tempos de corona e terapia à distância", conta ele. O lançamento está previsto para 10 de janeiro.

Aos 31 anos, Rafael é um dos 144.120 brasileiros que hoje residem em solo alemão, conforme dados do Ministério das Relações Exteriores. O número coloca o país na oitava posição entre aqueles que mais recebem cidadãos do Brasil.

"Gosto de morar aqui porque sinto segurança financeira e pessoal. Nunca me senti inseguro na Alemanha. E isso me dá a sensação de ser mais livre, de poder dar uma volta à noite pela cidade, tirar fotos, estar com o celular sem medo [de ser assaltado], mesmo que seja num parque todo escuro", exemplifica.

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Ele diz que no Brasil nunca sofreu violência física por conta de sua orientação sexual, mas já passou por violência verbal. "Em Buenos Aires, minha sexualidade nunca foi uma questão, embora eu tenha passado por situações de xenofobia", recorda. "Na Alemanha, por sua vez, houve um infortúnio do destino comigo e com o Jahn."

"Estávamos voltando de uma festa e atravessando um atalho [subterrâneo]. Eram 4h e uns caras vieram correndo atrás de nós. Não sei o que eles queriam fazer. Só sei que nós corremos", relata. "Esse tipo de situação só aconteceu essa vez em minha vida e foi em Berlim. Fora isso, minha sexualidade nunca foi um problema."

Saudades do sol do Brasil

E a ideia é ficar para sempre na Alemanha? "Para sempre é muito tempo", diz. "Neste momento eu quero ficar na Alemanha, mas é neste momento. Porque a Alemanha, assim como a Argentina, me recebeu super bem. Não tive problemas para me adaptar, essas coisas. Sempre consegui trabalho, sempre me senti bem."

Ele diz que sente falta de três coisas: família, comida e sol. "Sol, muito sol", repete. "Comida eu encontro algumas coisas, mas parece que não têm o mesmo gosto. Eu amo coxinha, amo esfirra, essas coisas que a gente tem em todo lugar no Brasil. E mesmo quando a gente tenta fazer em casa, não é a mesma coisa. Sempre que vou ao Brasil, eu tenho uma overdose de comida brasileira."

Quanto ao idioma, bom, ainda não é 100% — e o fato de Jahn se comunicar bem em português acaba fazendo com que a língua mãe de Rafael seja a dominante em casa. "Quando nos conhecemos, o português dele era de um nível bem básico. Depois de um ano, ficou perfeito. Hoje ele não tem problema nenhum para se comunicar assim", avalia o brasileiro.

"No dia a dia temos o nosso próprio idioma, vou ser bem sincero. Como muitas vezes para ele é difícil se expressar em português, misturamos português com inglês, um pouco de espanhol, algumas palavras de alemão."