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AfD, o partido alemão de ultradireita, faz dez anos

6 de fevereiro de 2023

Representada em 15 das 16 câmaras estaduais, Alternativa para Alemanha estabeleceu-se por refletir a mentalidade de parte da população. Seu próximo objetivo é integrar um governo estadual.

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Logo da AfD
AfD conta com 80 mil membros, mais de 80% dos quais do sexo masculinoFoto: Rolf Vennenbernd/dpa/picture alliance

Do ponto de vista da Alternativa para a Alemanha (AfD), há muito para festejar em seu jubileu de dez anos: desde 2017, o partido de ultradireita está representado no Bundestag (câmara baixa do Parlamento), assim como em 15 das 16 câmaras estaduais. Segundo pesquisas de opinião, ele conta com a preferência de 13% do eleitorado alemão, e muito mais em alguns estados do leste do país.

Questionada pela DW, a copresidente da legenda Alice Weidel respondeu por escrito: "A AfD tornou-se uma figura permanente no sistema partidário alemão, no qual antes se sentia dolorosamente a falta de uma força decididamente liberal-conservadora."

"Extremista, antissemita, racista"

A fundação da AfD ocorreu em 6 de fevereiro de 2013, como um grupo de cidadãos de tendência direitista para quem os partidos nanicos de direita eram excessivamente extremos, e que haviam se desiludido com a União Democrata Cristã (CDU), então no governo.

De lá para cá, ela evolui de "quase um partido de professores" para "partido inteiramente de extrema direita", atualmente "com tons extremistas, antissemitas e racistas", afirma a politóloga Ursula Münch.

Em seus primórdios, a AfD era um grupo eurocrítico, que condenava severamente a política de resgate do euro da então chanceler federal Angela Merkel. Em setembro de 2012, havia sido criada a sua precursora, Wahlalternative 2013 (Alternativa Eleitoral).

A partir dela, o professor de Economia Bernd Lucke, o jornalista Konrad Adam e o então membro da CDU Alexander Gauland fundaram a Alternativa para a Alemanha. Desde o início, ela contava com três correntes: liberal econômica, nacional conservadora e populista de direita.

Dois dos três membros fundadores há muito lhe voltaram as costas, e a mudança de presidência é uma constante na AfD. Segundo Münch, trata-se "um partido majoritariamente em conflito, repetidamente forçado a travar lutas entre a liderança e a base".

Copresidente da AfD Alice Weidel
Copresidente da AfD Alice Weidel vê grandes chances para seu partidoFoto: Chris Emil Janßen/IMAGO

Radicalização a partir de 2015

A AfD se apresentou a princípio com um programa econômico liberal de mercado. Sua radicalização começou quando, a partir de 2015, centenas de milhares de migrantes acorreram para a Alemanha, buscando refúgio da guerra na Síria. Posteriormente o cofundador Gauland comentaria que essa época foi um "presente" para o partido.

O tom de oposição ao governo de Merkel foi ficando cada vez mais exasperado. A então chefe do partido, Frauke Petry, chegou a sugerir o uso de armas para impedir os refugiados de atravessarem a fronteira, se necessário. Há anos ela também deixou a AfD.

Em junho de 2018, Gauland, então líder da bancada parlamentar da legenda, relativizou a época do nacional-socialismo (1933-1945), que custou as vidas de 6 milhões de judeus. Num evento partidário, ele comentou que "Hitler e os nazistas não passam de um cocô de passarinho em mais de mil anos de bem-sucedida história alemã".

Na opinião de Ursula Münch, o sucesso dos populistas também se deve ao fato de que "tais afirmações radicais encontram ótima recepção em partes da população, no estilo: 'Não vão proibir a gente de dizer isso!'" Contudo, esse tipo de declarações colocou de alerta as autoridades alemãs de segurança.

O Departamento Federal de Proteção da Constituição (BfD), o serviço de inteligência doméstica da Alemanha, classificou a AfD como "caso de suspeita de extremismo de direita". Um subgrupo populista-nacionalista seu, denominado Der Flügel (A Ala), é atestadamente extremista de direita, segundo o BfD. Assim, seus integrantes são passíveis de observação pelo serviço secreto – ou seja, em princípio podem também ser empregados investigadores disfarçados e monitoração de conversas telefônicas.

Exasperada, a copresidente Weidel diz tratar-se aqui de "uma manifesta instrumentalização do serviço secreto doméstico para fins de política partidária". Segundo a politóloga Münch, entretanto, o fato é que a AfD "se tornou, de uma maneira geral, um partido de extrema direita".

Simpatias pela Rússia de Putin

Por ocasião do jubileu da AfD, o instituto de pesquisas de opinião Infratest Dimap consultou os alemães sobre o assunto: para três de cada quatro entrevistados, a AfD não se distancia o suficiente de posicionamentos de extrema direita.

Ela conta com 80 mil membros, mais de 80% dos quais do sexo masculino. O Partido Social-Democrata [SPD], o mais numeroso do país, tem cerca de 380 mil membros.

Em meados de 2020, uma pesquisa online representativa da Fundação Bertelsmann indicou que 29% do eleitorado da AfD defende pontos de vista da extrema direita. Xenofobia, antissemitismo e simpatia por regimes autoritários são significativamente mais disseminados entre eles do que entre os adeptos de outros grupos políticos.

Um exemplo é a Rússia. Apesar de, desde 24 de fevereiro de 2022, o país travar uma brutal guerra de agressão contra a Ucrânia, a copresidente Alice Weidel é contrária a que se submeta o presidente Vladimir Putin a um tribunal para crimes de guerra ou se imponham sanções a Moscou.

Desde o início da invasão, a AfD se pronunciou contra o fornecimento de armas para a Ucrânia, o que supostamente constituiria "promoção de guerra". Weidel classificou como "decisão desastrosa" o recente anúncio do envio de tanques de combate Leopard 2 para o país sob ataque.

O Infratest Dimap também perguntou a opinião dos seguidores da AfD sobre a guerra russa na Ucrânia. Sua enquente confirmou mais uma vez as diferenças políticas entre as duas metades do país: no Leste (ex-território da antiga República Democrática Alemã, sob regime comunista), 25% consideraram positivo a AfD mostar compreensão pelos pontos de vista russos; enquanto no Oeste essa porcentagem foi de apenas 13%.

Multidão vista de palco, em dia chuvoso, com Chancelaria Federal alemã ao fundo
Manifestação da AfD em outubro de 2022, em BerlimFoto: Finn Becker/xcitepress/imago images

De olho nos governos estaduais

Apesar de aspirar ao poder, a AfD nunca integrou um governo, e agora quer finalmente abandonar o papel oposicionista nos parlamentos. No nível federal, é algo que não deverá alcançar, mas considera ter boas chances nos estados do Leste, onde vem regularmente obtendo acima de 20% nos pleitos, sobretudo nas regiões rurais mais negligenciadas. Na Saxônia e na Turíngia, ela chega ser a legenda mais forte.

Nesses dois estados haverá eleições em 2024, assim como em Brandemburgo, igualmente no Leste. Alice Weidel fareja aqui uma chance: "A participação nas formações de governo será o próximo passo consequente", tendo como possível parceira de coalizão a CDU. No entanto, os conservadores descartaram esse tipo de coalizão, até mesmo em uma resolução aprovada em convenção partidária.

Isso não impede que, em certos diretórios estaduais democrata-cristãos, se questione, "cochichando ou em alto em bom som", o que, afinal de contas, "há de tão ruim assim na AfD". Caso se forme realmente uma coalizão AfD-CDU, porém "será um enorme conflito" para os conservadores, prevê a cientista política Münch.

Em 6 de fevereiro, a Alternativa para Alemanha celebrou seus dez anos de existência na Casa do Encontro de Königstein, nos arredores de Frankfurt. Uma ampla aliança social anunciou protestos contra os festejos, tachando a sigla de "uma grande ameaça para a democracia".

Na visão de Ursula Münch, contudo, o aniversário dos populistas de direita seria uma mostra da estabilidade da democracia alemã. O parlamentarismo nacional justamente não é o que esses e outros extremistas lhe imputam, "ou seja, um sistema elitista isolado", afirma a politóloga. Para ela, dez anos de AfD também são um atestado da "capacidade de transformação do nosso sistema partidário".