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Saúde de Cristina reforça incerteza sobre futuro do kirchnerismo

Marc Koch, de Buenos Aires (rc)8 de outubro de 2013

Após fracasso eleitoral e a três semanas de novo pleito, operação da presidente eleva dúvidas sobre a real capacidade da frente governista de, com sua líder debilitada, sobreviver no poder.

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A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, ao chegar à clínica onde foi operada em Buenos AiresFoto: picture-alliance/dpa

A Argentina está sendo governada de uma pequena mesa, precisamente em Olivos, um subúrbio nobre da capital Buenos Aires. Por trás dos altos muros de tijolos vermelhos, um novo conselho composto por quatro homens determina o destino do país. São eles o secretário de Estado, os chefes de Gabinete e da inteligência e, naturalmente, o filho da presidente Cristina Kirchner, Máximo. Ele não é exatamente um político, mas lidera a organização de jovens kirchneristas La Cámpora. A família, afinal, deve manter-se unida em tempos difíceis como este.

"Nós, assim como muitos funcionários dos ministérios, somos informados através dos portais na internet ou de notas oficiais do palácio presidencial e da clínica. Tudo está sendo controlado de uma pequena mesa em Olivos", reclamou um alto oficial do governo em condição de anonimato.

O sigilo em torno da doença de Cristina, que foi operada com sucesso nesta terça-feira (08/10) para a drenagem de um coágulo na cabeça, é determinado pelo mais alto escalão: a presidente ordenou pessoalmente que deve-se comunicar ao público apenas o necessário.

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Policiais vigiam hospital na capitalFoto: picture-alliance/dpa

Não se sabe exatamente quais poderes possui no momento o vice-presidente Amado Boudou. O artigo 88 da Constituição argentina diz que o vice deve tomar posse quando o chefe de governo não estiver apto a desempenhar suas funções, seja por problemas de saúde ou qualquer outro motivo. Boudou assinou na noite de segunda-feira um documento com conteúdo semelhante, mas ainda não está claro por quanto tempo ele deverá permanecer na Presidência ou até onde vão seus poderes.

O próprio Boudou parece não estar muito bem informado. Quando Cristina se encaminhava para o hospital, ele explicou, de maneira um tanto confusa, que tem tudo sob controle e que a presidente necessitaria apenas de um breve descanso. O vice é visto por muitos mais como um problema do que como uma solução.

Boudou enfrenta atualmente seis processos por corrupção e enriquecimento ilícito. Entre outras coisas, é acusado de estar envolvido em transações ilegais no processo de falência de uma gráfica estatal. "Os Kirchner devem de fato se preocupar com a ascensão de Boudou. Eles acabarão pagando um alto preço político por isso", especula a deputada opositora Gabriela Michetti.

Impacto na campanha eleitoral

A ausência de Cristina Kirchner a três semanas das eleições parlamentares pode trazer enormes prejuízos a seu partido. Sem o entusiasmo de sua líder, a Frente para La Victoria poderá sofrer um considerável retrocesso. Apenas a presidente tem a capacidade de mover as massas nos eventos de campanha – cuidadosamente planejados – de seu partido.

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O vice-presidente Amado Boudou enfrenta seis processos, por corrupção e enriquecimento ilícitoFoto: JUAN MABROMATA/AFP/Getty Images

Somente ela é capaz de liderar a claque da Cámpora. Nem mesmo Martín Insaurralde, principal candidato kirchnerista nas legislativas, está próximo de ter o talento retórico da líder carismática. Este é, sem dúvida, um quadro preocupante, após a derrota esmagadora da Frente nas eleições primárias de agosto.

No entanto, não significa necessariamente que a oposição consiga tirar proveito da situação. Seus candidatos terão que encontrar certo equilíbrio para atacar a política do governo sem fazer referências pessoais à presidente – o que deverá ser bastante complicado em uma sociedade em que os ataques e insultos pessoais são ferramentas tradicionais do jogo político.

Ainda assim, não se deve excluir a possibilidade de que um sentimento de "pena" em relação à doença da presidente possa atrair votos adicionais à sua legenda, no pleito do próximo dia 27 de outubro.

Já circulam, de qualquer modo, as primeiras especulações sobre um possível fim da era Kirchner – a família está na Presidência desde 2003. O mandato da presidente termina em dois anos, e quaisquer tentativas de realizar reformas constitucionais que possibilitariam sua reeleição se anunciam complicadas, já que o governo pode perder a maioria no Congresso nas eleições deste mês.

Não é a primeira vez que a já sexagenária presidente se afasta temporariamente do cargo em razão de sua saúde. Mas da pequena mesa do palácio presidencial ela jamais abriu mão.