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Volks deve enfrentar enxurrada de processos após escândalo

Peter Dahl (md)24 de setembro de 2015

Indignados com fraude de emissão de poluentes, dezenas de consumidores preparam ações judiciais contra a montadora. Além da empresa, revelações sobre o esquema podem abalar economia alemã como um todo, dizem analistas.

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Foto: picture-alliance/dpa/J. Stratenschulte

Enquanto detalhes continuam a aparecer sobre o esquema da Volkswagen para burlar as vistorias de emissões de poluentes, vem se tornando cada vez mais claro que o gigante alemão de automóveis terá que arcar com um ônus mais do que pesado pela fraude.

A Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA) alertou que a Volkswagen pode enfrentar multas de até 18 bilhões de dólares. Mas para alguns do outro lado do Atlântico, isso não será suficiente.

Um deles é Bob Rand, que comprou seu Passat movido a diesel no ano passado, atraído pelas emissões limpas e o baixo consumo de combustível. Ele disse à agência de notícias Reuters que gostou tanto do carro que convenceu seu filho e um amigo a também comprarem um. Hoje, os três representam apenas uma fração da traição sentida por quase 500 mil consumidores americanos, após a notícia das manipulações terem sido publicadas.

"A Volkswagen era alguém em que você podia confiar, por oferecer produtos de ponta e de qualidade, e agora você descobre que eles não têm vergonha de te enganar", reclamou Rand, em entrevista à Reuters. "Isso é provavelmente a pior coisa que uma empresa pode fazer, mentir na sua cara quando você está comprando dela um carro de 35 mil dólares."

'Incrível decepção'

Rand é agora um dos pelo menos três dezenas de consumidores nos EUA que pretendem participar de uma ação judicial conjunta contra a montadora. De acordo com o diário alemão Süddeutsche Zeitung e a emissora pública alemã NDR, 37 dessas ações conjuntas já foram recebidas pela Justiça americana. A lista inclui compradores privados e pelo menos um negociante de carros, e é provável que cresça, enquanto investigadores continuam vasculhando os arquivos da Volkswagen.

Steve Berman, sócio-gerente da firma de advocacia Hagens Berman LLP, sediada em Seattle, é um dos vários advogados que passaram os últimos dias falando com compradores descontentes de carros movidos a diesel da Volkswagen, como Rand, na esperança de convencê-los a se juntarem a uma ação contra a empresa.

Num vídeo postado no YouTube, Berman dá um forte argumento para espremer a Volks. "Que decepção incrível. As pessoas compraram esses carros porque eles eram [anunciados como] carros limpos, elas pagaram um preço por esses carros, porque eles eram [supostamente] carros limpos. Então, não só elas não receberam aquilo por que pagaram, mas esses carros estavam prejudicando o meio ambiente", afirma Berman no vídeo. Ele se refere às conclusões de que os chamados "carros limpos" a diesel da Volks na verdade emitem até 35 vezes mais do perigoso óxido de nitrogênio do que o permitido pelas leis dos EUA.

A carta

Uma carta descoberta nesta semana provavelmente vai jogar mais palha na fogueira ardente da indignação. O documento, datado de abril de 2015 e obtido pela Reuters, foi enviado pela Volkswagen of America para proprietários na Califórnia de Audis e Volks movidos a diesel, os informando sobre uma "ação de serviço de emissões" para os veículos deles.

Os proprietários também foram convidados a visitar seu revendedor local para uma atualização de software, destinada a garantir que as emissões de escape fossem "otimizadas e operadas de forma eficiente".

Mas, de acordo com a Reuters, a carta não mencionava o motivo da ação: "[satisfazer] reguladores do governo, que estão ficando cada vez mais céticos sobre a razão da discrepância entre resultados de emissões de vistorias e da poluição real dos carros a diesel da Volkswagen".

A medida era parte de um recall nacional e voluntário, de meses de duração, realizado sob concordância da California Air Resources Board e da EPA em dezembro de 2014, em que a Volkswagen insistira que iria "sanar" uma falha técnica que leva à discrepância. Olhando pelo espelho retrovisor, a carta sugere que esse foi apenas um dos muitos passos que a Volks deu para tentar despistar as autoridades dos EUA.

Mas os problemas da montadora vão muito além dos EUA. Apenas no lado norte da fronteira, no Canadá, a empresa pode esperar pelo menos mais duas ações judiciais, de acordo com o Süddeutsche Zeitung e a NDR.

A Comissão Australiana da Concorrência e do Consumidor (ACCC) também está cogitando mover ação legal, mas aguardando até que a Volkswagen informe se os 50 mil veículos a diesel vendidos no país desde 2009 foram equipados com o software malicioso.

Desilusão alemã

A dor pode ser ainda maior em casa, onde as revelações chocantes desferiram um golpe na psique do país. Durante décadas, o passado da Alemanha praticamente não permitia explosões públicas de orgulho nacional. Mas a indústria automobilística era uma exceção a essa regra não escrita. Audi, BMW, Mercedes e Volkswagen sintetizam a grandeza do país: trabalho duro e honesto, precisão e qualidade incomparáveis.

"Made in Germany" pode simplesmente ser o bem mais valioso do país. Mas muitos temem que as trapaças da Volks possam ter causado um dano irreparável a essa marca.

Nesta quarta-feira, vários líderes da indústria se esforçavam para se distanciar da má conduta da montadora. "Criticamos severamente qualquer forma de manipulação", destacou Ulrich Grillo, presidente da Confederação da Indústria Alemã (BDI), através de comunicado. "Made in Germany" ainda é sinônimo de "excelentes produtos", afirmou.

Enquanto isso, o ministro alemão dos Transportes, Alexander Dobrindt, lançou uma investigação abrangente sobre a Volkswagen. E na quarta-feira, o promotor público de Braunschweig disse que abriu uma investigação preliminar sobre o Grupo Volkswagen, que pode levar a uma ação legal.

Consequências imprevisíveis

No entanto, os bilhões de euros gastos em potenciais indenizações podem não ser a maior ameaça para a empresa sediada em Wolfsburg. Para a montadora icônica, que fez do slogan "Das Auto" um sinônimo da genialidade da engenharia alemã, o maior dano seria o arranhão irreparável em sua imagem.

Para a maior economia da Europa, os efeitos colaterais podem ser ainda maiores, adverte o economista-chefe do ING, Carsten Brzeski. "Se as vendas da Volkswagen na América do Norte afundarem nos próximos meses, isso não só terá um impacto sobre a empresa, mas também sobre a economia alemã como um todo", disse ele à Reuters.

O setor automotivo alemão empregava aproximadamente 775 mil pessoas em 2014. "Se as vendas de automóveis caírem, isso pode também atingir fornecedores e com, com eles, o conjunto da economia", avaliou Martin Gornig, especialista do setor automobilístico do Instituto Alemão para Pesquisa Econômica (DIW), de Berlim, em entrevista à Reuters. "É por isso que este escândalo não é uma coisa pequena. A economia alemã foi atingida em sua essência", disse Michael Huether, chefe do instituto econômico alemão IW.

Brzeski traçou um paralelo com outra crise que pairou sobre a Alemanha por anos: "De repente, a Volkswagen se tornou um risco maior para a economia alemã que a crise da dívida grega."