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Universidades de Kassel e Rondônia acertam parceria

Fernando Scheller11 de julho de 2005

Convênio para a criação de projetos de pesquisa em desenvolvimento sustentável na região amazônica tem por objetivo ensinar a população a extrair riquezas da floresta sem destruir a biodiversidade.

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Extrair sem destruir e agregar valor é o que o pequeno agricultor precisa aprenderFoto: AP

Criada em 1982, a Fundação Universidade Federal de Rondônia (Unir) tem uma meta bastante clara: trazer desenvolvimento sustentável para a Amazônia. Professores formados em outras regiões do país que optaram por ensinar em Rondônia enfrentaram muitas dificuldades iniciais – falta de infra-estrutura e verba reduzida para projetos, por exemplo –, mas encontraram um verdadeiro tesouro acadêmico: um inexplorado campo de pesquisa.

O cearense Júlio Militão e o carioca Artur Moret são exemplos de acadêmicos que apostaram nas potencialidades do Estado. "Rondônia é um laboratório vivo, uma das áreas de maior biodiversidade no mundo", afirma Militão. Preservar essa riqueza – e extrair o melhor resultado econômico dela, de olho na sustentabilidade e na preservação do meio de vida das comunidades amazônicas – tornou-se o principal objetivo dos profissionais da universidade.

Foi graças ao trabalho de controle do desenvolvimento da região que a Unir se aproximou da Universidade de Kassel (Unik), na Alemanha. A tentativa de evitar a instalação de grandes projetos de desenvolvimento, como hidrelétricas e gasodutos, recebeu o apoio dos pesquisadores de Kassel, que também levantam as bandeiras do trabalho comunitário e do uso sustentável de recursos naturais.

Após cinco anos de trabalho conjunto, o "casamento" entre as instituições foi oficializado num contrato de cooperação que deve resultar em projetos de pesquisa, intercâmbio acadêmico e na criação de programas de pós-graduação. A DW-WORLD aproveitou a assinatura do contrato para conversar com os professores Artur Moret e Júlio Militão, idealizadores da parceria.

DW-WORLD: Como surgiu a parceria entre Porto Velho e Kassel?

Julio Militao Brasilianische Redaktion, Artikel von Fernando Scheller, Lehrer aus Rondônia, Uni Kassel
Professor Júlio MilitãoFoto: Fscheller

Júlio Militão: O professor Artur desenvolve desde o ano 2000 um trabalho de resistência a grandes projetos de desenvolvimento na região amazônica (hidrelétricas, gasodutos, rodovias). Trabalhando com essa meta, ele conheceu profissionais da Universidade de Kassel e a relação se fortaleceu muito ao longo dos últimos cinco anos. No início deste ano, resolvemos que, dado o interesse de ambas as instituições, seria válido firmarmos um contrato oficial de cooperação, para que projetos de pesquisa de acadêmicos alemães e brasileiros pudessem ter acesso mais rápido a financiamento.

Como as parcerias serão efetivadas?

Militão: A efetivação das parcerias vai ocorrer por meio de projetos de pesquisa. Fica mais fácil conseguir verba quando há um projeto concreto apresentado. Ambas as universidades vão dar apoio logístico, orientar os pesquisadores. O dinheiro para as pesquisas pode vir tanto de instituições alemãs, como o DAAD, quanto de brasileiras, como a Capes.

Qual é o objetivo número um da parceria?

Artur Moret Brasilianische Redaktion, Artikel von Fernando Scheller, Lehrer aus Rondônia, Uni Kassel
Professor Artur MoretFoto: Fscheller

Artur Moret: Trabalhamos em três linhas. Primeiro, tentamos compreender os grandes projetos de desenvolvimento para a região amazônica; depois, compreendemos o seu objetivo; por fim, trabalhamos para criar resistência a esses projetos e buscamos a apresentação de alternativas a eles, como o trabalho com extração de óleos vegetais pelas comunidades.

O que está errado nesses "grandes projetos"?

Militão: O problema é que o homem não é o centro dos projetos, é apenas um detalhe. Nesses projetos, tenta-se usar o mesmo padrão de desenvolvimento para todo o Brasil. O deslocamento de pessoas e os custos sociais e ambientais são muito grandes. Acabam-se as obras, e as pessoas continuam lá. Qual foi a herança deixada pelos garimpeiros que foram à Amazônia em busca de riqueza, nos anos 80? Nenhuma, a não ser os filhos que foram deixados para trás. Atualmente, criamos resistência a dois grandes projetos: o gasoduto entre Urucu (AM) e Porto Velho (RO) e as usinas hidrelétricas ao longo do Rio Madeira.

Qual é o modelo proposto pela Unir?

Moret: Desenvolvimento tem de ser feito de dentro para fora. Tem de ser pautado na cultura, respeitar os costumes da região, os direitos do cidadão e a biodiversidade. Com a Universidade de Kassel e outros parceiros internacionais, ganhamos voz para trabalhar pelo desenvolvimento sustentável.

Como a Universidade de Rondônia pode lucrar com a parceria?

Moret: Certamente, com a criação da parceria, nossos professores virão a Kassel para buscar qualificação, seja por meio de estágios ou por programas de mestrado e doutorado. Mas não somos os primos pobres nesta parceria. Trata-se de uma troca de experiências, e há muito o que pesquisar em Rondônia. Quem quiser ir para lá também terá apoio, tentaremos conseguir dinheiro para pesquisa.

Como está o problema do desmatamento para o plantio de soja em Rondônia? É grave como no Mato Grosso (onde foi descoberto um esquema para legalizar desmatamentos)?

Landwirtschaft und Urwald in Brasilien
Com expansão da agricultura voltada para a exportação, desmatamento cresceFoto: AP

Moret: O Vale do Rio Guaporé, na região sudoeste de Rondônia, é uma das áreas de maior biodiversidade no mundo. Por todo o Estado, atualmente, é possível ver plantações no meio da floresta. São plantações de soja e também de girassol. Como a agricultura voltada para a exportação está crescendo, o pequeno agricultor acaba sendo expulso do campo para dar espaço aos latifúndios, que enriquecem duas ou três pessoas. Por isso, levantamos a bandeira do desenvolvimento sustentável, focado nas comunidades. Não adianta plantar para exportar, isso só concentra a riqueza.

Como é possível manter as pequenas propriedades?

Militão: Temos que introduzir novas culturas, adicionar tecnologia na extração sustentável das riquezas oferecidas pela floresta amazônica. Está sendo criado um grande projeto para o transporte de soja produzida no Mato Grosso pela Amazônia. Queremos criar resistência a esse projeto e priorizar o trabalho com as comunidades locais, que podem extrair da floresta substâncias como o óleo de capaíba. É algo simples de produzir e, no mercado internacional, um litro de óleo vegetal da floresta pode custar 6 ou 7 euros (cerca de 20 reais). Mas não adianta apenas extrair o produto, a comunidade tem de saber armazenar e agregar valor, senão o atravessador é quem vai ganhar dinheiro. Por isso, o papel da universidade é vital. Temos de unir o nosso conhecimento técnico ao prático das comunidades da Amazônia.