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A saga do champanhe

31 de dezembro de 2009

Originário da região francesa de Champagne, ele era um vinho "tranquilo". Fermentação em garrafa transformou-o em espumante explosivo e turvo. Há apenas 150 anos, o champanhe se tornou uma cristalina bebida de luxo.

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Foto: picture-alliance / Bildagentur Huber

O que seria do Réveillon sem o jorro de vinho espumante sincronizado com o primeiro segundo do ano novo? E que líquido banha, no pódio, o vencedor de uma corrida automobilística? Ou com que se batiza cada novo navio?

Só que um espumante não é igual ao outro. E o mais nobre e famoso é, sem dúvida, aquele que leva o nome da região francesa onde é fabricado: o champanhe – um nome que até nossos dias é sinônimo de luxo e prazer.

Champagner Landschaft 2
Plantação vinícola na ChampagneFoto: DW

"O champanhe se inventou a si mesmo"

Champagne é uma das menores regiões vinícolas da França, com apenas 33 mil hectares, e extremamente parcelada, entre 15 mil proprietários. Nela se produzem cerca de 5 mil marcas, das quais apenas poucas são conhecidas no mundo – especificamente, as que dispõem de um enorme orçamento para publicidade. Das grandes casas produtoras de vinho, só algumas ainda são propriedade familiar. Por outro lado, como o emprego de máquinas é proibido em Champagne, todas as uvas são colhidas a mão.

Como será que esse espumante produzido exclusivamente em Champagne conquistou a fama que tem? Na forma como o conhecemos – isto é, sem ser turvado por partículas de levedura e sem que, de cada duas garrafas, uma exploda – o champanhe não existe há muito mais de 150 anos.

Uma coisa já se pode antecipar: ao contrário do que afirmam certos gênios da propaganda, o célebre monge beneditino Dom Pérignon não foi o inventor da nobre bebida – embora tenha feito bastante pelo seu desenvolvimento. Na opinião da guia turística Aline Milley: "Dom Pérignon é um mito. O champanhe não tem, realmente, uma origem, nem inventores. O champanhe se inventou a si mesmo".

Os romanos e as cavas

Champagner Gerüttelt und gedreht - Champagner bleibt Ritualtrank für Feiertage
Cava da casa Taittinger, na ChampagneFoto: picture-alliance/ dpa

A história do champanhe começa com a conquista da Gália pelos romanos. Eles levaram o vinho para Champagne e, como subproduto da construção das cidades, foram criadas as primeiras grandes adegas. Como explica Jean-Pierre Redon, da casa Taittinger:

"No século 4º, para construir esta cidade [Reims], capital da província da Bélgica, chamada Durocortorum, necessitava-se de pedras. E essas se encontravam no subsolo, pois aqui toda a região é constituída de giz."

Foi em meados do século 13, ou seja, 700 anos após os romanos terem esburacado Reims como um queijo suíço, que os monges beneditinos tiveram a ideia de utilizar as grutas resultantes como cavas, para melhor envelhecer o vinho. Para facilitar o acesso, fizeram portas e cavaram passagens entre as adegas.

Onde estão as bolinhas?

Nos séculos 16 e 17, o vinho de Champagne era conhecido na corte francesa por sua qualidade, embora ainda não fosse efervescente. Aqui entra em cena Dom Pérignon, mestre de adega da abadia de Hautvillers a partir de 1668.

Ele foi o primeiro a empregar a técnica de assemblage, misturando diferentes tipos de vinho. E descobriu que era possível fabricar vinho branco a partir de uvas pretas, se as cascas fossem retiradas rápido o suficiente.

Porém, o champanhe ainda não "fazia bolinhas".

Cristalino e espumante

Devido à situação geográfica de Champagne, ao norte do país, o tempo esfria muito rápido no outono. Isso pode interromper a fermentação do mosto, antes que todo o açúcar se transforme em álcool. Na primavera, quando a temperatura sobe novamente, o processo é retomado e o dióxido de carbono resultante torna o vinho espumante.

Esse fato não chamou atenção até o século 18, pois o vinho fermentava em barris e o gás escapava. Mas em 1728, Luís 15 permitiu o transporte da bebida em garrafas. Foi então que o alto teor gasoso do champanhe se tornou perceptível, fazendo explodir as garrafas.

Isso passou a ter consequências avassaladoras para os vinicultores, que até meados do século seguinte chegaram a perder 50% de sua produção. Entretanto, os ingleses, que já apreciavam o vinho champanhês "tranquilo", se lançaram avidamente sobre a novidade vinda da França.

Champagner Produktion in Frankreich
Um 'pupitre de remuage' tradicionalFoto: DW

O próximo passo decisivo nessa evolução coube à Madame Barbe-Nicole Cliquot Ponsardin, uma negociante de visão. Seu mestre adegueiro, o alemão Anton von Müller, criou em 1813 um método para livrar o líquido do levedo. Para tal, desenvolveu os pupitres de remuage, onde as garrafas são mantidas com o gargalo para baixo e deslocadas a intervalos regulares.

E assim o champanhe se tornou a bebida cristalina e frisante que hoje conhecemos. E também um campeão de vendas. Enquanto em 1785 se vendiam centenas de milhares de garrafas, o volume de venda registrado em 1845 já era de 6,5 milhões.

Hoje o consumo é um múltiplo dessa cifra, sobretudo no fim do ano. A produção total de champanhe no ano passado foi de 300 milhões de garrafas. Segundo Redon, 65% das garrafas produzidas em um ano são abertas entre o Natal e o Ano Novo.

Autor: Günther Birkenstock / Augusto Valente
Revisão: Simone Lopes