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"Trump faria qualquer coisa para ganhar", diz biógrafa

Michael Knigge (ca)10 de setembro de 2015

Gwenda Blair afirma que, para entender o magnata como fenômeno político, é preciso examinar suas raízes familiares: "Todos eles são extremamente perseverantes e dispostos driblar regras e encontrar lacunas legais."

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USA Donald Trump in Phoenix
Foto: picture alliance/AP Photo/R. D. Franklin

Donald Trump lidera as pesquisas de intenção de voto nas primárias republicas e, desde que lançou sua pré-candidatura, vem sendo o centro das atenções na corrida à Casa Branca. Em entrevista à DW, Gwenda Blair, biógrafa do magnata, diz que a história familiar dele é essencial para compreender o seu sucesso.

Seu avô alemão, por exemplo, emigrou para os EUA em 1885 e fez dinheiro com restaurantes, que construiu em terras que não lhe pertenciam, conta Blair.

"Eles são realmente o tipo de gente que faria qualquer coisa para chegar à frente e ganhar", afirma a autora do livro Trumps: Three generations that built an empire (Trump: Três gerações que construíram um império, em tradução livre) e Donald Trump: Master Apprentice (Donald Trump: aprendiz-mestre).

Deutsche Welle: Por que você acha que as raízes alemães de Donald Trump são essenciais para a compreensão da pessoa que está liderando, atualmente, as primárias republicanas?

Gwenda Blair: Seu avô, Friedrich Drumpf, veio para os Estados Unidos aos 16 anos em 1885, no momento do ápice da imigração alemã. A sua família era da cidade de Kallstadt, vinicultores. A história do Donald Trump que conhecemos hoje começou com seu avô, que não quis ser nem vinicultor nem barbeiro, profissão para qual foi treinado.

Ele veio para Nova York e, depois de aprender inglês, foi para a costa oeste, administrou restaurantes, fez um pé de meio e voltou a Kallstadt, casou-se com uma vizinha e a trouxe para Nova York. Mas ela tinha muitas saudades de casa, de forma que ele voltou para Kallstadt e tentou se repatriar, já que havia se tornado cidadão americano.

Mas, intencionalmente ou não, ele deixou de fazer o serviço militar. Quando ele partiu da Alemanha, era jovem demais. Ao voltar, ele havia passado da idade somente por alguns meses – o que ele disse ter sido uma mera coincidência.

USA Autorin Gwenda Blair
Gwenda Blair escreveu dois livros sobre Donald TrumpFoto: Matthew W. Stolper

As autoridades alemãs, no entanto, afirmaram que esse não foi o caso e lhe recusaram a repatriação. Eles disseram que ele havia tentado escapar do serviço militar, expulsaram-no e o deportaram para o local de onde ele havia vindo, que era os EUA. E foi assim que os Trump acabaram se tornando definitivamente americanos, em vez de ser uma família alemã com um avô que havia passado alguns anos nos Estados Unidos.

Em sua opinião, que traços do avô e do pai se refletem em Donald Trump e na forma como ele conduz os seus negócios e a sua carreira política?

Eles são realmente o tipo de gente que faria qualquer coisa para chegar à frente e ganhar. Todos eles são extremamente perseverantes, nunca desistem e estão dispostos a ir até onde podem para driblar regras e encontrar lacunas legais.

O avô Trump construiu seus restaurantes em terras que ele não possuía. Era o momento da corrida do ouro no rio Klondike, era a época do Velho Oeste. Tudo era muito livre, muito rude, muitos homens solteiros tentando encontrar ouro desesperadamente – e prostitutas. E o restaurante do Trump avô tinha bebida, comida e acesso a mulheres. O estabelecimento era ladeado por pequenos cubículos com cortinas pesadas – os chamados cômodos privados para senhoras, que eram claramente vistas como prostitutas.

Seu restaurante não era nenhuma exceção no local, mas os negócios estavam certamente correndo bem. E, depois disso, ele voltou para a Alemanha e afirmou em seu pedido de repatriação que seria um homem quieto e que evitaria bares.

Seu filho Fred, que ganhou dinheiro com imóveis em bairros mais afastados de Nova York, era muito bom em encontrar lacunas legais. Quando estava construindo habitações com financiamento estatal, ele montou firmas de locação de máquinas, alugando então escavadeiras e caminhões da própria empresa a preços inflacionados e superfaturados. Isso não era ilegítimo, mas beirava a ilegalidade e tentava contornar a lei. Ele era muito bom nisso.

Donald, por sua vez, também mostrou grande habilidade em encontrar lacunas legais e driblar a legislação durante a construção das Trump Towers. Para a demolição do prédio que havia no lugar, ele empregou trabalhadores poloneses sem documentação legal, pagou-lhes salários muito baixos e os deixou dormir no local devido ao prazo apertado. Mais tarde, ele afirmou não ter notado que eles estavam em situação irregular, algo que não poderia ter-lhe escapado. Ele também é muito bom nisso.

Com uma experiência própria de imigração familiar, como você explica a postura antimigratória e a retórica virulenta de Trump contra os imigrantes?

Ele tem sido muito eficaz em descobrir quem é o seu público. Não estou certa de que isso pode ser chamado de um traço germânico, mas faz certamente parte de sua cultura familiar procurar saber quem é sua clientela.

O seu avô procurou saber quem eram os seus clientes ao abrir aqueles restaurantes no Klondike. O seu pai quis saber quem era o seu público quando construiu seus prédios residenciais nos bairros afastados de Nova York, o que não tinha nada a ver com o que associamos atualmente com Donald Trump. Eram moradias de renda média, mas ele acrescentava um toque extra que agradaria aos seus potenciais clientes, como um armário adicional, por exemplo. Ele era muito bom em marketing.

E Donald, por sua vez, tem sido muito bom em fazer marketing para quem ele decidiu ser seu público. Neste caso, a próxima eleição, trata-se de uma grande massa de alienados, descontentes e irados. Americanos que sentem que o seu país costumava ser grande e não é mais, e isso tem um culpado. Eles querem alguém que conserte isso e lhes dê o respeito e a prosperidade que pensam merecer.

E Trump tem sido muito hábil em captar essa massa de pessoas iradas e em se posicionar como campeão e deixar claro para eles que ele vai se colocar contra qualquer coisa que estiver no caminho deles – não importa se sejam os imigrantes, um famoso herói de guerra como John McCain, alguém como a apresentadora da rede Fox Megan Kelly ou um gestor de fundos hedge. Assim, ir atrás dos imigrantes é um alvo fácil de acertar quando ele tenta apelar para a massa de eleitores nos EUA, brancos em sua maioria, que se sentem deixados para trás.

Ele não se sente incomodado com o fato de estar traindo a sua própria história familiar com sua posição sobre a imigração?

Eu não acho que ele jamais tenha ficado incomodado com contradições, que têm confundido, obviamente, pessoas observando a corrida para as primárias. Politicamente, ele é uma raposa velha, e não acho que isso seja de importância para ele. Antes, ele era um democrata, mas agora vai ser um republicano. Agora, ele é conservador, mas ele costumava ser um liberal. Ele costumava defender o direito ao aborto, mas agora ele está retrocedendo nessa questão. Antes, ele era a favor de uma reforma da imigração, agora, ele é contra. Ele vai para frente e para trás de forma muito fluida. Mas acho que isso é a menor das preocupações.