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Terrorismo: o veneno que paralisa a economia mundial

Neusa Soliz6 de setembro de 2002

Atentados de setembro de 2001 não provocaram crise, mas a agravaram, causaram graves prejuízos e mudaram alguns setores. Teme-se agora que novos atentados na data fatídica empurrem de vez a economia para uma recessão.

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Aviação e turismo, dois ramos econômicos vítimas da ação da Al Qaeda nos EUAFoto: AP

Os atentados de 11 de setembro de 2001 agiram sobre o complicado organismo da economia mundial como um veneno de ação prolongada e efeito paralisante. A queda do World Trade Center representou um marco decisivo também para a economia. Desapareceram tanto os dividendos da paz, uma vez encerrada a Guerra Fria, como a crença no progresso, de que era possível continuar crescendo indefinidamente e sem crises. Se o conflito leste-oeste entrou para os livros de história, o conflito norte-sul está mais presente do que nunca.

Ao voltar-se contra o centro do sistema social e da economia capitalista, o ataque da organização terrorista Al Qaeda a Nova York e Washington revelou a fragilidade a que se expõe uma civilização baseada na alta tecnologia. O choque político e psicológico partiu do Ground Zero como uma secessão de ondas após um terremoto e calou fundo. Se as conseqüências econômicas indiretas, de médio e longo prazo foram relativamente graves, as diretas foram limitadas.

Os atentados nas duas metrópoles americanas causaram prejuízos da ordem de 40 bilhões de dólares, segundo os últimos cálculos. Maiores foram os danos causados pelo fortíssimo terremoto em Kobe, no Japão, em 1995, com seus 6500 mortos e 200 mil casas destruídas. No entanto, uma catástrofe natural não é o mesmo que um atentado habilmente planejado e encenado.

  • Aviação
- A aviação civil foi o ramo imediatamente afetado, com o fechamento de aeroportos, cancelamento de vôos e, depois, com a queda do número de passageiros em função da mudança de comportamento das pessoas, que passaram a preferir outros meios de transporte. A falência de algumas companhias aéreas, a começar pelas norte-americanas, contudo, não pode ser atribuída exclusivamente aos atentados, pois o setor já dava mostras de fraqueza, em meio à acirrada concorrência.
  • Turismo
  • - O turismo mundial teve uma queda de 1,3% no ano passado. As regiões mais afetadas foram os países árabes, Israel (-50%) e os Estados Unidos (-12%). Um ano após os atentados, o número de passageiros aéreos voltou a normalizar-se, pelo menos na Europa e na Ásia. A catástrofe, porém, deixou rastros no céu sobre os Estados Unidos, onde as companhias aéreas ainda não se recuperaram. O turismo também continua às voltas com problemas, embora se trate mais das conseqüências do desaquecimento da conjuntura, do que propriamente dos atentados. Por outro lado, pode-se argumentar que os atentados retardaram a recuperação da conjuntura, aguardada para 2002. Ao mesmo tempo, provocaram insegurança, o que também afetou o consumo e a disposição a gastar em férias e lazer, os motores do turismo.
  • Seguros
  • - O que mudou consideravelmente foi todo o complexo de seguros. As companhias, que já tinham a intenção de aumentar os prêmios, aproveitaram a ocasião para reavaliar os riscos e reorganizar o sistema. Se a maioria dos riscos era calculável, o 11 de setembro abriu a dimensão do imprevisível e incomensurável para o ramo que opera com calculadoras e hipóteses que se traduzem em números. Uma nova base de cálculo para os seguros representou um pesado ônus para os clientes, as companhias aéreas e a indústria em geral, além de excluir danos causados por ataques terroristas.

    O Estado teve que assumir temporariamente tais riscos. As companhias de seguro, por sua vez, não só já se recuperaram do baque, como apresentam altos lucros em seus balancetes. A Münchener Rück, maior resseguradora do mundo, aumentou sua arrecadação em 20,5% no primeiro trimestre de 2002, depois de cobrar 20% a mais por suas apólices. A companhia alemã, mais conhecida mundialmente como Munich Re, teve um prejuízo de 2,1 bilhões de dólares com os atentados.

    A alegria de uns é a desgraça de outros. A indústria química alemã, por exemplo, está pagando prêmios até 100% mais altos, para assegurar instalações consideradas "sensíveis", isto é, mais sujeitas ou expostas a atentados. Já o setor de segurança tem feito bons negócios com a crescente necessidade de proteção. Desde os simples serviços de vigilância e controle até os sistemas eletrônicos de reconhecimento de pessoas saíram lucrando. Não se esquecendo dos fabricantes de dispositivos para aumentar a segurança nas aeronaves e aeroportos.

    Política econômica já "gastou a munição" e não tem como reagir

    As conseqüências mais graves dos acontecimentos em Nova York e Washington, contudo, só se notam com um olhar mais profundo. Ao diminuir consideravelmente os juros, o Federal Reserve e, em menor escala, o Banco Central Europeu, interviram maciçamente nos mercados financeiros. Ao mesmo tempo, o governo em Washington mudou sua política orçamentária, injetando mais de 100 bilhões de dólares na economia, a fim de evitar uma recessão. Diante dos gastos armamentistas que aumentaram de forma exorbitante com a cruzada contra o terrorismo mundial, voltando a encher os cofres da indústria bélica, está praticamente encerrada a longa fase de diminuição de impostos nos EUA e de superávit orçamentário.

    "As duas reações – a diminuição das taxas dos juros-guia e a nova política de endividamento – limitaram bastante a margem de ação para qualquer ação política futura", avalia Michael Hüther, especialista do Deka Bank, de Frankfurt. Já os economistas do Deutsche Bank estimam em mais de 200 bilhões de dólares o déficit orçamentário nos EUA este ano, com tendência crescente em 2003. Além disso, os Estados Unidos estão com um buraco gigantesco na balança de pagamentos, da ordem de 400 a 500 bilhões de dólares por ano.

    Depois de Bin Laden, um golpe "interno" contra o capitalismo

    O choque mundial causado pelos atentados, no entanto, não desencadeou a última crise econômica, apenas agravou-a. Tanto o crescimento econômico como as cotações nas bolsas de valores já estavam com tendência negativa há mais de um ano. "O 11 de setembro somente acelerou a queda nos mercados financeiros", resume Klaus Friedrich, economista-chefe do grupo Allianz-Dresdner Bank. Dentro de poucos meses esse efeito havia passado nas bolsas e, no segundo trimestre de 2002, havia prognósticos mais otimistas para a conjuntura.

    O próximo "golpe", porém, já estava se armando, como descreve o Börsen Zeitung (Jornal da Bolsa): "O que Bin Laden não conseguiu destruir, com sua rede global de terrorismo, poderão fazer alguns diretores executivos e financeiros de grandes grupos americanos, que enlouqueceram, em sua megalomania: é como se eles tivessem desencadeado o mecanismo de autodestruição do sistema econômico capitalista". O comentário refere-se à série de balancetes falsificados, que desencadeou uma crise de confiança extremamente grave nos Estados Unidos.

    Crise de confiança, consumo e juros

    A espiral puxando para baixo entrou novamente em movimento: a queda nas bolsas afetou a conjuntura e cada notícia negativa da conjuntura pressiona mais ainda as cotações nas bolsas. O mundo inteiro observa atento o comportamento do consumidor norte-americano, cujo bem-estar depende muito mais do sobe-e-desce na bolsa, do que em outros países. Como o PIB dos EUA representa 20% do rendimento econômico mundial, não é para menos que as atenções estejam voltadas à única superpotência da era pós-Guerra Fria. Além de que, o consumo privado é responsável por 2/3 do PIB americano. Como locomotiva da conjuntura, se os Estados Unidos emperrarem, a economia mundial como um todo não sairá do lugar.

    Numa situação como esta, praticamente estão bloqueados os mecanismos de regulação a que pode recorrer a política econômico-monetária. No Japão, há anos em crise, não há juros, ou eles são juros de zero por cento. O Fed americano provavelmente já exagerou, ao baixar os juros para 1,75%. Mais uma diminuição nos EUA e pode acontecer o mesmo que no Japão: com os juros baixíssimos, os preços caem, mas os consumidores continuam em sua abstenção.

    Pacto amarra as mãos dos europeus

    Na Europa, o Banco Central Europeu continua de olho nos riscos inflacionários, com uma taxa de inflação em torno de 2%, e não vê razão para agir. Já não dá para diminuir as taxas de juros e também o recurso de aumentar os gastos do Estado já foi "queimado". Além do mais, na Europa, o pacto de estabilidade obriga os países da zona do euro a manterem seus orçamentos equilibrados. Com este cenário delicado como pano de fundo, acompanha-se com grande nervosismo a chegada do 11 de setembro no calendário de 2002. O espectro do terrorismo levanta uma hipótese sinistra: que novos atentados prepicitariam a economia mundial numa profunda recessão.