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STF suspende julgamento que pode definir o marco temporal

2 de setembro de 2021

Sessão deve ser retomada nesta quinta-feira, com voto do relator, ministro Edson Fachin. "Julgamento do século" poderá decidir sobre o futuro da demarcação de terras indígenas no Brasil.

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índígenas com cocares e vestes típicas observam a chama no Panteão da Liberdade.
Cerca de 6 mil indígenas estão acampados em Brasília para acompanhar o julgamentoFoto: Eraldo Peres/AP Photo/picture alliance

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quarta-feira (01/09) o julgamento da ação que pode analisar o marco temporal para demarcações de terras indígenas.

A sessão, porém, foi suspensa após o pronunciamento de 21 das 38 instituições que devem se manifestar sobre o tema na tribuna da Corte. O julgamento será retomado nesta quinta-feira, com a fala das demais entidades e o voto do relator, ministro Edson Fachin.

O STF julga o processo sobre a disputa pela posse da Terra Indígena Ibirama, em Santa Catarina. A área é habitada pelos povos Xokleng, Kaingang e Guarani.

O processo tem a chamada repercussão geral. Isso significa que a decisão servirá de parâmetro para a resolução de, pelo menos, 82 casos semelhantes, segundo o STF.

O plenário da corte deverá decidir se as demarcações de terras indígenas devem seguir o critério do marco temporal, segundo o qual os povos indígenas só teriam direito à demarcação de terras que já estavam ocupadas por eles na data da promulgação da Constituição de 1988. Se não estivessem na terra, precisariam estar em disputa judicial ou em conflito comprovado pela área na data.

Marco "ignora passado de violência"

Durante a sessão, Rafael Modesto dos Santos, advogado da comunidade Xokleng, disse que o marco temporal não tem cabimento jurídico e ignora o passado de violência contra os povos indígenas, como casos de expulsões, mesmo após a titulação de terras tradicionais. 

"Não cabe nenhum marco temporal porque ele legalizaria todos ilícitos, de crimes ocorridos até 1988", afirmou. 

Na avaliação de Paloma Gomes, representante do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a defesa da tese do marco é uma forma de tentar burlar a Constituição. 

"Os direitos indígenas continuam como cláusulas pétreas, sendo imprescritíveis, inalienáveis e imutáveis. Em 88, foi fixado como dever do Estado a demarcação e a proteção dos territórios indígenas, entretanto, o que vemos hoje é uma resistência na implementação desses direitos", disse.

Segurança jurídica 

Também nesta quarta-feira, o advogado-geral da União, Bruno Bianco, defendeu a preservação da segurança jurídica nos processos demarcatórios e a manutenção de balizas que foram estabelecidas pela Corte no julgamento de demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em 2009. 

"A proteção das terras tradicionais ocupadas representa um aspecto fundamental das garantias constitucionais asseguradas aos indígenas. O Artigo 231 da Constituição Federal reconhece aos índios os direitos originários sobre as terras tradicionais, cabendo à União demarcá-las administrativamente. No julgamento do caso Raposa Serra do Sol, este STF estabeleceu balizas e salvaguardas na promoção de todos os direitos indígenas, e, para garantir a regularidade da demarcação de suas terras, como regra geral, foram observados o marco temporal e o marco da tradicionalidade", afirmou. 

O procurador de Santa Catarina, Alisson de Bom de Souza, defendeu a reintegração de posse pelo Instituto do Meio Ambiente do estado e afirmou que houve invasão de indígenas na área. 

Segundo ele, o reconhecimento da posse só pode ocorrer após decisão final sobre o reconhecimento da terra indígena pelo presidente da República, a quem cabe a decisão final sobre a homologação. 

"Um proprietário de terra não pode ser expulso de sua propriedade sem que haja a formação completa do reconhecimento de que aquele espaço é uma terra indígena tradicional", argumentou. 

Cerca de 6 mil indígenas em Brasília

A sessão está sendo acompanhada por cerca de 6 mil indígenas de 170 povos, que estão acampados desde a semana passada em uma área da Esplanada dos Ministérios, para protestar por seus direitos e contra o marco temporal.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) considera o julgamento do STF "o mais importante do século" para os povos indígenas e afirma que o acampamento, batizado de Luta pela Vida, é a maior mobilização indígena desde a redemocratização.

A entidade afirma que a adoção do marco temporal limitaria o acesso dos indígenas ao seu direito originário sobre suas terras, e que há casos de povos que foram expulsos delas algumas décadas antes de a Constituição entrar em vigor.

Já ruralistas argumentam que o marco temporal daria maior segurança jurídica contra desapropriações de suas propriedades.

le (Agências Brasil, ots)