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Sobreviventes ucranianos do Holocausto chegam à Alemanha

3 de abril de 2022

Na infância, Liliya, Alla e dezenas de outras idosas ucranianas vivenciaram a Segunda Guerra Mundial. Agora são trazidas para a Alemanha, em fuga de um novo conflito.

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Liliya Vaksman e o neto Dan
Liliya Vaksman pôde abraçar o neto, Dan, que mora há alguns meses em BerlimFoto: Volker Witting/DW

Elas chegam com o que puderam carregar: uma pequena mala, uma bolsa, fotos, agenda, celular, e muitas lembranças do que já passaram em suas longas vidas.

Completamente exaustas, três mulheres idosas saem do grande ônibus-hospital da Cruz Vermelha - uma é carregada numa maca pelos paramédicos. Os sobreviventes judeus do Holocausto da Ucrânia são recebidos em Berlim por Thomas Böhlke.

Sem grande cerimônia de boas-vindas, "porque agora todos estão exaustos", diz Böhlke. Foram três dias de uma viagem cansativa, com baldeações constantes. Uma odisseia para continuar vivendo e deixar para trás o trauma de uma segunda guerra em suas vidas. Seu novo lar temporário chama-se Erfülltes Leben, ou "vida plena". Böhlke é o diretor da casa de repouso.

Liliya Vaksman ligou imediatamente para seu neto, que vive e trabalha em Berlim há alguns meses. Ele correu para abraçar a avó. "Te amo tanto", diz Liliya ternamente ao seu neto Dan. Ambos quase choram.

A sobrevivente do Holocausto tem 82 anos de idade e foi retirada da cidade de Dnipro, na Ucrânia. Quando criança, ela vivenciou a Segunda Guerra Mundial, perseguição e fuga. E agora: outra vez guerra.

Três mulheres sentadas num porão
Como na 2ª Guerra, Liliya Vaksmann (centro) num refúgio em Dnipro Foto: Privat

"Estou muito chocada com o que está acontecendo agora na Ucrânia. Não posso acreditar que esteja acontecendo a mesma coisa novamente, como quando eu era criança".

Para a médica Alla Senelnikova, de 90 anos de idade, de Kharkiv, também é um choque, um trauma, que a guerra esteja mais uma vez mudando tão brutalmente sua vida. "É uma catástrofe", diz ela. "Na verdade, lamento que ainda esteja viva, porque agora tenho que vivenciar a guerra pela segunda vez".

Sobreviver de alguma forma

Na guerra da Ucrânia,até mesmo a simples sobrevivência está se tornando cada vez mais difícil para os idosos, que sozinhos, não têm apoio. A água é escassa, faltam alimentos. Nas áreas em conflito, muitas vezes, faltam água e eletricidade. Cuidadores ou parentes não podem mais se deslocar para ajudar porque as tropas russas estão lançando bombas ou disparando projéteis, mesmo em prédios residenciais.

Nesta situação, as organizações judaicas de ajuda, como a Conferência de Reivindicações Judaicas e o Escritório Central de Bem-Estar dos Judeus queriam ajudar os frágeis sobreviventes do Holocausto a deixar o país rapidamente. A evacuação, na qual ministérios, autoridades e organizações de ajuda alemães também estão envolvidos, está em andamento há apenas alguns dias.

"Já houve cerca de 30 retiradas e outras 20 estão em preparação, portanto, estamos falando de 50 evacuações", disse à DW Aron Schuster, diretor do Escritório Central do Bem-Estar dos Judeus e um dos coordenadores da operação de socorro.

Cerca de 400 pessoas que precisam de cuidados estão na lista - e a meta é ajudá-las, se elas quiserem. Schuster acrescenta que se calcula em cerca de 10 mil o número de sobreviventes do Holocausto em toda a Ucrânia. Muitos deles sobreviveram às torturas nos campos de concentração.

Fuga para a terra dos antigos agressores

Para os sobreviventes do Holocausto agora resgatados, isso deve parecer absurdo. Eles têm que fugir de uma guerra de agressão iniciada pela Rússia, pelo presidente Vladimir Putin. Mas, no passado, os russos é que estiveram entre os libertadores na Segunda Guerra Mundial.

E agora estão estão sendo evacuados para a Alemanha, a nação que causou a Segunda Guerra Mundial e trouxe sofrimento incomparável a muitos países e seres humanos. Adolf Hitler queria aniquilar a vida e a cultura judaicas; sistematicamente causou a morte de seis milhões de judeus.

"Ela está feliz por estar segura agora", diz Larysa Sheherbyna, falando da mãe. Larysa chegou a Berlim há alguns dias com a mãe, que sofre de demência, e o filho. Mesmo na Alemanha nazista, diz ela, "havia quem escondia judeus e arriscava suas vidas". "A Alemanha não é o país onde havia apenas fascistas durante a era nazista", acrescenta.

Larysa com a mãe e o filho em Berlim
Larysa (à direita) com a mãe e o filho em BerlimFoto: Volker Witting/DW

Para alguns, diz Aron Schuster, do Escritório Central do Bem-Estar dos Judeus, é um "desafio especial" partir para o país dos antigos agressores. Mas a maioria está simplesmente grata por haver esta possibilidade devido à situação na Ucrânia.

Thomas Böhlke recebeu oito sobreviventes do Holocausto e alguns familiares em seu lar de repouso. Na verdade, não há mais espaço, diz ele, "mas, de alguma forma, também acomodaríamos mais pessoas, pois é uma obrigação histórica".

Os resgatadas dizem que não pretendem ficar para sempre na Alemanha. A maioria quer voltar para sua pátria: a Ucrânia. Mas o que restará desta pátria depois que os soldados de Putin destruíram tanto?

No momento, Alla Senelnikova, de Kharkiv, diz que está simplesmente feliz "por ter recebido um acolhimento tão humano". E os outros evacuados, que escaparam do inferno pela segunda vez em suas vidas, concordam.