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Sim aos filmes, não aos tiros

Soraia Vilela14 de fevereiro de 2003

Frase de brasileiro vira slogan da Berlinale. Com "shoot film, not people", Gustavo Moraes definiu o lema da seção Talent Campus, que reuniu 500 jovens da área de cinema, vindos de mais de 60 países.

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"Baseado em Estórias Reais", de Gustavo Moraes

Ao enviar seu depoimento para a organização da recém criada seção do Festival de Cinema de Berlim, o jovem capixaba certamente não pensava que suas palavras passariam a estampar a capa do catálogo do evento, nem tampouco viessem a sair da boca de diversos vips, entre eles o diretor geral da Berlinale, Dieter Kosslick.

Usando um jogo de palavras possível apenas na língua inglesa, Moraes sugeriu em sua frase, mais tarde transformada em slogan, "rodar filmes e não atirar em pessoas". O verbo shoot, em inglês, pode ser usado tanto em um contexto quanto no outro. Em tempos de iminência de guerra, nada mais adequado para servir de diretriz de um evento que se propõe ser um pólo de relações interculturais.

Gustavo Moraes é diretor do curta Baseado em Estórias Reais, diversas vezes premiado dentro e fora do país. Produtor do curta Abbie Down East (seu trabalho de conclusão de curso na Columbia University de Nova York, que participou da Berlinale este ano no Festival de Cinema Infantil), Moraes edita em Amsterdã, no momento, um documentário sobre capoeira intitulado Ginga, além de estar preparando seu primeiro longa.

Centro de discussão —

O brasileiro é apenas um exemplo entre os muitos "jovens talentos" reunidos na Casa de Culturas do Mundo, em Berlim, onde estiveram presentes até esta sexta-feira (14) 349 cineastas, 119 produtores (entre eles, o carioca Aílton Franco Jr.), 67 cinegrafistas, 244 roteiristas e 57 atores. Brasileiros, australianos, finlandeses, argelinos, entre muitos outros, participaram de uma semana de palestras e workshops sobre cinema.

Da lista dos "mestres" presentes, fizeram parte ninguém menos que os diretores Wim Wenders, Volker Schlöndorff, Anthony Minghella e Spike Lee, além do ator Denis Hopper, entre vários outros. "É muito bom ver essas pessoas circulando por aqui e poder ouvir seus depoimentos. Por mais que a gente esteja começando, temos aquelas inseguranças de realizador. É bom ouvir da boca de um Wim Wenders que pessoas como ele também sentem isso, para saber que você não é um estranho no ninho", conta Gustavo Moraes.

Intercâmbio —

Não só a proximidade de nomes consagrados do cinema, mas o simples intercâmbio entre os participantes foi um dos pontos fortes do Talent Campus. "É uma idéia maravilhosa, porque você pode conhecer pessoas de todo o mundo, saber onde estão os realizadores. Apesar de alguns problemas, como o número reduzido de lugares para alguns seminários ultraconcorridos, foi ótimo. É uma oportunidade rara: você tem num lugar só 500 pessoas que não se conhecem. Mesmo considerando que o grupo de participantes foi bastante heterogêneo, as pessoas se entenderam", comenta Moraes.

Contatos —

A possibilidade de dar vazão a futuros trabalhos através de contatos estabelecidos durante o Talent Campus é também uma das propostas do evento. De conversas informais a ofertas concretas de financiamento, tudo pode acontecer. Uma das possibilidades é ser um dos três escolhidos para fazer um curta tendo Berlim como foco, mesmo que este venha a ser rodado do outro lado do mundo.

Além disso, o Talent Campus serviu também como fórum de reflexão sobre o fazer cinematográfico. Na rebarba das discussões do ramo, ainda sobrou espaço para interessantes manifestações individuais. "Comenta-se por aqui que a embaixada dos EUA convidou os participantes norte-americanos para uma recepção. Eles foram, mas levaram colados às roupas papéis onde estava impresso 'No War' (Não à Guerra). Foi uma forma de dizer 'estamos aí, mas não concordamos com o que está acontecendo'. Apesar de sermos talentos jovens, temos também uma visão de mundo", conclui Moraes.